Índice
- Nenhuma novidade e material requentado
- Entrevistas em “várias ocasiões” por meio de “inúmeros contatos pessoais”
- As peças do quebra-cabeça do caso Ilha da Trindade
- A nota oficial e o inquérito da Marinha
- Documentos sobre o caso Trindade são resgatados na Marinha
- A busca pelas testemunhas militares
- O capitão de fragata Paulo Moreira da Silva filmou e fotografou o “disco voador”?
- A fictícia história de um tesouro encontrado numa ilha sem nome
- A venda da reportagem do tesouro na ilha ao jornal Tribuna da Imprensa
- O resgate da história do tesouro do jornal Tribuna da Imprensa
- A foto da caveira sobre um cofre
- Mais um truque fotográfico?
- Em busca da reportagem do disco voador na revista O Mundo Ilustrado
- Testemunhas fantasmas do passado?
- Existem seres inteligentes habitando o planeta Marte?
- Os limites do testemunho ocular
- A história da venda dos negativos e das fotografias do “disco voador”
- Anulando o furo jornalístico do jornal Correio da Manhã
- Revista O Cruzeiro adquire exclusividade dos negativos e fotografias
- Fotógrafo confirma que vendeu o direito de uso das fotografias para a revista O Cruzeiro
- O império de mídia Diários Associados e a revista O Cruzeiro
- A história do envolvimento do presidente Juscelino Kubitschek no caso Trindade
- A dinâmica dos acontecimentos no convés do navio-escola Almirante Saldanha
- A análise dos negativos e a possibilidade de trucagem
- A revelação dos negativos a bordo do navio e a oportunidade de uma fotomontagem
- A viabilidade em detectar truques fotográficos
- Os negativos foram analisados pela Kodak?
- Técnica para realizar uma montagem fotográfica
- Conclusão de Claudeir Covo sobre a análise de grãos nos negativos
- Ufólogo americano não autenticou as fotografias de Almiro Baraúna
- A hipótese da inconsistência das nuvens nas fotografias
- Por que os casos da ufologia não são incontestáveis e devem ser questionados?
- Depoimentos de amigos e familiares do repórter fotográfico
- O abismo entre o dito e o não dito
- A contribuição comunitária ao caso Ilha da Trindade
- Palavras finais (por enquanto)
- Referências
O caso Ilha da Trindade é um episódio de uma suposta aparição de um objeto aéreo de origem não conhecida em uma ilha do Oceano Atlântico, a Ilha da Trindade, ocorrido em 16 de janeiro de 1958. Nesta oportunidade, um repórter fotográfico civil de nome Almiro Baraúna afirmou ter registrado fotografias deste alegado objeto aéreo no momento em que estava a bordo de um navio da Marinha do Brasil.
Em fevereiro de 2011 eu publiquei um artigo sobre este caso, intitulado de “Caso Ilha da Trindade: sobrinho de Almiro Baraúna afirma que as fotos são um truque”, onde apresentava o depoimento do fotógrafo Marcelo Ribeiro, um sobrinho de Almiro Baraúna. [1]
Aos 69 anos na época, ele afirmava que seu tio o havia confessado que as famosas fotografias do “disco voador” sobrevoando a Ilha da Trindade eram uma montagem fotográfica. Como é natural em áreas de pesquisa onde o objeto de estudo ainda não foi comprovado e nem negado pela ciência, como é o fenômeno UFO, as posições são divergentes quanto a avaliação de episódios desta natureza.
Nenhuma novidade e material requentado
O pesquisador de discos voadores Marco Antonio Petit publicou um artigo em agosto de 2011 na revista brasileira UFO com críticas às declarações de Ribeiro e apresentou informações sobre o caso Trindade que ele imaginava serem fatos inéditos e desconhecidos dos outros pesquisadores.
Na verdade, seu artigo não apresenta absolutamente nada de novo. Tudo o que foi publicado por ele já era de amplo conhecimento dos investigadores deste caso, há longos anos, não acrescentando nenhuma informação para esclarecer o episódio.
Eu devo revelar aqui que rigorosamente todas as declarações do fotógrafo Almiro Baraúna publicadas em seu artigo, da primeira letra até ao ponto final, é uma reprodução ipsis litteris do que o mesmo contou a ele em uma entrevista que fez no ano de 1997, mas ele não disse isto em seu texto. [2]
O material foi requentado e apresentado como se fosse novidade: “Mais de cinco décadas depois, a verdade sobre o UFO em Trindade”, anuncia a inverídica manchete da revista. A contracapa ainda reforça a chamada ao anunciar que seriam apresentadas “novas e surpreendentes revelações sobre o UFO em Trindade”.
O que ele não sabia era que essa entrevista já era de conhecimento até pelo mundo mineral. Ao reapresentá-la como se fosse algo inédito, subestimou a inteligência dos pesquisadores que investigam este caso ao pensar que ninguém conhecia as informações ali contidas. Estes mesmos dados já haviam sido amplamente divulgados e debatidos pelos outros pesquisadores em trabalhos ao longo da última década, sem falar nos trabalhos anteriores aos anos 90.
Essa entrevista com Baraúna foi gravada em vídeo e ele passou a comercializá-la a partir do ano 2000. Eu mesmo havia comprado a fita VHS do próprio Marco Petit, quase uma década atrás, por volta do ano 2002, depositando dinheiro em sua conta bancária. Eu tenho essa fita VHS até hoje.
Aliás, não era preciso ser muito atencioso pra perceber que uma das imagens que ilustram meu artigo com o depoimento de Ribeiro contém justamente um frame do vídeo dessa entrevista de 1997. Agora, alheio e desatualizado acerca das investigações que há mais de uma década compõem a revisão deste episódio, aparece Marco Antonio Petit apresentando sua entrevista do século passado como se fosse a última novidade — e como se nenhum outro investigador deste episódio conhecesse seu conteúdo.
Entrevistas em “várias ocasiões” por meio de “inúmeros contatos pessoais”
Ele ainda afirmou em seu artigo que durante os seus 30 anos de interesse pelo caso Trindade — que diz ter — realizou “inúmeros contatos pessoais […] com a principal testemunha do episódio, o fotógrafo Baraúna, entrevistando-o em várias ocasiões.”
Entretanto, devemos informar novamente que rigorosamente todas as declarações de Almiro Baraúna publicadas neste seu artigo vêm exclusivamente de uma única e simples entrevista de pouco mais de trinta minutos que ele realizou com o repórter fotográfico no ano de 1997, justamente a que acabamos de mencionar. Ele não contou isto no artigo dele, nem disse a data dessas outras entrevistas que diz ter realizado.
Qualquer pessoa que não entenda absolutamente nada do caso Ilha da Trindade e se ocupe em assistir uns trinta minutos do vídeo dessa entrevista de 1997 irá igualar em conhecimento a todas as informações sobre o episódio que ele já apresentou até hoje.
Vamos colocar os fatos aqui em monocromático: atualmente existe apenas um punhado de investigadores dedicados à análise e investigação do caso Ilha da Trindade. Todos aqueles que estão antenados com a revisão que este episódio vem passando há mais de uma década sabem o que o outro pesquisador já publicou sobre esta história.
Se Petit realizou diversas entrevistas com Baraúna “em várias ocasiões”, como afirma, até hoje ele não publicou nem uma vírgula de nenhuma dessas outras alegadas entrevistas.
E não é surpresa, essa simples entrevista do ano de 1997 foi camuflada no seu artigo pra aparentar a desavisados leitores ter sido informações coletadas por meio de três décadas de extensivas e extenuantes pesquisas sobre este caso. Como veremos claramente no decorrer deste meu escrito, seu conhecimento do caso Trindade é bem raso, praticamente restrito ao que Almiro Baraúna lhe contou nessa entrevista de 1997.
As peças do quebra-cabeça do caso Ilha da Trindade
Os pesquisadores que investigaram o caso Ilha da Trindade com mais profundidade e extensão, e têm um conhecimento mais profundo dessa história do que Petit sabem que não é suficiente analisar as declarações de Almiro Baraúna exclusivamente por meio dessa única entrevista, realizada quase 40 anos depois do evento. Esse depoimento é apenas um dos vários outros que o fotógrafo concedeu ao longo dos anos.
Existe uma entrevista muito mais longa e detalhada com o repórter fotográfico do que Marco Petit já sonhou em fazer em suas alegadas entrevistas realizadas “em várias ocasiões”, que ninguém nunca viu.
Com duração de 1 hora e 34 minutos, ela foi conduzida pelos integrantes do Clube Fenômeno OVNI (CFO), em 02 de julho de 2000, poucas semanas antes da morte do fotógrafo. Dentre as entrevistas conhecidas sobre este episódio, esta é comprovadamente a mais extensa que alguém já realizou com Almiro Baraúna. (Gravada em áudio na residência do fotógrafo, em Praia das Flexas, Niterói.) [3]
A investigação deste episódio deve ser composta de todas as entrevistas e depoimentos que são conhecidas do repórter fotográfico, e foram possíveis de ser resgatados hoje. Minha análise do caso Ilha da Trindade abarca vários depoimentos e entrevistas que Almiro Baraúna concedeu, desde 1958 até o ano 2000.
No meu artigo “Caso Ilha da Trindade: sobrinho de Almiro Baraúna afirma que as fotos são um truque”, apresentei alguns desses depoimentos. No meu artigo subsequente, “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, publicado três meses depois, em 06 de maio de 2011, apresento outras declarações do fotógrafo sobre o episódio. [4]
Ao longo dos anos o repórter fotográfico apresentou algumas versões de sua história. Algumas delas são ligeiramente diferentes ou até mesmo contraditórias. Por esta razão é importante reunir todos os depoimentos que ele concedeu ao longo dos anos com o objetivo de compor o maior número de peças do quebra-cabeça deste caso.
Com base nesse material, constatamos que é também fundamental analisar estes depoimentos em ordem cronológica, observando como alguns aspectos da história narrada por ele sofreram modificações ao longo dos anos.
Ademais, o caso Ilha da Trindade não é um monólogo contado por Almiro Baraúna. O episódio tem múltiplas fontes, narrada por variadas personagens, compondo um quebra-cabeça de várias peças. Alguns desses depoimentos contradizem o que o fotógrafo afirmava.
Por exemplo, o que Baraúna contava sobre a conclusão da Marinha acerca da análise das suas fotografias é bem diferente do que, de fato, a Armada concluiu sobre elas na época. No meu último artigo citado apresentei o confronto de algumas peças deste jogo em perspectiva cronológica. (Todos eles com referência da fonte, permitindo a qualquer interessado consultar seus originais.)
O depoimento de Marcelo Ribeiro é uma das peças que entram neste quebra-cabeça. Ele afirma ter ouvido a confissão de truque fotográfico da boca do próprio fotógrafo. Suas declarações foram analisadas dentro do contexto da base de conhecimento que já existia sobre o episódio.
Algumas das peças do quebra-cabeça do caso Ilha da Trindade são elencadas abaixo:
a) Os depoimentos de Almiro Baraúna, de 1958 até 2000;
b) Os depoimentos dos integrantes do Clube de Caça Submarina de Icaraí em 1958 e da década de 2000;
c) Os depoimentos dos militares em 1958 e nas décadas de 2000 e 2010;
d) Os depoimentos de parentes, amigos e colegas de Almiro Baraúna em 1958 e nas décadas de 2000 e 2010;
e) Reportagens que a imprensa veiculou sobre o episódio em 1958;
f) Os documentos oficiais produzidos pela Marinha Brasileira em 1958;
g) Os documentos oficiais produzidos pela Marinha dos Estados Unidos em 1958;
h) Análises das quatro fotografias do “disco voador” de Almiro Baraúna.
A nota oficial e o inquérito da Marinha
Em seu artigo, Marco Antonio Petit afirma que “como é de conhecimento de quem acompanha mais profundamente a história da Ufologia Brasileira, exatamente três meses depois de o UFO ter sido fotografado por Almiro Baraúna no arquipélago […] a Marinha convocou a imprensa da época e confirmou em nota oficial que um artefato havia sido realmente observado em 16 de janeiro de 1958 pelos passageiros do Almirante Saldanha […].”
E segue: “A nota oficial afirmava ainda que as análises dos negativos originais, realizadas inicialmente pelo Departamento de Hidrografia e Navegação da Marinha e posteriormente pelo Serviço Aerofotogramétrico da Cruzeiro do Sul — onde foram estudados de maneira mais aprofundada —, não haviam revelado qualquer sinal de fraude”.
Ao escrever isto, Petit acaba de nos demonstrar claramente que nunca sequer leu a nota emitida pelo Ministério da Marinha. Não é necessário conhecer profundamente a história da ufologia para saber que estas informações estão incorretas.
Qualquer pessoa minimamente informada sabe que a nota oficial do Ministério da Marinha foi emitida imediatamente, tão logo a história do “disco voador” ter estourado amplamente na imprensa em fevereiro de 1958, ou seja, logo no mês seguinte ao acontecimento a bordo do navio — e não três meses depois.
No dia 23 de fevereiro a imprensa escrita veiculou a nota nos jornais e, ao contrário do informado por ele, a nota oficial não menciona em momento algum as análises efetuadas nos negativos de Almiro Baraúna.
Na verdade, a nota oficial exara que:
“Com relação às notícias veiculadas pela imprensa, de que o Ministério da Marinha vem-se opondo à divulgação de fatos acerca do aparecimento de estranho objeto sobre a Ilha da Trindade, este gabinete declara que tais informações carecem de fundamento. Este Ministério não vê motivos para que fosse impedida a divulgação de fotografias do referido objeto, obtidas pelo Sr. Almiro Baraúna, que se achava na Ilha da Trindade, a convite da Marinha, e na presença de grande número de elementos da guarnição no NE Almirante Saldanha, de bordo do qual foram feitos os flagrantes. Evidentemente, este Ministério não se poderá pronunciar a respeito do objeto visto sobre a Trindade, uma vez que as fotografias não constituem prova bastante para tal fim”. [5]
Depois que o episódio do “disco voador” começou a ser veiculado na imprensa, em fevereiro de 1958, o deputado federal Sérgio Magalhães (PTB/DF) elaborou um Requerimento de Informações da Câmara (RIC) de número 2957/58 com questionamentos ao Ministério da Marinha sobre o episódio da aparição de um “disco voador” na Ilha da Trindade, região de jurisdição militar. [6] O conteúdo completo do seu requerimento chegou a ser publicado pela imprensa no dia 27 de fevereiro de 1958. [7]
O que aconteceu em abril de 1958, ou seja, três meses depois do ocorrido a bordo do navio-escola Almirante Saldanha, foi que o Ministério da Marinha respondeu a este requerimento do deputado, enviando-lhe um ofício de número 898, datado de 09 de abril de 1958. O remetente do ofício era assinado pelo ministro da Marinha, o almirante de esquadra Antonio Alves Câmara Júnior. [8]
Anexo ao ofício enviado ao deputado vinha o inquérito confidencial sobre a investigação do episódio, produzido pelo Estado-Maior da Armada (EMA). Na época em que este inquérito foi instaurado, em 1958, a Marinha o classificou de confidencial. Portanto, o público não teve acesso ao seu conteúdo.
No entanto, segundo publicou a imprensa escrita da época, apesar do conteúdo do inquérito ser confidencial, o deputado Sérgio Magalhães revelou vários trechos dele aos jornalistas — inclusive sua conclusão. Alguns jornais publicaram essas informações nas datas de 16 e 17 de abril de 1958. [9] [10][11] É nesse inquérito confidencial — e não na nota oficial como incorretamente informado por Petit — que está descrito a análise dos negativos do “disco voador”.
Apesar de o inquérito ter sido classificado como confidencial na época, constata-se que alguns trechos deste documento revelados pela imprensa são os mesmos exarados em um relatório também confidencial da Marinha que foi vazado seis anos depois, em 1964, intitulado “Relatório sobre a observação de objetos aéreos não identificados, registrados na Ilha da Trindade, no período compreendido entre 05 de dezembro de 1957 e 16 de janeiro de 1958”. [12]
Este relatório é o resultado final da investigação das aparições de objetos aéreos não identificados por sobre a Ilha da Trindade e aparece assinado pelo oficial do Serviço da Inteligência que investigou o episódio de Trindade no Estado-Maior da Armada, o capitão de corveta José Geraldo Brandão. Quando vazado, o documento foi inicialmente publicado em janeiro de 1965 nos Estados Unidos no boletim do grupo americano de pesquisas de discos voadores APRO (Aerial Phenomena Research Organization). [13]
Segundo a fundadora da APRO, a pesquisadora Coral Lorenzen, este relatório da Marinha (e mais alguns documentos tramitados internamente entre militares da Armada Brasileira) foram recebidos por ela em outubro de 1964 — remetidas por um militar da Marinha Brasileira que havia entrado na reserva.
O material foi vazado por este militar quando ele ainda estava classificado e eles são conhecidos por nós hoje. Eu já havia escrito toda essa história no meu artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, de 06 de maio de 2011, inclusive analisei um trecho da nota oficial.
Documentos sobre o caso Trindade são resgatados na Marinha
Em janeiro e abril de 2011 eu estive pessoalmente na Marinha, no 1º Distrito Naval, no Rio de Janeiro, e consegui obter alguns dos documentos oficiais originais do caso Ilha da Trindade. Estes documentos estavam enterrados nos arquivos militares por mais de meio século e nunca haviam sido resgatados por ninguém.
Eu fotografei todos eles e posteriormente disponibilizei abertamente para download no meu site quando publiquei o artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, em maio de 2011.
Um dos documentos que resgatei foi justamente o ofício enviado pelo Ministério da Marinha ao deputado Sérgio Magalhães. [8] Eu obtive o ofício, porém o inquérito que vinha em anexo não foi localizado pelo funcionário da Marinha; o inquérito não estava no mesmo volume deste ofício. Através de buscas efetuadas pelo funcionário, informou não ter localizado e me disse que este documento não constava nos arquivos.
Alguns pesquisadores aventaram a possibilidade de que aquele militar brasileiro que teria vazado, na década de 60, os documentos confidenciais sobre este caso e os enviado a APRO nos Estados Unidos, talvez tenha remetido os originais. Se esta especulação estiver correta, esta seria a razão do porquê este documento não ter sido localizado nos arquivos da Marinha hoje.
Alguns dos documentos que resgatei pessoalmente na Marinha são elencados abaixo:
a) Quase 50 páginas do relatório confidencial da 2ª Turma do Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade (POIT), intitulado “Relatório de fim de comissão. Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade. Período de 1º de novembro de 1957 a 16 de janeiro de 1958”. Este é o relatório do comandante do POIT naquela ocasião, o capitão de corveta Carlos Alberto Ferreira Bacellar; [14]
b) Duas páginas do ofício confidencial de nº 898, de 09 de abril de 1958, emitido pelo ministro da Marinha, o almirante de esquadra Antonio Alves Câmara Júnior, ao deputado Sérgio Magalhães (PTB/DF), em resposta ao seu Requerimento de Informações da Câmara 2957/58. [8] Uma página deste ofício, não confidencial, completamente em branco e apenas com o cabeçalho também foi resgatada;
c) O “Relatório de fim de comissão do capitão de corveta Eduardo Jorge dos Santos Crespo de Castro (6a Turma). Período de 17 de agosto de 1958 a 25 de outubro de 1958”. Fotografei apenas as páginas relacionadas a um avistamento de um UFO sobre a ilha, ocorrido em 05 de outubro de 1958; [15]
d) O “Relatório de fim de comissão do capitão de corveta Marcio de Farias Neves Pereira de Lyra. Viagem de ocupação da Ilha da Trindade (Ano Geofísico Internacional). Terceira parte: navegação, oceanografia, meteorologia e hidrologia” de setembro de 1957. Fotografei apenas algumas páginas, pois não há menção de avistamentos de UFOs; [16]
e) O “Relatório do capitão de corveta Carlos Alberto de Carvalho Armando (1a Turma). Período de 16 de agosto de 1957 a 01 de novembro de 1957”. Fotografei apenas algumas páginas, pois não há menção de avistamentos de UFOs. [17]
f) Algumas páginas de relatórios de missões militares à Ilha da Trindade da 5ª e 8ª Turmas do Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade (POIT). Tive acesso aos relatórios completos, mas não há menção de avistamentos de UFOs. Assim, eu fotografei apenas as capas;
g) Relatório de viagem de reabastecimento do POIT na Ilha da Trindade. Não há ocorrências de UFOs;
h) 75 fotografias que mostram militares trabalhando no navio-escola Almirante Saldanha e na ocupação da Ilha da Trindade em 1957/1958.
Os relatórios do Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade não são documentos exclusivos para reportar ocorrências de fenômenos aéreos não identificados, e sim relatórios que descrevem as atividades militares na ilha.
Na seção chamada “ocorrências” do relatório da 2ª Turma, o capitão de corveta Carlos Bacellar descreve os acontecimentos da observação de UFOs na ilha entre os meses de novembro de 1957 e janeiro de 1958, além da ocorrência principal deste período, o alegado avistamento ocorrido a bordo do navio-escola Almirante Saldanha. Anexo a este relatório há um resumo das radiossondagens de 44 lançamentos de balões-sonda na ilha, efetuados por ele e sua equipe.
Esse trabalho de resgate dos documentos também foi possível porque eu havia contatado com um dos pesquisadores do caso Trindade, o segundo-tenente arquivista da Aeronáutica Rodrigo Moura Visoni. [18] Ele esteve na Marinha antes de mim, em 2009, e apesar dele não ter resgatado estes documentos que aqui elenquei, pôde me confirmar o local que esteve em sua pesquisa de outros documentos do caso.
A busca pelas testemunhas militares
Das alegadas 48 testemunhas militares e civis que Almiro Baraúna dizia terem sido testemunhas diretas da aparição do “disco voador” a bordo do navio-escola Almirante Saldanha, até hoje a ufologia civil não conhece o nome e nem ouviu um único depoimento sequer de algum possível militar que estava no convés naquele momento e que tenha declarado que realmente avistou o alegado “objeto” aéreo.
Por exemplo, o pesquisador Claudeir Covo conhecia esta limitação, e comentou em uma entrevista do programa de TV do apresentador Ronnie Von, veiculado em 17 de setembro de 2009, que os nomes das testemunhas “não vieram a público, então tem esta dúvida.” [19]
Há apenas uma exceção, de um primeiro-tenente e dentista de bordo de nome Homero Ribeiro, já falecido, que terceiros o elencaram como testemunha ocular, apesar dele próprio não ter concedido depoimento público confirmando ou não ter visto algo sobrevoando a ilha. Ao contrário, o que sobeja são tripulantes com nomes conhecidos afirmando que nada viram no céu de Trindade naquela oportunidade.
Segundo a imprensa da época veiculou, a Marinha fez um bloqueio de silêncio para que os militares não narrarem à imprensa o que havia acontecido a bordo. [20][21] Essa seria uma possível explicação por desconhecermos publicamente o nome dessas supostas testemunhas oculares.
Não estou afirmando, a priori, que não existam tais testemunhas oculares militares do ocorrido a bordo do navio. No relatório que resgatei pessoalmente na Marinha, intitulado “Relatório de fim de comissão. Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade. Período de 1º de novembro de 1957 a 16 de janeiro de 1958”, o comandante que havia deixado o posto da ilha na ocasião, o capitão de corveta Carlos Alberto Ferreira Bacellar, declara que durante a alegada “aparição”, “encontrava-me no camarote, nesse momento, e subi imediatamente ao tombadilho, onde encontrei várias pessoas um pouco excitadas com o que haviam visto […]”. [14]
Bacellar chegou atrasado e não viu nenhum disco voador no céu. Infelizmente, ele não especifica a quantidade das alegadas testemunhas oculares. No entanto, em meu artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, que contém mais de 20 páginas, eu tratei em várias linhas sobre esta questão das testemunhas, questionando principalmente a veracidade desta quantidade abundante de 48 testemunhas oculares, de bordo do navio, apresentada por Baraúna.
O que eu escrevi naquele artigo foi uma célere abordagem de uma perquirição que nos tempos modernos vinha sendo levantada também há quase uma década pelos outros pesquisadores. [22][23]
O capitão de fragata Paulo Moreira da Silva, que disse estar localizado no epicentro do ocorrido no momento em que tudo aconteceu, ou seja, no convés do navio, declarou em depoimento direto que apenas “umas oito” pessoas foram testemunhas oculares da aparição — quantidade bem inferior àquela contada pelo fotógrafo. Ele próprio afirmou que nada vira, mesmo estando presente no convés. O capitão inclusive elenca Homero Ribeiro como o único dos oficiais a bordo a ter visto o alegado “objeto” aéreo. [24]
Ou seja, além dos três únicos indivíduos que declararam ter observado algo no céu naquela data (o próprio fotógrafo Almiro Baraúna, o bancário Amilar Vieira Filho e o capitão da reserva da Força Aérea Brasileira José Teobaldo Viegas, justamente os amigos em comum do mesmo Clube de Caça Submarina de Icaraí, que estavam a bordo a convite da Marinha), segundo a contagem do capitão Paulo Moreira restaria apenas algo em torno de menos (ou de mais) que quatro praças que supostamente viram algo.
Desde o ano inicial de minha investigação deste caso eu tenho tentado localizar testemunhas civis e militares que estavam a bordo naquela viagem. Quando consultei, em 2002, o Departamento de História Marítima e Naval da Marinha, solicitei nomes da tripulação do navio-escola Almirante Saldanha do ano de 1958, e recebi resposta negativa. A capitão de corveta e chefe do departamento, Mônica Hartz O. Moitrel, respondeu em 28 de outubro de 2002, afirmando que:
“Lamento participar a V.Sa. que apesar dos esforços envidados, não foi possível levantar a tripulação do navio Almirante Saldanha no ano de 1958. Contudo podemos informar que neste ano o Almirante Saldanha foi comandado por três oficiais, a saber: CMG José Santos de Saldanha da Gama — 25/07/1957 à 27/05/1958; CMG Waldeck Lisboa Vampré — 27/05/1958 à 10/12/1958; e CF Epaminondas Branco Magoulas (interino) — 10/12/1958 à 3/02/1959”.
No mesmo ano de 2002 eu já havia divulgado esta informação em debates públicos sobre este episódio, e mais recente reproduzi esta informação em artigo. [25] Contudo, os anos passaram e finalmente pude contatar e conversar, a partir de janeiro de 2011, com alguns militares que serviram no navio-escola Almirante Saldanha no ano de 1958.
Alguns deles me confirmaram que estavam embarcados naquela viagem a Ilha da Trindade e me contaram o que aconteceu a bordo, segundo a ótica deles. Eu também contatei outros militares que serviram neste navio naquela época, no entanto eles me informaram que não estavam a bordo naquela viagem.
O depoimento daqueles militares que confirmaram a mim que estavam no navio naquela data demonstra uma história bem menos fantástica e interessante do que aquela contada por Almiro Baraúna, além de mencionarem que essa história de 48 testemunhas não é verdadeira. Nenhum destes militares a bordo viu o UFO. Esta longa história, depoimentos e desdobramentos fogem ao escopo deste artigo, sendo algo para futura publicação.
Essa busca em localizar tripulantes daquela viagem não é somente minha, mas igualmente de outros investigadores. O jornalista Jeferson Martinho e o cético Kentaro Mori contataram outro militar em meses anteriores ao reinício de minha busca, o atual capitão-tenente reformado Edson Jansen Ferreira, 76 anos, que confirmou que estava embarcado no navio no momento em que tudo aconteceu e declarou ter presenciado a movimentação de militares no convés, apontando algo no céu, apesar dele próprio nada ter visualizado.
Informando que este grupo de observadores se restringia a apenas poucos indivíduos — quantidade bem inferior àquelas 48 testemunhas elencadas por Baraúna, mas compatível com a quantidade descrita pelo militar Paulo Moreira da Silva —, ele conta que, ao fim e ao cabo, não ouviu nem um único colega de farda contar que realmente viu o “disco voador”. [26]
Felizmente, a revisão deste caso nunca esteve baseada no testis unus, testis nullus, ou seja, “testemunha única, testemunha nula”. Há tanto testemunhas diretas, de visu, como testemunhas indiretas, de auditu. No entanto, há muito mais a ser dito sobre este tópico, mas eu não me estenderei nesta matéria aqui.
Agora, cai de paraquedas na minha frente Marco Antonio Petit, dardejando sobre algo que não tem o mínimo conhecimento do que fala. Para ele, os pesquisadores que não têm as mesmas conclusões que as suas estavam esperando as “principais testemunhas militares” (sic) e o fotógrafo Almiro Baraúna falecerem pra começar a publicar uma crítica sobre o caso, e assim permanecerem “impunes” de terem seus trabalhos supostamente revidados. Incapaz de elaborar um único pensamento racional, a cabeça conspiratória se instala e entra em ação.
O grande problema de alguém apresentar trabalhos a plateias tão heterogêneas como a ufologia é que indubitavelmente está em um campo aberto e sujeito a todo tipo de invencionices. Promotores de teorias da conspiração enxergam ligações inexistentes entre fatos absolutamente desconectados e independentes, quando não fazem pior: inventam o que sequer existe.
Como afirmei no meu artigo de fevereiro de 2011, meu interesse em aprofundar a investigação específica do caso Ilha da Trindade começou em 2002. Apesar de Petit não ter nominado quem são estas “principais testemunhas militares”, depois de 44 anos de o episódio ter ocorrido, obviamente uma parcela dos militares já haviam falecido, principalmente aqueles de patentes mais altas.
O comandante do navio-escola Almirante Saldanha na ocasião, o capitão de mar e guerra José Saldanha da Gama, faleceu em julho de 1968 como almirante de esquadra; o então capitão de corveta Carlos Alberto Bacellar faleceu em outubro de 1980 como capitão de mar e guerra, e o então capitão de fragata Paulo Moreira da Silva faleceu em maio de 1983 como almirante.
Como é possível notar, nem o próprio Marco Petit conseguiria contatar os dois primeiros militares, pois eles já haviam falecido na época que ele alega ter iniciado seu interesse neste episódio.
Além de sua crítica ser tão desprovida de racionalidade, o seu desconhecimento das investigações ao longo da história do caso Trindade consegue ser mais escancaradamente patente, pois no passado uma crítica ao caso foi publicada ainda em 1963 pelo renomado astrofísico e cético em discos voadores Donald Menzel, ocupando quase dez páginas de seu livro. [27]
Menzel não esperou Almiro Baraúna e as “principais testemunhas militares” falecerem para lançar sua crítica publicamente, e nem o fotógrafo ignorava sua existência, pois em uma de suas entrevistas chegou a mencioná-la. Nem em tempos recentes este tipo de argumentação se aplicaria, pois um artigo com críticas às fotografias de Trindade havia sido lançado em 1999 por um dos investigadores deste caso, de nome Martin Powell, data em que o fotógrafo ainda estava vivo. [28]
O capitão de fragata Paulo Moreira da Silva filmou e fotografou o “disco voador”?
Em um determinado momento do meu diálogo com o sobrinho de Almiro Baraúna, Marcelo Ribeiro, ao falar sobre as testemunhas da aparição do “disco voador” sobre a Ilha da Trindade, ele comentou que o “comandante do navio disse que viu, você acha que alguém vai desdizer o cara?”. [1]
Marco Antonio Petit se incomodou com essa declaração e diz que, mesmo eu conhecendo a informação de que o comandante do navio não foi testemunha direta do alegado sobrevoo do “disco voador”, não revidei Ribeiro corrigindo-o sobre esta informação equivocada.
Petit está correto em dizer que eu sabia que o comandante do navio, o capitão de mar e guerra José Santos de Saldanha da Gama não foi uma testemunha de algo inusitado no céu, já que é conhecida a informação de que ele estava naquele instante dentro do navio, cobertas abaixo. No entanto, essa questão vai muito além da sua crítica superficial e de seu desconhecimento dos fatos históricos.
Em 03 de maio de 1960, em depoimento ao pesquisador Walter Karl Buhler numa reunião da Sociedade Brasileira de Estudos Sobre Discos Voadores (SBDEV), Baraúna menciona o nome de um militar que teria sido testemunha, de bordo do navio, da observação do sobrevoo do “disco voador” sobre a ilha.
Nesta mesma fala, ele declara inclusive que este militar teria conseguido filmar o sobrevoo do “objeto”. Seu depoimento foi transcrito e publicado no boletim da SBEDV nº 16, de 01 de julho de 1960:
“Havia ainda cerca de 50 pessoas na coberta do navio, inclusive o comandante Paulo Moreira da Silva, que como cinematografista destacado para a Ilha de Trindade teria filmado 14 pés de filme do objeto estranho”. [29]
Em maio de 2011 eu havia publicado o artigo “Caso Ilha da Trindade: o depoimento mais antigo de Almiro Baraúna” reproduzindo esta narrativa na íntegra. [30] Como vemos, o próprio Baraúna declarou que um “comandante” havia sido testemunha da aparição. Mas ele não era o comandante do navio naquela ocasião. Então quem era este comandante?
Quando o navio-escola Almirante Saldanha chegou à Ilha da Trindade em 14 de janeiro de 1958, lá já estava alojado nas dependências que haviam sido recentemente construídas o então capitão de fragata Paulo de Castro Moreira da Silva.
Este militar era um cientista oceanográfico respeitado e deixou um legado para a oceanografia brasileira que perdura até hoje (inclusive, anos depois ele chegou a ser um dos comandantes do navio-escola Almirante Saldanha). Como já citado anteriormente, este oficial embarcou de volta ao Rio de Janeiro na mesma viagem em que houve o alegado aparecimento do “disco voador” e disse que estava presente no convés do navio no momento em que tudo aconteceu.
Na própria entrevista que Petit conduziu com Baraúna em 1997, ouviu da boca do repórter fotográfico que Paulo Moreira da Silva teria sido uma testemunha ocular. Nesta oportunidade, Baraúna não mais intitula o militar de “comandante”, mas sim de “almirante”.
Entretanto, apesar de este militar ter falecido com a patente de almirante, na data do acontecimento a bordo do navio, em 16 de janeiro de 1958, Paulo Moreira da Silva ainda era um jovem capitão de fragata, e não um almirante. Além disso, naquela viagem não havia nenhum almirante embarcado.
Nesta entrevista de 1997, Baraúna ainda apresenta uma versão diferente daquela história que havia contado ao pesquisador Buhler na década de 60, informando agora que este militar teria, na verdade, conseguido fotografar o “disco voador”.
Inicialmente o fotógrafo narra um diálogo que disse ter travado com este militar, oportunidade em que o oficial havia declarado que teria observado o sobrevoo do “disco voador”, porém negou ter conseguido fotografá-lo: “Eu vi. Não fotografei não, a máquina não estava na minha mão”, conta o que diz ter ouvido do oficial. Mas o fotógrafo Baraúna não acreditou na palavra do militar, e retruca a Petit que “[a máquina fotográfica] estava na mão dele. Ele deve ter os filmes”. [2]
Petit ouviu calado essa declaração e nada o questionou, pelo contrário. Ele reproduziu parcialmente o depoimento de Baraúna no seu único artigo que havia escrito sobre o episódio até hoje. O artigo saiu na revista UFO 54 de outubro de 1997 (que é justamente a história que o fotógrafo havia acabado de lhe contar e que foi gravada em fita de vídeo):
“O serviço secreto da Marinha ouviu um total de 48 testemunhas, incluindo marinheiros, cabos, sargentos, três oficiais e o almirante Paulo Moreira da Silva — que possuía a mais alta patente entre os militares que observaram o disco voador”. [31]
Além de Petit ratificar a incorreta patente de “almirante” deste oficial, descreveu por tabela que ele foi a maior autoridade militar dentre as testemunhas oculares a bordo do navio.
No entanto, como já vimos aqui, assim como o capitão de mar e guerra José Saldanha da Gama (e comandante do navio na ocasião) confirmou não ter sido testemunha da aparição do “disco voador”, o próprio capitão de fragata Paulo Moreira da Silva também confirmou não ter divisado nada no céu de Trindade naquela data.
No meu artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, de 06 de maio de 2011, eu já havia reproduzido o depoimento do capitão de fragata Paulo Moreira da Silva, veiculado no jornal O Globo de 26 de fevereiro de 1958, oportunidade em que ele declarava que mesmo estando presente no convés do navio no momento da alegada aparição, nada viu, apesar de ter presenciado a movimentação que se sucedeu:
“Realmente, eu estava a bordo naquela ocasião, e mesmo no convés do Saldanha. Não vi nada, mas tive a minha atenção despertada pela comoção que percebi, no convés, à aparição de alguma coisa no céu”. [24]
Ao analisar o depoimento de Marcelo Ribeiro, o que nos resta é especular a razão de ele ter mencionado que o “comandante do navio” tenha sido uma testemunha direta do avistamento do “disco voador”. Talvez ele esteja relembrando memórias de uma versão da história contada pelo próprio Baraúna, que elencava que o “comandante” (ou o “almirante”, maior patente da Marinha) Paulo Moreira da Silva foi testemunha do sobrevoo do alegado “objeto”.
Se este militar foi supostamente testemunha ocular do sobrevoo de um “fenômeno” aéreo sobre a ilha em dias anteriores à chegada do navio Almirante Saldanha, esta hipótese foge ao escopo deste artigo e deixamos essa análise para outra oportunidade.
A fictícia história de um tesouro encontrado numa ilha sem nome
No meu contato com Marcelo Ribeiro, ele mencionou uma reportagem sobre um tesouro que Almiro Baraúna teria produzido antes do episódio da Ilha da Trindade ter ocorrido. Baraúna havia elaborado uma história fictícia sobre uma caçada e descoberta de um tesouro perdido, produzindo uma reportagem e posteriormente vendendo-a ao jornal Tribuna da Imprensa como se fosse um achado histórico autêntico. Ribeiro mencionou essa história da seguinte forma:
“[Baraúna] já tinha feito outras coisas, como tesouro pra [revista] Mundo Ilustrado. E não era tesouro coisa alguma, era pura mentira. Ele gostava de brincar com isso, ele não fazia de má fé. Ele gostava era de brincar com essa coisa das pessoas acreditarem em qualquer coisa. Baraúna era um grande gozador e tinha um senso de humor fantástico. Ele era uma pessoa encantadora nesse sentido e muito brincalhão, brincava muito”. [1]
Em outro trecho do seu depoimento, ele ainda acrescenta que “[…] o povo acreditou que era verdadeiro um tesouro na praia. Ele sabia que podia brincar. A gente brinca com o imaginário das pessoas”. [1] Em nenhum momento do meu contato com ele eu havia lhe questionado diretamente sobre essa história do tesouro; ele a citou espontaneamente. No entanto, essa história fictícia já era amplamente conhecida há longos anos pelos pesquisadores deste caso.
A menção espontânea de Ribeiro sobre essa história demonstrou que ele conhecia aspectos da vida do fotógrafo que aquelas pessoas que conhecem apenas aspectos gerais do caso Trindade a desconhecem.
Há uma visível falha de memória em seu depoimento, ao mencionar que essa reportagem foi publicada na revista O Mundo Ilustrado, quando na verdade ela foi veiculada no jornal Tribuna da Imprensa. (A revista O Mundo Ilustrado havia veiculado uma matéria sobre outro truque de Baraúna, mencionado mais à frente neste artigo.)
Eu corrigi essa informação no meu próprio artigo, ao mencionar que “outro de seus truques fotográficos e que, desta vez, ele vendeu como se fosse real, é a de um tesouro que ele tinha achado no Espírito Santo. Não havia tesouro algum. Ele montou um cenário e vendeu as fotos para o jornal Tribuna da Imprensa, que comprou acreditando serem autênticas”. [1]
Em nenhum momento Ribeiro citou o local do fictício achado do tesouro — no Espírito Santo —, e nem o jornal que o veiculou, o Tribuna da Imprensa. Essas informações foram publicadas por mim em meu artigo por já serem muito bem conhecidas entre aqueles investigadores que pesquisaram aspectos satélites da história do caso Trindade.
Ademais, no meu artigo subsequente “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, de maio de 2011, eu também abordei em mais algumas linhas essa história do tesouro, principalmente mencionando como Joaquim Simões — um fotógrafo amigo de Baraúna na época — contou toda a história do truque do tesouro à imprensa — logo que o episódio do “disco voador” da Trindade estourou na mídia em fevereiro de 1958.
A intenção de Simões era alertar à imprensa de que Baraúna era um especialista em truques, já tendo produzido material trucado e comercializado como autêntico, e declarou acreditar agora serem as fotos do “disco voador” igualmente apenas mais um de seus truques. Segundo Simões, ele próprio teria arranjado alguns elementos do cenário fictício do tesouro para que Baraúna pudesse utilizá-los em sua reportagem, mas pensando que o fotógrafo fosse usá-los com a intenção de produzir um material jornalístico legítimo. [32][33]
Devemos assegurar aqui que a reportagem do tesouro na ilha jamais esteve exclusivamente atrelada ao que Marcelo Ribeiro declarou. Este é um fato histórico que tem vida independente — sendo dados checáveis por qualquer pessoa —, além dessa história já ser muito bem conhecida pelos pesquisadores do caso Trindade antes dele aparecer no cenário. Jamais foi preciso nos ater unicamente à declaração de Ribeiro para sabermos o que foi esta história e nem do objetivo de Baraúna ao fazê-la.
Agora, completamente desatualizado e alheio ao que está acontecendo na investigação da revisão deste episódio, aparece Marco Antonio Petit e cita a história do tesouro em seu artigo. Ele pensou que ninguém no planeta — além dele — conhecesse essa história e dos motivos do fotógrafo ao fazê-la, mencionando-a em seu artigo como se tivesse apresentando a pólvora ao mundo.
O que ele descreve é uma literal transcrição do que Almiro Baraúna havia lhe contado na já citada entrevista que conduziu com o repórter fotográfico em 1997. Ele pegou o vídeo da entrevista, assistiu novamente e transcreveu para seu artigo o que o fotógrafo lhe contou. Não há absolutamente novidade alguma publicada por ele.
E vejam a introdução desesperada que Petit empregou para contar a história fictícia do tesouro na ilha: “De maneira totalmente absurda, e mais uma vez ridicularizando a inteligência alheia, Ribeiro tenta fundamentar a ideia de que era parte da vida do principal personagem do Caso Ilha de Trindade, como se fosse uma coisa corriqueira, a prática de estelionato e obtenção de vantagens financeiras através de truques fotográficos”.
Ao compararmos o que foi escrito por Petit com a declaração de Ribeiro, reproduzida acima, é evidente a absoluta e total discrepância com a narrativa contada pelo último. Sim, Petit inventou uma declaração completamente inaudita e a empurrou como se fosse aquela que a testemunha havia declarado.
Ironicamente, ele não percebeu — ou não quis perceber — que o declarado por Ribeiro confirma em linhas gerais o que o próprio Almiro Baraúna havia lhe contado na sua frente em 1997: de que ele não fez o truque do tesouro “de má fé”, e sim por que “gostava de brincar com isso”. [1]
Nessa entrevista de 1997, Baraúna contou as motivações que o levaram a criar essa história fictícia de um tesouro achado em uma ilha. Segundo ele, o motivo foi por causa de uma aposta combinada com seus conhecidos para conseguir enganar com uma reportagem fictícia o jornalista Calazans Fernandes, do jornal Tribuna da Imprensa.
“Nós fizemos isso de acordo com o Ubiratan Fernandes do O Cruzeiro, Indalécio Wanderley e mais um outro. Eles estavam contando no O Cruzeiro que Calazans Fernandes era um sujeito muito vivo, ninguém enganava ele. Eu disse: eu vou enganar. Vou fazer um truque e vou vender para ele. Ele vai comprar. Fiz o truque e ele comprou”, conta Baraúna a Petit. [2]
Calazans comprou a reportagem do tesouro pensando ser uma autêntica história. Baraúna ainda acrescenta que, depois que Calazans descobriu que foi enganado, “ficou com uma mágoa louca de mim.” [2] Na entrevista para o grupo CFO de ufologia, no ano de 2000, Baraúna menciona novamente a história do tesouro e a reação furiosa de Calazans Fernandes ao saber que havia comprado gato por lebre e publicado no jornal em que trabalhava uma história falsa como se fosse verídica.
A venda da reportagem do tesouro na ilha ao jornal Tribuna da Imprensa
Já que Petit conhece essa história da reportagem do tesouro unicamente por intermédio do que o próprio Baraúna lhe contou em 1997, ele faz algumas perguntas que já possuíam respostas muito bem conhecidas daqueles pesquisadores que têm um conhecimento mais profundo acerca dela.
“E quem, na verdade, vendeu a reportagem? Foi mesmo Baraúna?”, questiona Petit. Como vimos, o próprio Baraúna confirmou na frente dele que vendeu a reportagem ao jornal Tribuna da Imprensa. Na entrevista ao grupo CFO de ufologia, três anos depois, gravada em áudio, o próprio fotógrafo confirmou novamente a autoria da venda da reportagem:
“Eu fiz um truque e vendi para o Tribuna da Imprensa por causa de uma aposta. O pessoal do O Cruzeiro falando negócio de truque [disseram:] “Calazans Fernandes, eu duvido que alguém engane ele em fotografia”. [Eu disse]: “Eu engano”. [Disseram]: “Engana coisa nenhuma”. [Eu disse:] “Vou fazer um truque e vender pra ele. Se ele comprar tá feito o negócio.” [Disseram:] “Tá bem”. Eu fiz o truque, Calazans comprou. Saiu em quatro edições.” [3]
E Petit continua: “Algum juiz acreditaria que o Tribuna da Imprensa realmente foi enganado pelo fotógrafo?”. Se o jornal Tribuna da Imprensa não tivesse sido enganado, não publicaria uma reportagem falsa aos seus leitores — que foi veiculada em quatro edições no Rio de Janeiro e fez um “sucesso espetacular”, nos dizeres de Baraúna.
Além disso, o próprio repórter fotográfico confirmou em entrevista ao grupo CFO de ufologia que Calazans Fernandes foi enganado pelo truque, informando ainda o alto valor monetário que este lhe pagou pela reportagem fictícia: “Ele [Calazans Fernandes] era redator-chefe, era amigo meu. Eu vendi a reportagem pra ele e ele comprou. Quatro mil cruzeiros, um dinheirão na época. Publicou em quatro reportagens, e era trucada.” [3]
Ademais, Baraúna sabia da extensão dos danos à imagem e credibilidade de um grande jornal ao publicar uma reportagem falsa como se fosse real, emendando logo em seguida que “o jornal Tribuna da Imprensa publicar fotografia trucada e relato trucado é desprestígio.” [3] Jornais vivem da credibilidade do que noticia. Pelo menos os sérios, não os tabloides.
Como vemos, ninguém está acusando arbitrariamente Almiro Baraúna de ter forjado uma história de um tesouro encontrado numa ilha. Esta é uma confissão pública do próprio, dita em pelo menos duas entrevistas — uma gravada em vídeo no ano de 1997 e outra em áudio no ano de 2000 — mais de 40 anos depois de tê-la feito.
Vejam abaixo o vídeo da confissão do truque do tesouro pela boca do próprio Almiro Baraúna. Esse excerto foi retirado da entrevista com o repórter fotográfico em 1997 e é literalmente a mesma passagem que Petit publica agora em seu artigo de agosto de 2011, pensando que ninguém no planeta a conhecesse.
O repórter fotográfico confirma que realmente criou uma história fictícia de um tesouro encontrado numa ilha e vendeu a um jornal como se fosse uma história verdadeira. Qual o editor ou repórter de um periódico ficaria satisfeito em publicar uma história — em quatro edições — e depois saber que era tudo falso?
Além do mais, se o objetivo era uma aposta para enganar um profissional experiente da imprensa, o que dizer dos leitores que leram a história? Não apenas o jornalista Calazans Fernandes foi enganado, como também todos os leitores daquela publicação que leram a reportagem; e Baraúna sabia das consequências da sua brincadeira, mencionando a imagem arranhada que o jornal poderia sofrer.
O resgate da história do tesouro do jornal Tribuna da Imprensa
Quando o caso Trindade estourou na mídia em fevereiro de 1958, o mesmo jornal Tribuna da Imprensa publicou novamente as fotografias da falsa história do tesouro. [34]
Segundo declarou Almiro Baraúna em entrevista no ano 2000, a republicação das fotos foi feita a cargo do próprio Calazans Fernandes que, por ter sido enganado pelo fotógrafo anos antes, acreditava agora que as fotos do “disco voador” da Trindade também eram forjadas e intencionava alertar à sociedade e demonstrar que aquele fotógrafo, até então desconhecido do grande público, já havia produzido em anos anteriores truques fotográficos com elementos falsos. [3]
No entanto, a legenda das fotos do tesouro republicadas no periódico Tribuna da Imprensa denota que o veículo somente soube que elas eram um truque porque aquele amigo de Baraúna, o fotógrafo Joaquim Simões, havia acabado de denunciá-las na imprensa como inverídicas. [34]
Realmente, conforme publiquei no meu artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, para se defender da acusação de que não promovia e vendia truques fotográficos como reais, na época Baraúna menciona a um repórter do Jornal do Brasil a história do tesouro e aparentemente ainda negava ser a história falsa. “Imagine só, até aquela história do tesouro que fotografei no Espírito Santo querem dizer que é chantagem…”, se esquiva. [35]
Apesar de Marco Petit ter imaginado que estava apresentando uma história que ninguém no planeta conhecia, os outros pesquisadores deste episódio já estavam a léguas de distância na investigação dela. Um dos pesquisadores do caso Trindade, o historiador Rodolpho Gauthier, já havia resgatado algumas das fotografias republicadas dessa reportagem — até então não vistas por nenhum pesquisador da atualidade.
As fotografias resgatadas por Gauthier foram então publicadas inicialmente pelo cético Kentaro Mori no boletim eletrônico SUNlite de janeiro/fevereiro de 2010. [36] Posteriormente, foram veiculadas em seu site Ceticismo Aberto na data de 17 de agosto de 2010. [37]
Obviamente, essa história fictícia do tesouro não prova que as fotos do “disco voador” da Ilha da Trindade são falsas. Contudo, ela está sendo levada em consideração aqui como um rico material para traçar o perfil psicológico de brincalhão do repórter fotográfico e apresentar o seu passado de truques fotográficos.
Foi neste contexto e intenção que Ribeiro citou essa história a mim, mas que irresponsavelmente sua declaração foi corrompida por Marco Petit, adulterando-a para uma acusação de que o fotógrafo Baraúna era useiro e vezeiro em práticas de estelionato.
Além disso, na época, o entrevistador Petit ouviu calado a confissão do truque contada pelo fotógrafo e não deu a mínima importância a este fato — e continua não dando. Não é surpresa que ele tenha feito uma avaliação minimalista do que essa história do tesouro representa.
Agora, para complementar este trabalho eu apresento uma informação verdadeiramente inédita aqui. Até então enterrada no ocaso por quase 60 anos, eu resgatei o original da reportagem do tesouro. Pessoalmente rodei os microfilmes de várias edições do jornal Tribuna da Imprensa até localizá-la, pois não havia referência conhecida de dia, mês e ano em que essa reportagem havia sido veiculada.
A história fictícia do tesouro foi publicada em março de 1956, em quatro edições, com o título principal de “O tesouro da ilha sem nome”. A narrativa resumida é uma história contada por Almiro Baraúna com texto escrito por “Robert Zunir”. O pano de fundo do enredo é uma história de um pirata francês do século XVII que escondeu um tesouro numa ilha. A história contada por Baraúna é uma expedição para encontrar este tesouro perdido — obtendo êxito.
Acompanhando-o nessa aventura, seus companheiros de Niterói, Manuel Ferreira, Evandro Caldas e José Carlos aparecem como membros da sua equipe de expedição. O tesouro nunca existiu de verdade, mas Baraúna tenta dar peso à sua história e elenca uma testemunha militar da Marinha no seu enredo do imaginário. [38][39][40][41]
Não pretendo aprofundar aqui uma análise sobre essa história. No entanto, por uma notável coincidência a história do tesouro na ilha e a história da Ilha da Trindade têm semelhanças monumentais:
a) As duas histórias ocorreram em uma ilha;
b) As duas histórias ocorreram no estado do Espírito Santo (a Ilha da Trindade pertence a este estado);
c) As duas histórias têm embarcações;
d) As duas histórias têm testemunha militar e civil (e esta coincidência em particular vai além: a história do tesouro na ilha também é elencada uma testemunha militar da Marinha!);
e) Nas duas histórias Baraúna é o protagonista;
f) Nas duas histórias Baraúna está acompanhado de um grupo de amigos, sendo a história do tesouro composta de três companheiros e a da Ilha da Trindade de quatro;
g) As duas histórias foram vendidas por Baraúna à imprensa.
As informações elencadas aqui estão condensadas na tabela abaixo:
Se um profissional da imprensa, como era Almiro Baraúna, inventou uma longa história de uma expedição para encontrar um tesouro que nunca existiu, criou um enredo com testemunha fictícia, apresentou fotografias trucadas como prova de um achado histórico autêntico e vendeu a um jornal, a mínima dúvida razoável que permeia a mente das pessoas é cogitar se a história da Trindade também seria composta de elementos igualmente inverídicos.
A foto da caveira sobre um cofre
Tentando dar o tom da história do tesouro ser irrelevante, Marco Petit ainda acrescenta mais uma de suas perguntas: “Em pleno século XX, quem compraria uma matéria sobre um tesouro que tinha como destaque a foto de um cofre com uma caveira?”.
Como já descrevemos acima, a história fictícia do tesouro vai muito além de uma simples fotografia de uma caveira sobre um cofre. Neste ponto não podemos ser omissos aqui em revelar que Petit jamais viu esta fotografia e nem muito menos leu a reportagem original. Como já dissemos anteriormente, o que ele escreveu no seu artigo é justamente a repetição ipsis litteris da história que Baraúna lhe contou em 1997, sem nada ter investigado.
Para defender sua ideia de que ninguém compraria este tipo de reportagem, ele apela para a pieguice e conta uma historinha que disse ter indagado ao seu filho de cinco anos se ele compraria uma reportagem que era ilustrada por uma caveira em cima de um cofre; seu filho teria consentido que sim. Com esse exemplo ele tenta defender ser essa uma história infantil e sem importância.
Além de ele fazer uma avaliação extemporânea, tentando comparar o mundo atual — apinhado pela diversidade de centenas de milhares de mídias à disposição do cliente — com o Brasil da década de 50 — restrito em opções, época em que até a TV havia chegado há pouco tempo —, não se dá conta de que o jornalista Calazans Fernandes, considerado pelos colegas jornalistas de Baraúna “um sujeito muito vivo” e que “ninguém enganava ele”, a comprou, pagando ainda quatro mil cruzeiros para publicá-la no jornal. [2][3]
Não há o que se espantar aqui, pois na década de 50, e ainda hoje, as pessoas compram histórias de tesouros perdidos e de piratas. Por exemplo, até hoje as pessoas ainda leem as aventuras do capitão Hateras, de Júlio Verne, lançada em 1864 — que continuam atuais até o presente. Essas histórias são interessantes para qualquer faixa etária.
Mais um truque fotográfico?
Ao mesmo tempo em que revelou à imprensa a história falsa do tesouro na ilha, o mesmo amigo de Baraúna, o fotógrafo Joaquim Simões, também assegurou que outra reportagem produzida por ele era apenas mais um de seus truques. [32][33] A história descrevia a descoberta feita por Baraúna de um galeão afundado no mar. Segundo Simões, a tal descoberta nunca existiu, sendo o tal galeão um modelo de pequenas dimensões produzido em laboratório fotográfico.
Até então enterrada no esquecimento por quase 60 anos e sem referência conhecida da data em que foi publicada, pela minha pesquisa pessoal eu localizei a reportagem e a apresento aqui pela primeira vez. A reportagem com o título de “Navio naufragado há meio século localizado na costa de Cabo Frio” foi veiculada há apenas cinco meses e quatro dias antes do caso Ilha da Trindade ocorrer, mais especificamente em 12 de agosto de 1957 no jornal O Globo. [42]
Impressionantemente, esta história tem tons semelhantes às da história do tesouro na ilha, produzida no ano anterior. Em resumo, ela narra mais uma das expedições de Baraúna, acompanhado de outros indivíduos entusiastas da pescaria submarina, que encontram um galeão naufragado em Cabo Frio, no Rio de Janeiro, resgatando tesouros perdidos em seu interior.
Depois que Simões denunciou à imprensa ser esta história um truque — inclusive contando vários detalhes de como ela teria sido forjada —, um repórter do jornal O Globo indagou o fotógrafo se essa reportagem era uma fabricação feita por ele, ao que Baraúna negou veementemente. [43]
Até o momento e com os elementos conhecidos em mãos não podemos atestar ser a história do tesouro do galeão mais um de seus truques, apesar de não podermos prontamente descartar esta hipótese. Um desdobramento e análise mais profundos dessa e de outras histórias de truques ficarão para outra oportunidade.
Em busca da reportagem do disco voador na revista O Mundo Ilustrado
E Marco Petit continua com sua mastodôntica retórica: “E há ainda outro aspecto que evidentemente não é ressaltado pelos céticos e interessados em denegrir a imagem de Almiro Baraúna: as fotos de discos voadores trucadas por ele antes do caso foram montadas justamente como uma alerta aos incautos, tendo em mente possíveis fraudes — e não para enganar pessoas ou para que ele revelasse suas habilidades”.
Deixando de lado a sua inocência febril em pensar que os pesquisadores estão “interessados em denegrir a imagem de Almiro Baraúna”, e de não entender nada do contexto de como estão sendo tratados estes truques aqui, como esperado ele não leu direito meu artigo “Caso Ilha da Trindade: sobrinho de Almiro Baraúna afirma que as fotos são um truque” — ou intencionalmente ignorou o que eu havia escrito —, pois neste mesmo texto eu já havia mencionado que:
“Em 1954, para a revista O Mundo Ilustrado, em artigo intitulado ‘Um disco voador esteve em minha casa…’, Baraúna apresenta fotografias de como fazer um disco voador usando duas fichas da antiga empresa de barcas Frota Carioca. Com texto assinado por Vinícius Lima, o truque fotográfico não tinha a intenção de enganar os leitores, pois dizia claramente como realizar a montagem”. [1]
O objetivo de Baraúna ao realizar um truque fotográfico de um disco voador na revista O Mundo Ilustrado por meio da junção de duas fichas de barcas da antiga empresa Frota Carioca já era conhecido há anos por todos aqueles que investigam o episódio. Numa das falas do fotógrafo, contou ao pesquisador Walter Karl Buhler numa reunião da Sociedade Brasileira de Estudos Sobre Discos Voadores (SBDEV), publicado no Boletim informativo da SBEDV nº 16 de 01 julho 1960, que:
“Não acreditava em disco voador. Tendo conseguido uma série de fotografias de disco, por meio de um truque. O Vinícius me pediu que consentisse a publicação no ‘Mundo Ilustrado’; daí a reportagem — Um disco voador esteve lá em casa — como uma réplica a de João Martins sobre o disco voador na Barra da Tijuca”. [29]
Como já informei anteriormente, em maio de 2011 eu havia publicado o artigo “Caso Ilha da Trindade: o depoimento mais antigo de Almiro Baraúna” reproduzindo este depoimento na íntegra. [30]
Apesar da motivação em fazer o truque das fotos do disco voador na revista O Mundo Ilustrado — uma crítica ao “disco voador” do caso Barra da Tijuca de 1952 — ser contada pelo próprio Baraúna, as fotos e o conteúdo da reportagem não eram conhecidos publicamente pelos pesquisadores do caso Trindade que estavam envolvidos com a pesquisa corrente.
Em dezembro de 2003 eu fiz uma consulta remota à Fundação Biblioteca Nacional para localizar esta reportagem. Naquela data não tínhamos a referência exata da data em que a matéria havia sido publicada e nem existia disponível ao usuário a consulta remota informatizada ao acervo da biblioteca. Hoje é tudo muito mais fácil e acessível a um clique. Naquela época nada foi localizado pelo funcionário consultado.
Assim, deixei para quando tivesse oportunidade de eu mesmo realizar uma consulta pessoalmente quando estivesse na cidade do Rio de Janeiro. E os anos passaram…
Anos depois, um dos pesquisadores do caso Trindade, o historiador Rodolpho Gauthier — o mesmo que resgatou algumas das fotos da história fictícia do tesouro na ilha —, conseguiu obter pessoalmente essa reportagem original da revista O Mundo Ilustrado. Em janeiro de 2008, em artigo escrito pelo cético Kentaro Mori, a reportagem obtida por Gauthier foi mostrada publicamente pela primeira vez após mais de 50 anos. [44][45]
E foi assim que todos os pesquisadores do caso Trindade, no Brasil e no exterior, conheceram o conteúdo da reportagem original e as fotos das duas fichas da Frota Carioca justapostas, formando um disco voador discoidal com dupla cúpula.
Agora, quase quatro anos depois, Marco Antonio Petit sai da caverna. Por meio de uma pesquisa que provavelmente nunca fez, de uma reportagem que nunca deve ter lido e nem muito menos visto, ele aparece para dizer que nenhum dos outros investigadores sabia do objetivo de Baraúna ao realizar o truque dessas fotos e é ele quem sabe de tudo. Só nos resta lamentar.
De qualquer forma fica aqui registrado o crédito ao trabalho do pesquisador Gauthier, que verdadeiramente resgatou essa história da revista O Mundo Ilustrado em uma época que ninguém a conhecia.
Testemunhas fantasmas do passado?
Marco Petit afirma que já encontrou “algumas” testemunhas que lhe disseram que o caso Ilha da Trindade era uma fraude, mas descartou todas elas. Por isso, as recentes declarações de Marcelo Ribeiro seriam na visão dele apenas mais uma dessas testemunhas que devem ser sumariamente descartadas.
Vejamos o que ele diz: “Sempre podemos encontrar tais ‘testemunhas’ por aí. Eu mesmo já localizei várias delas, alegadamente ligadas a episódios de destaque do passado […]. Algumas delas, inclusive, estavam associadas ao Caso Ilha de Trindade, mas foram deixadas de lado por não corresponderem aos mínimos preceitos de credibilidade que a Ufologia exige”.
Como vemos, ele não declinou o nome de nenhuma dessas testemunhas e nem a ligação direta dessas pessoas com Almiro Baraúna, seja em laços a) familiares; b) de amizade ou c) profissionais. Na investigação deste caso trabalhamos com pessoas que têm nomes, e não com anônimos. (No mínimo aceitaríamos um pseudônimo, caso as testemunhas desejem ser preservadas.)
Se Marco Petit não declina quem são essas testemunhas que ele alega ter encontrado no passado, qual a declaração que elas fizeram e as suas ligações com Baraúna, na minha avaliação elas continuam sendo fantasmas sem rostos que jamais existiram.
Ao contrário dele, minhas testemunhas “descartadas” têm nome e foram apresentadas publicamente. Por exemplo, em setembro de 2002, para um grupo de discussão público, eu mandei um e-mail informal descrevendo o conteúdo de uma entrevista que havia realizado com uma pessoa que acreditava que seu pai teria sido uma das testemunhas militares do caso Ilha da Trindade.
Na época, o depoimento apresentado informalmente nem foi levado à frente e a testemunha foi deixada de lado por se chegar à conclusão de que ela não era filho de uma das testemunhas militares deste episódio. Uma versão formal pode ser lida aqui. [46]
Como vemos, Petit confessa abertamente, e sem reservas, que simplesmente descarta e ignora qualquer testemunha que narre que algumas histórias ufológicas não sejam reais por não se adequarem aos “mínimos preceitos de credibilidade que a Ufologia exige”. Agora, imaginemos quais “preceitos” são esses que o fez descartar essas alegadas testemunhas.
Elas não confirmaram que apareceu na Ilha da Trindade uma nave espacial oriunda de outro planeta? Esta parece ser a única declaração que ele esteja disposto a ouvir. Por hora, o que conhecemos são suas reações refratárias, ao virar de ombros desdenhando que “sempre podemos encontrar tais ‘testemunhas’ por aí”. Ok, então as apresente!
Eu devo adiantar que eu não espero que ele materialize o nome e nem o depoimento de nenhuma dessas testemunhas que ele alega ter encontrado no passado, em qualquer das três categorias que listei anteriormente.
Existem seres inteligentes habitando o planeta Marte?
Apesar de não ter absolutamente relevância alguma e nem ligação direta com a história do caso Ilha da Trindade, esvaziado em sua argumentação e sem ter o que criticar, Marco Petit se agarrou em um comentário de Marcelo Ribeiro, que opinou que os seres humanos estão isolados no planeta Terra, pois a distância de “bilhões” de anos-luz entre nós e hipotéticos seres inteligentes de outros planetas tornaria inviável sermos visitados por eles hoje.
Marco Petit interpreta equivocadamente a opinião da testemunha, reproduzindo que “pelo que se observa na declaração, só existiriam planetas a bilhões de anos-luz da Terra”. A opinião de uma inviabilidade de viagem intergaláctica de hipotéticos seres alienígenas ao nosso planeta virou na cabeça dele a inexistência de planetas próximos a nós.
Ele ainda acoima que Ribeiro exagerou demasiadamente ao falar na distância de “bilhões” de anos-luz entre nós e possíveis inteligências alienígenas, tendo ignorado os planetas da nossa própria galáxia, a Via Láctea, que poderiam hospedar vida inteligente em uma redondeza de cerca de 100 mil anos-luz.
O argumento seria válido, no entanto este é o posicionamento similar de alguns astrônomos e físicos teóricos, como o astrofísico britânico John Gribbin, autor de dezenas de livros de ciência. Ele publicou um livro em 2011, chamado Alone in the Universe: why our planet is unique (Sozinhos no Universo: por que nosso planeta é único), para defender a tese de que nós estaríamos sozinhos na nossa galáxia. [47]
Para Gribbin, as buscas de vida inteligente na Via Láctea seriam infrutíferas, pois não há ninguém para ouvir nosso chamado. Apesar dele não descartar a possibilidade de existir vida inteligente além da nossa galáxia, se sua tese estiver correta, o Grupo Local de galáxias — excetuando-se a Via Láctea — ainda poderia abrigar inteligências não humanas; e a ilha mais próxima de nós neste incomensurável Universo é a nossa vizinha galáxia de Andrômeda, a cerca de 2,54 milhões de anos-luz de nós.
Apesar de eu pessoalmente não compartilhar dessa visão do astrofísico John Gribbin, eu particularmente avalio como possível que exista vida inteligente na nossa própria galáxia. Mas vejam bem a palavra que empreguei aqui: possível.
Entre o possível e o provado há uma diferença abissal, que ainda é preenchida pelo nosso desconhecimento do cosmos. A certeza que temos é de que não há comprovação científica alguma de que existam inteligências alienígenas aqui mesmo na Via Láctea — apesar de também não existir prova de que não exista.
Talvez Petit tenha se incomodado desmesuradamente com esta visão porque hoje ele é responsável em afirmar categoricamente que há vida inteligente bem ao nosso lado, aqui mesmo no Sistema Solar. Ele defende ardorosamente que essa vida inteligente está instalada no nosso vizinho planeta Marte.
Para alguém defender esta ideia hoje é porque, ou perdeu o bonde da história das descobertas científicas sobre Marte ou porque tem que apelar para historinhas carameladas e fajutas da conspiração.
Sem surpresas, ele garante que os cientistas da NASA já sabem de toda a presença e movimentação dos marcianos (ou alienígenas que estão em Marte), mas mistificam dados científicos e escondem do público essa bombástica descoberta. O coquetel de alegações conspiratórias vai além, e ele apregoa que esses alienígenas estão ajudando nossas missões robóticas enviadas àquele planeta.
Estas denúncias lançadas por ele são uma versão desidratada da pseudociência conspiratória americana, que já foram desmanteladas há tempos por renomados astrônomos. É curioso que essas requentadas alegações conspiratórias atuais são contrárias às teorias do passado, na qual conspiracionistas diziam que os marcianos eram seres refratários à presença humana e agiam ativamente para nos afastar de sua jurisdição, destruindo todas nossas sondas espaciais que eram enviadas para lá.
No mundo mágico e colorido das alegações conspiratórias, os marcianos de Petit parecem ter adotado a política de boa vizinhança. Agora, eles são criaturas amáveis e aconchegantes, que querem nos ajudar, estando atentos a toda nossa jornada de exploração tecnológica em seu mundo.
Curioso é que uma pessoa que prega “padrões éticos de imparcialidade”, de “seriedade” e “legitimidade do material apresentado” em matérias sobre ufologia difundidas por veículos da mídia seja o mesmo indivíduo que se utilize da mesma mídia para promover essa patuscada conspiratória, instaurando a mais infame campanha de conspiração espacial já surgida em território brasileiro, que respinga ao lado e contribui para desmoralizar a ufologia.
Em Marte ele não descobriu rigorosamente nada, e as pessoas podem conhecer o quão ingênuas são suas denúncias conspiratórias ao ler o artigo “10 falsas descobertas em Marte vendidas por Marco Antonio Petit. Saiba a verdade sobre elas e não seja iludido”. Lastimavelmente, essas pessoas resolveram trilhar o caminho inverso e andam como sonâmbulos na contramão do progresso científico.
Os limites do testemunho ocular
Ao comentar sobre a alegada observação do “disco voador” de bordo do convés do navio Almirante Saldanha, Marco Petit diz que “em um momento da entrevista […] Ribeiro chega a inocentar de qualquer participação os membros do Clube de Caça Submarina de Niterói que também estiveram a bordo do Almirante Saldanha. Mas quando Borges lhe revela que havia entrevistado o senhor Amilar Vieira Filho […], o fotógrafo usou mais uma vez o mesmo argumento: ‘O povo vê o que quer’”.
Petit acrescenta que “com respostas deste tipo” o entrevistado teria me convencido de que não surgiu nada no céu da Ilha da Trindade naquela oportunidade. O que minimamente se espera de alguém que apareça com esse tipo de crítica é que disponha consigo mesmo em ler integralmente e entender o que foi declarado pela testemunha, além de procurar estar ciente sobre o que foi avaliado acerca deste depoimento.
Qualquer pessoa que completou este mínimo requisito de conhecimento, leu que, segundo ele disse ter ouvido de seu tio Almiro Baraúna, algo teria realmente surgido no céu da ilha e foi avistado pelos tripulantes que estavam no convés do navio, mas que o repórter fotográfico não conseguiu fotografá-lo. Em um desses trechos ele diz: “Quando ele [Baraúna] chegou ali [no convés], as pessoas estavam olhando: ‘Olha lá, olha lá…’ etc. E ele viu. Ele viu que realmente tinha alguma coisa.” [1]
Ainda segundo ele, foi a partir desta aparição celeste que o fotógrafo enxergou uma oportunidade, servindo-lhe de gancho para que pudesse produzir uma posterior montagem fotográfica de um disco voador em seu laboratório, assim que retornou da ilha.
Como Marco Petit está alheio às pesquisas que estão revisando e analisando este episódio de Trindade, ele pensa que o depoimento de Ribeiro é o único em jogo nesta análise. Ao contrário do que ele tentar pintar, a minha apresentação naquele mesmo artigo deixou em aberto a possibilidade de ter surgido naquela oportunidade um FANI, ou seja, um fenômeno aéreo não identificado. No meu artigo subsequente, “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, eu continuo ajuizando como válida a hipótese de ter surgido algum evento celeste.
Inicialmente devemos dizer que o nome do clube não era “Clube de Caça Submarina de Niterói”, e sim “Clube de Caça Submarina de Icaraí”, que é o nome de um bairro da cidade de Niterói. Todavia, o mais lesivo de sua intervenção é constatar que não é necessário esforço algum para flagrar que Petit apenas pinçou umas palavras de uma fala, retirou-a do seu contexto e inseriu no contexto que lhe convinha.
Em uma determinada mesa redonda que abordou o tema UFOs, o astrofísico americano e divulgador da ciência Neil deGrasse Tyson disse que “nós sabemos, não só de pesquisa em psicologia, mas de simples evidência empírica na história da ciência, que a pior forma de evidência que existe nesse mundo é a evidência de testemunha ocular”. [48]
O que Tyson queria dizer em seu discurso era que um estímulo externo pode verdadeiramente surgir no céu, mas o sistema de percepção humano é falível e não é a melhor ferramenta de reconhecimento que dispomos. De fato, costumeiramente as pessoas veem algo no céu, não sabem o que é, e ato contínuo dizem que é um “disco voador” — uma nave alienígena.
O psiquiatra Carl Jung publicou um trabalho sobre o tema dos discos voadores no mesmo ano em que o episódio de Trindade se desenrolou. Na sua obra Um mito moderno sobre coisas vistas no céu, Jung defende que os discos voadores estariam ligados aos mitos e arquétipos. [49] A passagem completa narrada por Ribeiro segue a linha de raciocínio destes dois pensadores. Quando menciono a ele que a testemunha Amilar Filho havia me dito que realmente havia visto o “objeto” aéreo sobre a ilha, ele responde:
“Que ele viu, viu. O povo vê o que quer. Eu estou dizendo isso porque eu sou fotógrafo por opção de vida, mas sou psicólogo de formação. Eu tenho uma ideia de como é que funciona o mecanismo da cabeça das pessoas. Eu fui casado por mais de vinte anos — a mãe dos meus filhos — com uma psicanalista da UERJ [Universidade do Estado do Rio de Janeiro] e vivi a vida toda com assuntos de Freud. Então, eu sei que o povo vê o que quiser. Até porque, naquela época, o povo não sabia se era possível ou se não era. Não tinha ido foguete à Lua e o conhecimento do Universo era ainda muito mais precário do que é hoje.” [1]
(“Misteriosamente”, um trecho da resposta de Ribeiro apareceu na versão impressa da revista UFO deslocada para dentro da minha pergunta. O trecho que ele confirma a aparição de algo no céu — “que ele viu, viu” — surgiu cirurgicamente deslocada para dentro da minha pergunta, como se fosse eu que a tivesse proferido. Eu quero sinceramente acreditar que estamos diante de um erro de edição).
Abstraindo este ponto, o seu depoimento não se limitou a esta passagem. Quando questionei Marcelo Ribeiro se ele teria ouvido de seu tio se realmente havia aparecido algo no céu de Trindade, ele confirmou com um “claro que sim”; e continuou, com ressalvas, sugerindo possíveis elementos: “Um objeto, não! Apareceu uma formação de nuvens ou, sei lá, um balão meteorológico, alguma coisa. Realmente apareceu. As pessoas chegaram a ver alguma coisa sim.” [1]
Quando mais à frente eu novamente lhe questionei se, além dos militares, Baraúna teria também avistado algo no céu, ele confirmou novamente que alguma coisa apareceu, apesar de desconhecer o que poderia ter sido: “Ele chegou a ver sim. Tinha alguma coisa lá, algum desenho, uma formação, uma nuvem, alguma coisa…”. [1]
Como eu já havia mencionado naquele artigo, Ribeiro tem uma posição cética em relação à existência de visitas de naves alienígenas ao planeta Terra. Nos dias atuais este posicionamento é bem comum na sociedade, devido ao fiasco da ufologia em quase 70 anos ter sido incapaz de apresentar alguma prova concreta a favor desta tese. Mesmo assim, seu ceticismo foi pesado para mensurar se interferia em seu depoimento e, caso positivo, até onde este desequilíbrio na balança comprometeria o seu testemunho.
Na minha avaliação, certamente esta suposta aparição de um fenômeno aéreo sobre a ilha em 16 de janeiro de 1958 não se encaixa em uma visão de um balão meteorológico — o último havia sido lançado cerca de 9:00 horas da manhã, segundo o militar Paulo Moreira da Silva — e nem muito menos de uma formação de nuvens. [50] Contudo, não ficou comprovado que apareceu no céu da Ilha da Trindade uma nave espacial oriunda de uma civilização de outro planeta (não somente em Trindade, como em nenhum outro local do planeta Terra).
Por não entendermos de alguma coisa, não significa que ela precise ser explicada de uma forma sobrenatural. E é pela ausência de plena identificação que após mais de meio século, e com um olhar moderno, os investigadores procuram uma explicação racional para aquilo que as pessoas diziam ter observado naquela distante ilha.
Amilar Vieira Filho contou a mim em entrevista no ano de 2003 que tudo não passou de “uma observação muito rápida”. Apesar da fugacidade de sua experiência não ter lhe deixado “a menor dúvida que eu não tive ilusão de ótica nenhuma”, a sua convicção era calcada em algo que disse realmente ter presenciado, apesar de sua observação não ter sido suficiente para reconhecer sua real natureza, declarando ainda em 1958 que “fique bem esclarecido que eu não sei se o que vi era realmente o chamado disco voador”. [51][52]
Eu já mencionei aqui como o então marinheiro de primeira classe Edson Jansen Ferreira contou ao jornalista Jeferson Martinho que estava embarcado naquela viagem do navio-escola Almirante Saldanha e disse ter presenciado seus colegas de farda apontarem algo no céu quando estavam no convés da embarcação.
Ressaltando que possuía uma visão perfeita, conta que ao olhar na direção em que eles lhe indicavam, nada viu. Ele ainda conjectura o que poderia ter induzido aqueles militares terem visto algo que, para ele, em plena visão, nada enxergara.
Passados pouco mais de um mês do desembarque da viagem de retorno da ilha, conta que ao olhar pela primeira vez as fotografias de Almiro Baraúna — que haviam acabado de sair na revista O Cruzeiro —, ficou estupefato e incrédulo ao ver a imagem estampada de um objeto aéreo sobre a ilha. Tendo estado no convés do navio e olhado na direção em que seus colegas lhe apontavam, sentencia com convicção: “Eu não vi isso aí!”. [26] Alguns depoimentos militares que colhi seguem esta mesma linha — e serão futuramente publicados.
Eu não preciso ir muito longe para exemplificar que muitas pessoas veem, a partir de um estímulo externo qualquer, uma projeção do seu sistema de crenças, seja de anjos a demônios ou de extraterrestres a duendes. O próprio Marco Antonio Petit é um exemplo vivo disso.
Em uma fotografia do planeta Marte que ele promove por aí até hoje, diz enxergar uma gigantesca nave alienígena pousada no alto de um cânion deste planeta. Quem detém conhecimento em geologia planetária obviamente não enxergará a incrível “nave alienígena”, simplesmente porque ela não existe aos olhos instruídos de quem sabe o que vê, mas para aqueles que têm a sua visão nublada por um arraigado sistema de crenças em discos voadores consegue transmutar a visão de uma simples e ordinária formação rochosa em uma “nave alienígena”.
No entanto, há uma estrondosa diferença entre este exemplo que apresento aqui, que se restringe a uma simples imagem estática — e que pode ser visualizada a um palmo de distância de nossos olhos, quantas vezes forem necessárias —, para um alegado evento que se desenrolou a quilômetros de distância e que teve duração efêmera de algo em torno de segundos.
Um dos elementos que são levantados para defender que a suposta aparição de algo no céu seja de natureza artificial vem da história contada por Baraúna de que o radar de bordo do navio Almirante Saldanha havia captado na tela a sua presença e de que a sua manifestação na região teria causado interferências eletromagnéticas nas aparelhagens de bordo — mesmo que sua presença tenha se desenrolado a quilômetros de distância da embarcação, que estava fundeada na Enseada dos Portugueses.
Eu já havia tratado ligeiramente a história do radar no meu artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”. Os pesquisadores que têm investigado o caso Trindade sabem como estas duas histórias não são exatamente aquilo que nos contaram, porém devido a extensão dos tópicos eu não irei abordá-las aqui, ficando esta análise para um futuro trabalho.
Antes do famoso alegado sobrevoo de um “objeto” aéreo no dia 16 de janeiro de 1958, em dias anteriores a este incidente foi também relatado por alguns militares o sobrevoo de “objetos” sobre a ilha. Pelo menos em uma dessas oportunidades a hipótese de ter surgido algo ordinário no céu não foi sumariamente descartada nem pelo próprio comandante do Posto Oceanográfico (POIT) daquela turma em exercício, o capitão de corveta Carlos Alberto Bacellar.
O comandante descreve que foi testemunha ocular de alguns desses eventos celestes. Um deles ocorreu no primeiro dia de janeiro de 1958 e descreve que a aparição foi também presenciada por cerca de vinte homens da guarnição. Porém, apesar dos militares presentes afirmarem que a visão tenha sido do mesmo objeto aéreo que já havia aparecido em dias anteriores, na interpretação do comandante o tal “objeto” parecia ser apenas uma simples gaivota em voo solitário.
A descrição desta ocorrência está exposta no seu relatório, intitulado “Relatório de fim de comissão. Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade. Período de 1º de novembro de 1957 a 16 de janeiro de 1958”:
“No dia seguinte, 1º de janeiro, todas as atenções estavam voltadas para o céu quando surgiu algo, que foi visto por uns vinte homens da guarnição, e que se afirmou ser o mesmo objeto; eu também estava atento e me pareceu, no entanto, tratar-se de uma gaivota. O objeto — ou gaivota — estava projetado sobre o céu e assim não se tinha noção de profundidade; deslocando-se no rumo nordeste, em determinado ponto da trajetória brilhou intensamente, embora durante talvez menos de um segundo. Se era gaivota a sua velocidade seria grande, mas dentro do razoável; se era realmente o objeto, deveria estar a uma distância considerável e nesse caso, a sua velocidade era incrível. Esse fato não foi comunicado ao EMA [Estado-Maior da Armada] em virtude da dúvida que subsistiu.” [14]
Este episódio é emblemático e serve para traçar um paralelo com o alegado avistamento mais famoso, de bordo do navio, ocorrido quinze dias depois.
Apesar dos militares estarem em alerta e atentos a qualquer coisa que surgisse no céu, se cerca de vinte homens da guarnição aparentemente confundiram uma simples gaivota em voo com um “disco voador” — segundo o julgamento de um militar de maior patente —, o que poderíamos esperar das cerca de oito testemunhas de bordo do navio Almirante Saldanha — segundo contagem do militar Paulo Moreira da Silva —, composta de civis, praças e apenas um único militar com uma patente um pouco mais elevada, a de primeiro-tenente? Eles também poderiam ter confundido com algo prosaico que surgiu no céu?
É verdade que Bacellar confirmou em seu depoimento no Estado-Maior da Armada ter presenciado em outras oportunidades algo no céu que não conseguiu atribuir uma explicação racional. No entanto, a própria investigação da Marinha reconheceu a insuficiência e a ausência de capacitação técnica de muitos dos relatos militares, concluindo em seu relatório final:
“Que a maioria dos informes apresentados são insuficientes, principalmente devido à falta de habilidade técnica de muitos observadores e da breve duração dos fenômenos observados, de modo que nenhuma conclusão pode ser alcançada a respeito de dados positivos sobre os OVNIs”. [12]
Incapaz de obter alguma informação positiva acerca daquilo que as pessoas diziam ter visto no céu e impossibilitada de atingir esta resposta por meio das fotos de Almiro Baraúna, pois a análise técnica não conseguiu descartar a possibilidade de que elas poderiam ser produto de uma fraude bem elaborada — como veremos mais à frente —, restou à Marinha concluir em seu relatório final que havia indícios de que algo havia surgido no céu:
“Que, finalmente, a existência de relatos pessoais e de evidência fotográfica, de certo valor considerando as circunstâncias envolvidas, permite a admissão de que há indícios da existência de objetos aéreos não identificados”. [12]
Há muito mais a ser dito sobre este tópico em específico, mas seria extenso por demais abordá-lo em todos os seus meandros neste artigo. Por hora, nós corremos o risco de sermos acusados de parciais por não termos mencionado e avaliado aqui todas as ocorrências em diferentes ângulos. No entanto, esta análise ficará para outra oportunidade em um trabalho mais extenso e detalhado.
A história da venda dos negativos e das fotografias do “disco voador”
Em conversa com o fotógrafo Marcelo Ribeiro, ele afirmou que Almiro Baraúna teria lhe confessado que realmente avistou algo que surgiu no céu da Ilha da Trindade, porém não conseguiu fotografá-lo. No entanto, ao voltar da ilha e chegar em sua casa, ele não deixou a oportunidade passar em branco e resolveu criar uma montagem fotográfica de um disco voador sobrevoando a Ilha da Trindade. “Todo mundo está vendo um disco voador, eu vou fazer um disco voador”, diz ter ouvido de seu tio. [1]
Ribeiro afirma que Almiro Baraúna visava obter ganhos financeiros ao vender à imprensa essa montagem fotográfica. No entanto ele emenda sua narrativa e faz uma ressalva, afirmando que apesar do interesse financeiro do fotógrafo, “ele não fez isso de má fé. É fundamental deixar isso muito claro. Ele fez como uma grande brincadeira, porque ele era uma pessoa assim. Ele gostava de fazer essas brincadeiras.” [1]
Para reforçar o perfil brincalhão de Almiro Baraúna, ele mencionou que o fotógrafo já havia realizado outras brincadeiras semelhantes, e citou a história do tesouro. Nós já vimos aqui que, há menos de dois anos antes do incidente em Trindade ocorrer, o fotógrafo criou a história fictícia de uma descoberta de um tesouro numa ilha, apresentando provas fotográficas que, na verdade, foram produzidas em um cenário armado.
Seu passado é o melhor confessionário de seus atos. Não obstante, ao retroceder no tempo e analisarmos o panorama da imprensa daquela época, o fotógrafo não estava sozinho ao enveredar em brincar com o imaginário das pessoas sem necessariamente estar comprometido com a verdade dos fatos.
Tentando rebater o que foi declarado, Marco Antonio Petit afiança que o repórter fotográfico não tinha nenhum interesse financeiro pelas fotos do “disco voador”, e para corroborar o que defende afirmou que o fotógrafo distribuiu gratuita e desinteressadamente várias cópias de suas fotografias aos jornais cariocas, sem ganhar nenhum dinheiro por elas.
Ademais, Petit garante que, apesar do absoluto desinteresse financeiro de Baraúna pelas suas fotografias, uma agência de notícias apareceu posteriormente e lhe ofereceu uma bolada em dinheiro para adquirir seu negativo original, oportunidade em que o fotógrafo aceitou de bom grado. Vamos ver textualmente o que ele descreveu em seu texto:
“Baraúna distribuiu gratuitamente cópias de suas fotos para serem publicadas pelos principais jornais do Rio de Janeiro, durante uma entrevista coletiva em fevereiro de 1958 — e fez isso com o objetivo de tirar a exclusividade do Correio da Manhã, que havia obtido cópias das fotos através de JK, que aparentemente desconhecia o verdadeiro responsável por elas. E mais: para a surpresa de Baraúna, conforme confirmou pessoalmente em entrevista, posteriormente ele recebeu uma oferta de 60 mil cruzeiros pelos negativos originais, que evidentemente foi aceita. A proposta foi feita em nome da Meridional, a primeira agência de notícia do país, fundada pelo jornalista Assis Chateaubriand, dos Diários Associados.”
Petit conclui, informando que “foi essa agência quem comprou os negativos e passou a vender e a distribuir as fotos, principalmente no exterior.”
O que Marco Antonio Petit apresenta aqui são apenas retalhos desconectados de uma história bem mais ampla. Consequentemente, há equívocos em sua descrição das ocorrências, oriundo de seu conhecimento parcial da história e sua consequente visão desconexa dos fatos. Essa limitação não lhe permite visualizar a sequência de como a história foi desencadeada na época.
Ao contrário do que imagina, ele não apresenta absolutamente nenhuma informação que não seja amplamente conhecida por qualquer outro investigador deste caso, há anos. Para escrever isto, Petit pegou o vídeo da sua entrevista com Baraúna de 1997, assistiu novamente e transcreveu literalmente o que o fotógrafo havia lhe contado. E só. Esse é o conhecimento dele, limitando-se a repetir aquilo que Baraúna lhe contou nesta oportunidade, sem nada ter investigado.
Como já dissemos anteriormente, essa entrevista foi realizada quase 40 anos depois de o episódio ter ocorrido no navio-escola Almirante Saldanha. O fotógrafo não contou maiores detalhes nesta oportunidade.
O que faltou no meu artigo “Caso Ilha da Trindade: Sobrinho de Almiro Baraúna afirma que as fotos são um truque” foi abordar brevemente este tópico, assim como fiz com outros aspectos do episódio. No entanto, aquele texto jamais teve a mínima pretensão de esgotar todos os meandros do caso Trindade, que é recheado de histórias satélites.
Os pesquisadores que têm um conhecimento mais profundo do caso Ilha da Trindade do que Petit e verdadeiramente o investigaram com maior extensão, cruzando múltiplas fontes, sabem que Almiro Baraúna teve sim a intenção de vender e ganhar dinheiro com as suas fotografias, e de que ele selou um contrato de exclusividade com a revista O Cruzeiro, que pertencia ao grupo de mídia Diários Associados, pelo direito de uso das suas fotografias e pela exclusividade da história contada por ele.
O fotógrafo tinha interesses comerciais pelas fotos e foi pago por elas, inclusive seu objetivo foi confirmado na época pelo próprio, como veremos mais à frente.
João Martins, um conhecido personagem da ufologia, era um jornalista que trabalhava na revista O Cruzeiro; ele confirma que foi o intermediador na negociação deste acordo de exclusividade. Para explicar como aconteceu essa longa narrativa veremos os fatos em ordem cronológica, sem, no entanto, esgotar todos os detalhes dessa história aqui.
O conglomerado de mídia Diários Associados, de propriedade do empresário, jornalista e político Assis Chateaubriand era composto de vários jornais, rádios e TV. Algumas das empresas mais importantes do grupo eram a revista O Cruzeiro, o jornal O Jornal, a TV Tupi e a Agência Meridional de Notícias. O Diários Associados adquiriu com exclusividade os negativos, as fotografias e a narrativa contada por Baraúna, e usou toda sua capilaridade para divulgar a notícia nos seus veículos de comunicação e no mundo.
Apesar do episódio a bordo do navio-escola Almirante Saldanha ter ocorrido em 16 de janeiro de 1958, a primeira aparição na imprensa das fotos do “disco voador” somente aconteceu após mais de um mês desta ocorrência, exatamente em 21 de fevereiro de 1958.
Neste intervalo de tempo o episódio da Trindade era sigiloso e o grande público não o conhecia. A Marinha estava investigando a história e pediu sigilo temporário dos seus envolvidos. Entretanto, neste meio tempo o jornalista João Martins afirma que soube do episódio antes do público.
Ele escreve essa história na revista O Cruzeiro, de 08 de março de 1958, e conta que desde o dia 01 de fevereiro já tinha conhecimento da história de que um “disco voador” teria sido fotografado de bordo de um navio da Marinha.
Ele descreve que contatou um militar da Armada em 08 de fevereiro, oportunidade em que lhe foi mostrada pessoalmente as fotos, apesar de não lhe ter sido dada permissão para divulgá-las. De acordo com ele, naquela oportunidade não lhe foi revelada a identidade do autor das mesmas.
Martins continua a narrativa, declarando que “no dia 14 [de fevereiro], eu já havia conseguido identificar o autor das fotografias e entrado em contato com ele. Tratava-se de Almiro Baraúna, repórter fotográfico sem contrato nos últimos tempos com qualquer empresa jornalística, especialista em fotografias submarinas. No entendimento que tivemos, obtive exclusividade para ‘O Cruzeiro’ e demais órgãos dos ‘Diários Associados’ das suas sensacionais fotografias. Entretanto, pediu-me ele que não as publicasse enquanto a Marinha, com a qual tinha um compromisso moral, não lhe desse permissão para tal.” [53]
Na condição de funcionário do grupo Diários Associados e, especificamente, como jornalista da revista O Cruzeiro, João Martins revela nessa edição da publicação que foi o intermediador imediato na negociação do acordo de exclusividade das fotografias do “disco voador” entre Baraúna e o Diários Associados.
Anulando o furo jornalístico do jornal Correio da Manhã
João Martins conta que estava esperando o sinal de positivo de Baraúna para publicar as fotos e a história no hebdomadário O Cruzeiro e demais órgãos do Diários Associados. Para que isto acontecesse, Baraúna ainda estava esperando a permissão da Marinha para divulgá-las.
O fotógrafo relata na sua entrevista concedida a essa mesma edição da revista O Cruzeiro que finalmente recebeu sinal positivo do capitão de corveta Carlos Bacellar no dia 14 de fevereiro, uma sexta-feira à noite, e as fotos estavam liberadas para divulgação. [53]
Era Carnaval no Brasil e o público ainda não conhecia a história do incidente na Ilha da Trindade. Segundo Baraúna narra na entrevista do ano 2000, ele esperou as festividades terminarem para finalmente lançar a público as fotografias.
Porém, ao chegar ao final de Carnaval, ou seja, na quarta-feira de Cinzas, ele conta que inesperadamente ouviu pelo rádio que as fotos e a história do “disco voador” iriam ser publicadas no dia seguinte no jornal Correio da Manhã, concorrente do grupo Diários Associados. Neste momento, Baraúna não sabia como as suas fotos, até então sigilosas por prescrição da Marinha, haviam parado nas mãos daquele periódico.
A partir daqui esta história se bifurca em duas versões: uma contada por Almiro Baraúna e a outra por João Martins (e confirmada pelo Diários Associados). Nas duas versões, Baraúna estava esperando a Marinha autorizar a divulgação das fotos, porém naquela versão descrita pelo Diários Associados e por Martins, o fotógrafo havia sido localizado pelo jornalista em 14 de fevereiro e lhe contado toda a história, como acabamos de ver e ainda veremos mais à frente.
Na versão narrada pelo fotógrafo, diz que foi ele quem procurou Martins no dia 19 de fevereiro para lhe contar a história, após ouvir pelo rádio o anúncio de que as fotos seriam veiculadas no dia seguinte no jornal Correio da Manhã.
A despeito da divergência de datas e de quem contatou a quem primeiro, o Correio da Manhã iria publicar as fotos antes da revista O Cruzeiro sair nas bancas. Ou seja, além deles publicarem um furo jornalístico, iriam “furar” o trabalho dessa revista. Ademais, eles iam publicar as fotos à revelia, sem autorização do fotógrafo e sem pagar por elas.
Há uma possível explicação para adotarem essa atitude: o Correio da Manhã pensava que Almiro Baraúna era um indivíduo ligado à Marinha, conforme fica ressaltado quando lemos a reportagem que eles veicularam, ao informar que as fotos “foram tiradas pelo fotógrafo e cinegrafista Almiro Baraúna, ligado à Marinha de Guerra”. [54]
Entretanto, há uma falha cometida por Baraúna nessa cronologia. Como podemos observar no calendário abaixo, de fevereiro de 1958, quarta-feira de Cinzas era dia 19. Porém a anunciada reportagem no jornal Correio da Manhã somente foi veiculada na sexta-feira, dia 21, e não no dia seguinte ao final do Carnaval.
Apesar do prometido furo do Correio da Manhã, foi o jornal O Globo quem saiu na frente, informando em uma breve nota, desde o dia 20, o aparecimento de um “disco voador” sobre a ilha, porém ainda sem a confirmação da Armada. No entanto, a nota não alcançou impacto na mídia por não vir ilustrada com as fotografias. [55]
No seu depoimento do ano de 2000, em resumo Almiro Baraúna conta que após ter descrito a história do “disco voador” em Trindade a Martins, os dois encontraram com Leão Gondim de Oliveira, diretor-gerente da revista O Cruzeiro, que deu o aval para eles produzirem várias cópias fotográficas do “disco voador”, convocarem os jornais cariocas e as distribuírem gratuitamente aos repórteres. [3]
Segundo o fotógrafo, o objetivo era anular a exclusividade jornalística do jornal Correio da Manhã, fazendo com que os outros jornais também publicassem as fotos e a história no mesmo dia. O Correio da Manhã iria estragar o ineditismo da história que havia sido adquirida pela revista O Cruzeiro em contrato de exclusividade com o fotógrafo e, portanto, sem alternativas, tiverem que revidar.
Esta ação teria sido a solução encontrada pelo trio Gondim, Martins e Baraúna por causa de um acontecimento fortuito — a iminente divulgação das fotografias no concorrente jornal Correio da Manhã —, mas não por que o fotógrafo estava distribuindo seu trabalho desinteressada e gratuitamente a todos. Por meio do contrato de exclusividade que o fotógrafo havia firmado com o Diários Associados, ele já sabia que o grupo lhe devia algum valor monetário. [3]
No entanto, a entrevista que Baraúna afirma ter concedido aos jornais do Rio de Janeiro para contar a história e distribuir as fotografias não foi descrita por ele mesmo como exatamente uma coletiva, onde toda a imprensa carioca tivesse acesso livre. O próprio fotógrafo confirmou anos depois em uma entrevista concedida ao jornalista Aurélio Zaluar em 1979 que, pelo menos, o jornal Tribuna da Imprensa e o Diário de Notícias não foram convidados e não receberam as fotografias. [56]
Mas vejam bem, apesar de Baraúna ter afirmado que fez a distribuição das fotos ao restante da imprensa carioca, ao olharmos as edições dos jornais daquele dia 21 de fevereiro, com exceção dos periódicos Última Hora e O Globo, as fotografias estão estampadas apenas nos veículos da própria cadeia de jornais do Diários Associados — detentoras exclusivas de seu uso.
Ao ler a legenda de uma única foto veiculada no jornal O Globo — que não pertencia a este grupo de mídia — deduz-se que a redação copiou a fotografia daqueles outros jornais que já haviam publicado as mesmas pela manhã (naquela data o jornal O Globo circulava no período vespertino). [57]
Já o jornal Última Hora, que igualmente era de circulação vespertina e não pertencia ao grupo Diários Associados, é veiculada a matéria mostrando que foram os repórteres deste jornal que foram em busca do fotógrafo em sua residência, entrevistando-o para obter informações sobre a história.
O que conhecemos por intermédio da boca do próprio Baraúna dita naquela época é que seu contrato de exclusividade não lhe permitia conceder entrevista exclusiva aos órgãos de imprensa que eram concorrentes dos Diários Associados, inclusive inicialmente negou falar sobre o episódio aos repórteres do Última Hora, apesar deles terem conseguido lhe arrancar algumas informações — tal como a revelação de que pretendia “ganhar bastante dinheiro com as suas fotografias”. [58]
Revista O Cruzeiro adquire exclusividade dos negativos e fotografias
No mesmo dia em que os jornais iriam publicar pela primeira vez a história do sobrevoo do “disco voador” em Trindade, ou seja, em 21 de fevereiro de 1958 — o dia do furo jornalístico —, o grupo de mídia Diários Associados publicou uma nota nos jornais de sua cadeia para explicar toda a situação.
A nota com o título de “O Cruzeiro adquire exclusividade para a publicação das fotos” explica como os acontecimentos se sucederam e confirma que o Diários Associados, por intermédio da revista O Cruzeiro, fechou acordo com o fotógrafo Almiro Baraúna pelos direitos exclusivos das suas fotos e da história narrada por ele.
Segundo descreve a nota, a aquisição dos direitos foi concretizada antes de saberem que o jornal Correio da Manhã aparecesse anunciando que iria publicar as fotografias. Abaixo podemos ler na íntegra a nota veiculada no jornal Diário da Noite:
“O Cruzeiro adquiriu, com exclusividade para os ‘Diários Associados’, a sensacional documentação obtida pelo fotógrafo Almiro Baraúna da presença de um disco voador nas imediações da Ilha Trindade, quando ali se encontrava o navio-escola da Marinha de Guerra brasileira ‘Almirante Saldanha’.
A conveniência de não precipitar a divulgação de informações consideradas sigilosas pela Marinha, levou O Cruzeiro a aguardar por alguns dias a oportunidade do lançamento da curiosa e altamente documentada reportagem sobre o assunto, de autoria de João Martins, que aparecerá na próxima edição.
Todavia, como se soube ontem que o material sobre o assunto encaminhado à apreciação da Presidência da República fora cair em poder de elementos estranhos, adiantando a sua divulgação, ainda mesmo que a tal se opusessem as autoridades da Marinha e o autor da sensacional documentação fotográfica, O Cruzeiro resolveu antecipar no órgão líder dos Diários Associados alguns detalhes da importante reportagem.
O fotógrafo Almiro Baraúna, o único a colher os sensacionais flagrantes, transferiu aos Diários Associados, através da revista O Cruzeiro, a exclusividade da divulgação das mesmas. Assim, O Jornal e o Diário da Noite de hoje podem novamente oferecer aos seus leitores uma visão da estranha aparição em céus brasileiros dos discutidos discos voadores”. [59]
Uma das pessoas que conhecia essa história do contrato de exclusividade era Amilar Vieira Filho, um dos amigos de Almiro Baraúna do Clube de Caça Submarina de Icaraí, e que também confirmou ter avistado algo sobrevoando a ilha quando estava no convés do navio-escola Almirante Saldanha. Ele me contou brevemente em 2003 o que sabia sobre essa história da venda das fotografias, confirmando a versão transmitida pela nota do Diários Associados e os acontecimentos descritos pelo jornalista João Martins:
“[…] Baraúna tinha uma combinação com os Diários Associados para poder publicar a reportagem com exclusividade logo que a Marinha liberasse a divulgação. Mas o que aconteceu foi que o diretor do Correio da Manhã viu as fotografias que estavam com o presidente Juscelino Kubitschek. O Correio da Manhã ia dar o “furo” na segunda-feira, então os Diários Associados publicaram também no mesmo dia.” [51]
Naturalmente, aos 77 anos, há uma falha de memória ao relembrar incorretamente o dia da semana da divulgação da reportagem.
Segundo veiculou alguns jornais, tal como o Tribuna da Imprensa de 24 de fevereiro de 1958, o então presidente do Brasil Juscelino Kubitschek de Oliveira tinha em seu poder as cópias das fotografias porque elas haviam sido levadas a ele pelo almirante de esquadra e ministro da marinha, Antonio Alves Câmara Júnior. [60]
Ao lançar a nota, o Diários Associados demonstra não conhecer como as cópias das fotos haviam escapado do domínio da Presidência da República, no Palácio Rio Negro, em Petrópolis, Rio de Janeiro.
De acordo com o que Baraúna contou em suas entrevistas do ano 1997 e 2000, quando a senhora Niomar Moniz Sodré Bittencourt, mulher do senhor Paulo Bittencourt — então diretor-proprietário do jornal Correio da Manhã —, fez uma visita ao presidente Kubitschek, viu as cópias das fotos e lhe pediu emprestado, ao que este cedeu. Esta senhora teria entregado as fotos ao Paulo para publicá-las no jornal. [2][3]
Sendo assim, se a senhora Niomar não tivesse tido acesso às fotos quando elas eram ainda sigilosas, e as publicadas no Correio da Manhã, a história e as fotografias do “disco voador” iriam ser ineditamente publicadas na revista O Cruzeiro, detentora exclusiva delas. Somente quinze dias depois da inicial publicação nos jornais no Rio de Janeiro, a revista O Cruzeiro, que era de periodicidade semanal, publicou sem ineditismo as fotos e uma entrevista com Baraúna na sua edição de 08 de março de 1958.
Quando essa edição saiu nas bancas há a confirmação de que a publicação também era detentora dos negativos. “As sensacionais fotos, cujos negativos pertencem com exclusividade à Revista ‘O Cruzeiro’, tiveram a mais ampla repercussão na Imprensa”, estampa em destaque a reportagem. [53] A página da revista pode ser vista abaixo, com o meu realce em vermelho:
Quinze anos depois, a mesma revista O Cruzeiro voltou a entrevistar o fotógrafo Baraúna. Em uma edição de dezembro de 1973, ele próprio confirma a venda dos negativos a esta publicação: “O único dinheiro que recebi foram os 60 contos pagos por O Cruzeiro quando vendi o negativo.” [61]
O fotógrafo vendeu os negativos originais, porém há a possibilidade de que tenha criado e guardado para si uma cópia dele, um negativo de segunda geração. Deste modo, esta ação seria compatível com a declaração de Marcelo Ribeiro, informando que viu estes negativos nas mãos de Almiro Baraúna anos depois do episódio — apesar dele ter achado que o fotógrafo não vendeu o negativo original, como declarou.
Fotógrafo confirma que vendeu o direito de uso das fotografias para a revista O Cruzeiro
Em algumas entrevistas que o repórter fotográfico concedeu na época, ele próprio confirmou que vendeu o direito das fotos e do seu relato pessoal para a revista O Cruzeiro. Em uma delas, ainda em 1958 — e com a memória fresca —, declarou ao jornal Diário da Noite, veiculado no dia 22 de fevereiro de 1958, que por ter selado a negociação das fotografias com o Diários Associados, pretendia processar os outros jornais que haviam publicado suas fotos sem seu consentimento e sem pagar por elas:
“Vendi o direito das fotos e da história à empresa O Cruzeiro, que os adquiriu com exclusividade para os Diários Associados. No entanto, como é sabido, outros órgãos da imprensa publicaram a minha documentação. Tenho ou não razão para levar o caso à justiça?”. [62]
O fotógrafo se sentiu lesado. Os fatos históricos apresentados aqui (e sem esgotar todas as fontes) são bem claros em demonstrar que aquela imagem descrita por Marco Antonio Petit de que o fotógrafo distribuiu gratuita e irrestritamente suas fotos à imprensa por estar despojado de qualquer interesse financeiro é incorreta. Os investigadores que conhecem este episódio com mais profundidade sempre souberam da comercialização das fotos.
A Agência Meridional de Notícias — primeira agência de notícias do país, fundada em 1931 — não era uma empresa que apareceu posteriormente de forma inesperada (e para surpresa de Baraúna), como erroneamente publicou Marco Petit.
Sendo apenas uma das várias empresas do Diários Associados, o grupo de mídia já detinha direitos exclusivos sobre os negativos/fotos e sobre a história contada pelo protagonista. O papel da agência de notícias foi difundir as fotos dentro de sua cadeia de veículos e também vendê-las (com a notícia) ao exterior.
De acordo com o fotógrafo, sua única surpresa nessa história foi pelo valor que lhe foi ofertado pelos negativos. Ele disse que esperava receber uns 20 mil cruzeiros e, no entanto, o diretor-gerente da revista O Cruzeiro, Leão Gondim, que era primo de Assis Chateaubriand, lhe ofereceu 60 mil. [2][3]
Essa é que foi a surpresa dele, porque desde sempre, por meio do contrato de exclusividade que ele havia firmado com o Diários Associados, já sabia que o grupo lhe devia algum valor monetário. Ele contou que lhe pagaram muito mais do que ele esperava receber e ficou surpreso com o valor alto.
Na entrevista de 1997 o repórter fotográfico menciona que vendeu os negativos diretamente à Agência Meridional de Notícias, contrariando o que publicou a própria revista O Cruzeiro e as declarações do fotógrafo na época. Na verdade este é um julgamento pouco importante, pois nós sabemos que as duas empresas pertencem ao mesmo grupo de mídia Diários Associados.
Quando Marcelo Ribeiro contou a mim esta história da negociação das fotografias, ele cometeu um erro sobre um fato histórico ao ter afirmado que Baraúna vendeu as fotografias ao jornal Correio da Manhã. “Primeiro ele vendeu pra o jornal Correio da Manhã. Aí, O Cruzeiro se interessou pra fazer uma reportagem, aí ele vendeu pra O Cruzeiro, e depois pra umas revistas europeias e americanas”, declarou. [1]
Nós identificamos facilmente essa falha quando fizemos a entrevista, mas julgamos que ao mencionar o nome do jornal Correio da Manhã é possível que estejamos de frente a uma falha de memória. Assim como ele também trocou o nome do veículo em que foi publicada a história do tesouro, de Tribuna da Imprensa por O Mundo Ilustrado, talvez estivéssemos presenciando algo parecido aqui.
Avaliamos nesta linha porque, além dele corretamente descrever que as fotos foram intencionalmente comercializadas — e não dadas gratuita e desinteressadamente —, corretamente menciona que as fotografias foram vendidas para a revista O Cruzeiro.
Apesar de não ter existido a venda das fotografias para o jornal Correio da Manhã, na verdade a sequência de acontecimentos em sua declaração é, em linhas gerais, correspondente aos fatos históricos: inicialmente as fotos do “disco voador” apareceram em jornais na data de 21 de fevereiro de 1958. Os periódicos O Jornal e o Diário da Noite, pertencentes à mesma rede do Diários Associados — que adquiriram o direito das fotografias — foram um dos veículos que publicaram as imagens.
Quinze dias depois a revista O Cruzeiro lançou a reportagem com as fotografias e, nesse meio tempo e posteriormente, as fotografias eram vendidas pela Agência Meridional de Notícias para publicações ao redor do mundo. No contexto geral da sua declaração, julgamos que a menção equivocada ao nome do jornal Correio da Manhã não é suficiente para invalidar todo seu depoimento sobre este tópico, mas Petit se agarrou a este erro porque foi o que lhe sobrou.
Na contramão desta avaliação, o próprio Marco Antonio Petit, que diz ser profundo conhecedor do caso Trindade, comete equívocos mais fundamentais. Petit desconhece que o direito de uso das fotografias e da narração da história foram vendidos pelo fotógrafo Baraúna por meio de um contrato de exclusividade firmado com o Diários Associados por intermédio da revista O Cruzeiro, informando erroneamente que o mesmo agiu desprovido de interesses financeiros ao distribuir gratuitamente cópias das suas fotos aos jornais cariocas.
Ele também informa erroneamente que, posteriormente à veiculação das fotografias na mídia o fotógrafo teria sido “surpreendido” por uma agência de notícias, a Agência Meridional de Notícias, que estaria interessada na compra de seus negativos, além de desconhecer a venda dos mesmos negativos à revista O Cruzeiro. Ou seja, a sua emenda saiu pior que o soneto.
Essa situação pitoresca deve ser realçada em contraste aqui: mesmo com erro, Ribeiro conhece alguns fatos históricos da venda das fotos/negativo que Marco Antonio Petit completamente as desconhece. Para nós não há surpresa alguma, pois seu conhecimento do caso Ilha da Trindade é praticamente restrito ao que Almiro Baraúna lhe contou em 1997, não tendo pesquisado as fontes históricas da época. Na oportunidade em que entrevistou o fotógrafo, este não lhe contou parte da história que acabamos de descrever neste tópico, portanto a desconhece.
Com ou sem erro de Ribeiro, nós deixamos bem claro aqui, em várias citações históricas (e sem esgotar todas as fontes), que jamais foi preciso nos ater exclusivamente a uma única vírgula sequer do depoimento dele para descrever essa história. O que acabamos de apresentar são fatos históricos que têm vida independente e já eram muito bem conhecidos pelos pesquisadores antes de ele aparecer no cenário — além de ser plenamente checáveis por qualquer pessoa.
O império de mídia Diários Associados e a revista O Cruzeiro
Desamparado por fatos históricos que claramente demonstrou não conhecer e alicerçado em seu conhecimento superficial do caso Trindade, Petit emenda sua sequência de avaliações equivocadas. Ele afirma que se a história da venda das fotos fosse “minimamente verdadeira, Baraúna teria sido um dos maiores falsários da história do país e teria enganado também um dos maiores grupos de comunicação [o Diários Associados] que existia na época”.
E acrescenta esbravejando “o quão são absurdas” as declarações de Ribeiro acerca da existência de uma negociação das fotografias, ajuntado ainda que a versão contada por ele “é uma grande brincadeira, uma ofensa à inteligência dos leitores” e uma “desqualificada denúncia”.
Sem economizar sua demonstração ostensiva de desconhecimento de fatos históricos de um caso que sequer investigou direito, ele ainda chega ao cúmulo de me criticar por eu ter questionado Ribeiro se Baraúna havia negociado suas fotografias com a revista O Cruzeiro, como de fato aconteceu, mas que ele desconhece.
Deixando de lado seu exagero nababesco de “maiores falsários da história do país”, nós já vimos aqui como o próprio Baraúna e o grupo de mídia Diários Associados confirmaram a negociação da venda das fotografias à revista O Cruzeiro. O que resta ademais é o seu claro desconhecimento do contexto histórico da imprensa daquela época.
Nós devemos relembrar aqui que o próprio fotógrafo confessou em entrevista gravada em áudio (2000) e para o próprio Petit (1997), que vendeu ao jornal Tribuna da Imprensa — que não era um jornal de quermesse — uma reportagem forjada como se fosse real de um tesouro encontrado numa ilha, há apenas menos de dois anos antes do episódio da Ilha da Trindade ocorrer. [2][3]
Sim, o fotógrafo confirma que conseguiu enganar outro grande veículo de comunicação da época, o jornal Tribuna da Imprensa. O motivo, dita pelo próprio, nós já sabemos: uma aposta combinada com seus colegas para conseguir enganar um sapiente e experiente profissional da imprensa que trabalhava naquele periódico.
Ele confessou publicamente que o jornal lhe pagou quatro mil cruzeiros pela reportagem e a publicou em quadro edições, confiando ser a reportagem um relato autêntico de um tesouro perdido. [2][3]
A história do “disco voador” da Ilha da Trindade deve ser analisada dentro do conhecimento científico que existia naquela época sobre a possibilidade de vida inteligente fora do planeta Terra. Essa análise histórica nos permite aparar arestas de anacronismo, mas não vou me estender aqui, pois é uma longa história para outra oportunidade.
O Diários Associados não adquiriu os negativos com a intenção direcionada em realizar uma análise científica que visasse o teste de autenticidade — de fato, é desconhecida qualquer perícia nos negativos a cargo deste grupo de mídia. O grupo queria exclusividade do direito de imagem para vender a reportagem e ganhar dinheiro, assim como qualquer empresa jornalística que ganha a vida vendendo notícias.
Naquela época, no início da era espacial, quando o homem ainda não tinha ido à Lua e o primeiro satélite artificial Sputnik tinha sido lançado há apenas menos de quatro meses antes do episódio no navio Almirante Saldanha ter ocorrido, o numerário de 60 mil cruzeiros pagos a Baraúna demonstra o valor que fotos de uma alegada nave de outro planeta tinham naquela época.
Segundo o fotógrafo declarou em 2000, o montante “deu pra comprar um apartamento” — bem diferente das fotos de “naves alienígenas” de hoje que não valem um tostão. [3] O Diários Associados pagou este alto valor porque sabia que poderia ganhar muito mais ao vender por meio da sua Agência Meridional de Notícias as cópias dessas fotografias às agências de notícias ao redor do mundo.
Como já vimos aqui, inicialmente devemos destacar que o intermediador da negociação dos direitos exclusivos da fotografia/história do “disco voador” entre Baraúna e a revista O Cruzeiro era ninguém menos que o jornalista João Martins, o mesmo que há menos de seis anos antes havia sido protagonista da dantesca fraude do caso Barra da Tijuca, veiculado na mesma publicação.
Em parceria com o fotógrafo da mesma revista, Eduardo Schulz Keffel, as cinco fotos trucadas de um disco voador, que eles disseram ter surgido no bairro da Barra da Tijuca no Rio de Janeiro, foram publicadas por Martins na edição de O Cruzeiro de 17 de maio de 1952 — que a anunciou com estardalhaço e esgotou todas suas edições. [63]
Nesse ninho de suspeitos e cascateiros emerge a figura do homem que negociou o valor dos negativos do “disco voador” da Trindade diretamente com Almiro Baraúna, o diretor-gerente da revista O Cruzeiro Leão Gondim, que também estava presente na redação da revista no momento da revelação da fraude fotográfica de Ed Keffel — ciente ou não da farsa.
O Cruzeiro foi uma revista que marcou época, mas algumas de suas matérias eram principalmente exacerbadas pelo sensacionalismo e o descompromisso com a verdade. A história da Ilha da Trindade foi ancorada numa publicação que também veiculava fraudes jornalísticas, tanto em fotografias como em histórias. O caso Barra da Tijuca não foi o único ardil dessa revista e do grupo Diários Associados.
Eu diria que entregar as fotos da Trindade à revista O Cruzeiro era tudo aquilo que ela precisava para fazer sensacionalismo e vender revista, como havia feito com as fotos de Keffel anos antes. Não nos estranha que no final daquele mesmo ano de 1958 a revista já estava às voltas com mais um embuste fotográfico de discos voadores, mas não vamos nos ocupar dessa história aqui.
(O sensacionalismo barato pra vender revista em torno do tema não parece ter mudado muito ao longo das décadas, pois hoje em dia manchetes em revistas como a brasileira UFO anunciam o retorno de Jesus em um disco voador, propaladas por indivíduos que dizem ter contato com babalorixás extraterrestres.)
Este episódio da Barra da Tijuca tem muito a ensinar quando comparado ao caso Ilha da Trindade. Keffel também era um dos melhores fotógrafos de seu tempo. Os dois profissionais, Baraúna e Keffel, tinham a mesma faixa de idade quando estiveram envolvidos com suas histórias, 41 e 48 anos, respectivamente.
As duas histórias também estiveram envolvidas por militares — que especificamente validaram como reais as fotografias do “disco voador” de Ed Keffel, mesmo sendo elas hoje reconhecidas como um truque de dupla exposição feita na máquina. Tanto Keffel quanto Martins jamais confessaram em público que as suas fotografias do “disco voador” eram falsas. Ao contrário, sempre endossaram e confirmaram, publicamente, que as fotos eram verdadeiras, e morreram sustentando a veracidade delas.
Keffel foi entrevistado pela mesma revista O Cruzeiro na década de 70, e novamente confirmou que as fotos eram autênticas. [61] Anos depois do truque, Martins continuava escrevendo sobre discos voadores na mesma publicação em que era funcionário.
Em 17 de abril de 1987 no programa televisivo Terceira Visão da emissora Bandeirantes, Martins conta, placidamente e com a serenidade de um monge, a história de como ele viu o “disco voador” e alertou Keffel para fotografá-lo. [64] Ele é muito convincente, mas não era um bad guy. Homens sérios — como ele e Keffel eram — também fizeram truques e o promoveram como verdadeiros.
Neste mesmo programa, que era apresentado pelo espiritualista Luiz Gasparetto, também estava presente Almiro Baraúna, aos 70 anos, contando sua história com igual seriedade. Antagonicamente e curiosamente, suas microexpressões faciais e linguagem corporal vistos na TV são bem diferentes daquelas apresentadas em sua entrevista dez anos depois, em sua casa.
Nesta oportunidade, descontraído, Baraúna conta a história da Trindade com risos — a mesma expressão que ele usa ao confessar o truque feito do tesouro na ilha.
Ausência de confissão pública de trucagem fotográfica não é comprovação de sua autenticidade. Segundo escreveu o jornalista Luiz Maklouf em seu livro Cobras Criadas: David Nasser e O Cruzeiro, o fotógrafo Jorge Audi — colega de Martins da mesma revista O Cruzeiro — lhe contou que Martins havia confessado a ele, em privado, que tudo foi um truque. [65]
Com ou sem confissão pública de fotomontagem, a existência da trucagem nas fotos da Barra da Tijuca é uma constatação de ordem física: algumas das fotos da série de cinco têm dois focos divergentes de iluminação, são uma montagem e ponto final! [66][67]
A história do envolvimento do presidente Juscelino Kubitschek no caso Trindade
Pensando que estava apresentado fatos inéditos e desconhecidos dos outros investigadores, a história do envolvimento do então presidente do Brasil Juscelino Kubitschek com as fotos do “disco voador” da Ilha da Trindade foi exposta no artigo de Petit. Não há absolutamente novidade alguma do que já era amplamente conhecido, há anos, por qualquer pesquisador deste caso.
Novamente devemos revelar aqui que o escrito por ele é justamente a literal transcrição do que Almiro Baraúna havia lhe contado na já citada entrevista de 1997, sem tirar nem por, porém ele não menciona especificamente esta fonte. Ao ler o que ele transcreveu, desavisados podem ter imaginado que estas informações foram obtidas por meio de três décadas de uma extensiva pesquisa sobre o caso em entrevistas realizadas “em várias ocasiões” com o fotógrafo.
Esse tipo de expediente utilizado por ele é tão desconjuntado do contexto das pesquisas que seria o mesmo procedimento se eu pegasse a entrevista que fiz em 2003 com a testemunha Amilar Vieira Filho e a republicasse aqui como se fossem informações desconhecidas dos outros investigadores, obtidas por meio de entrevistas “em várias ocasiões” com Amilar.
Certamente seriam informações consideradas novidade para Petit, pois demonstra estar alheio às investigações, mas certamente seria considerado pelos outros pesquisadores deste episódio um insulto às suas inteligências.
Aliás, a única pessoa que parece ter tomado conhecimento pela primeira vez dos fatos requentados acerca do envolvimento do ex-presidente Kubitschek foi o seu próprio editor da revista UFO, ao aparecer na lista de discussão internacional UFO Updates anunciando estes fatos como se fossem inéditos. (Ele igualmente imagina que Petit revelou em seu artigo informações que ninguém no planeta conhecia, sem saber que o mesmo apenas transcreveu o que Almiro Baraúna lhe contou em 1997.)
Petit também transmite outra versão da história do envolvimento do ex-presidente Kubitschek publicada em um artigo do ufólogo Alberto Francisco do Carmo. [68] Há dez anos, eu justamente falei com este ufólogo buscando conhecer sua opinião sobre este episódio.
No e-mail que ele me respondeu, datado de 04 de dezembro de 2002, relata como ficou sabendo do trâmite de como as fotos de Almiro Baraúna vieram a público após passar pelas mãos do então presidente do Brasil Juscelino Kubitschek. Reproduzo aqui um extrato deste e-mail, que é a mesma história que ele descreve em seu artigo. Eis a versão da qual Alberto Carmo teve conhecimento e me contou:
“Eu tenho um bom conhecimento dos bastidores, inclusive a intervenção do presidente Juscelino em pessoa para liberar as fotos. Requisitou-as na marra e escolheu o Dr. Paulo Bittencourt, seu amigo e diretor do Correio da Manhã. E disse ao amigo: pode publicar.
Com isto ele respondeu à interpelação do deputado Sérgio Magalhães do PSB-Partido Socialista Brasileiro (da época, bem diferente do de hoje) que fazia oposição ao governo JK. JK tinha horror a qualquer cerceamento de opinião e resolveu pôr a mão na massa.
Eu me lembro que comprei o Correio da Manhã, tinha quatorze anos e estava como muitos da época me iniciando no hábito de ler jornais. Meu melhor amigo lia o Diário de Notícias e eu lia o Correio da Manhã. Era assim. Quem morava nos estados, escolhia um jornal do Rio ou São Paulo, para ficar melhor informado — portanto além do jornal da província.
O deputado Sérgio Magalhães (falecido) é pai da atriz e diretora Ana Maria Magalhães. Quem me contou o caso JK foi o Prof. Luiz Alberto Vianna de Moniz Bandeira, rapazola na época e que trabalhava como assistente parlamentar do deputado Sérgio Magalhães.
A interpelação foi por carta, não por discurso em tribuna, que já procurei nos anais da Câmara. O Hynek no livro OVNI UFO Report menciona o Sérgio Magalhães, mas, por exemplo, nem menciona ou sabia da preferência dada ao Correio da Manhã, pelo JK.”
Não irei me ocupar detidamente aqui de uma análise das diferentes versões contadas por Almiro Baraúna e por Luiz Bandeira (retransmitidas por Carmo), por não ter influência na veracidade ou não do episódio de Trindade. Entretanto, eu julgo que essa versão contada a ele por Bandeira ser comprovadamente inverídica, pelo menos no seu bojo.
Não seria possível que o então presidente Juscelino Kubitschek se sentisse pressionado para divulgar o episódio de Trindade — quando ele ainda era sigiloso — por causa de uma interpelação por carta do deputado Sérgio Magalhães.
Como já vimos aqui, o deputado solicitou informações às autoridades sobre o episódio de Trindade em 27 de fevereiro de 1958, quando o ocorrido já era público, tendo, na verdade, tomado conhecimento dos acontecimentos assim que o mesmo foi amplamente divulgado pela imprensa. Além disso, a solicitação foi executada por meio de um Requerimento de Informação da Câmara, e não por carta. [4][6][7]
A dinâmica dos acontecimentos no convés do navio-escola Almirante Saldanha
Ao falar sobre os momentos antecedentes à suposta aparição de um “disco voador” sobre a Ilha da Trindade, Marcelo Ribeiro me contou que Almiro Baraúna “estava fazendo fotos submarinas pra Marinha e quando saiu [de dentro d’água], ele não tinha mais filme na máquina. Ele já tinha usado tudo lá embaixo.” [1]
Quando Ribeiro mencionou que Baraúna estava saindo da água, eu próprio o interpelei neste ponto informando que o fotógrafo dizia que já estava no convés do navio no momento da execução da fotografia, ao que ele emendou: “Quando ele saiu de dentro d’água, é claro que ele vai para o convés. Quando ele chegou ali, as pessoas estavam olhando: ‘Olha lá, olha lá…’ etc. E ele viu. Ele viu que realmente tinha alguma coisa.” [1]
Marco Antonio Petit rebate, dizendo que “não possui o menor fundamento a informação de que Almiro Baraúna havia acabado de sair da água, depois de mais um mergulho” […]. E emenda: “Como se sabe, no momento do surgimento do UFO, a embarcação já estava nos preparativos finais para deixar o arquipélago de Trindade. Baraúna havia chegado da ilha momentos antes, não de um mergulho, e tinha ido se deitar devido ao enjoo que o acometeu — foi justamente neste momento que foi alertado pelos militares quanto à presença do artefato na área e correu para registrá-lo”.
Na sua entrevista de 1997 com Almiro Baraúna, o repórter fotográfico não lhe contou em detalhes os momentos que antecederam à sua chegada ao convés do navio, assim Petit simplesmente desconhece estes acontecimentos.
Na manhã do fatídico dia 16 de janeiro de 1958, Almiro Baraúna e os seus amigos do Clube de Caça Submarina de Icaraí ainda estavam em solo, na ilha. O que Marcelo Ribeiro narra resumidamente é justamente o retorno do fotógrafo à embarcação e a sua subida até ao convés. Mas não precisamos do depoimento dele para tentar reconstruir essa história.
De acordo com o relatório que resgatei na Marinha do comandante da ilha na ocasião, o capitão de corveta Carlos Alberto Ferreira Bacellar, intitulado “Relatório de fim de comissão. Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade. Período de 1º de novembro de 1957 a 16 de janeiro de 1958”, a aparição de algo no céu ocorreu por volta das 11:00 horas da manhã:
“Finalmente, no dia 16, cerca de 11:00, achava-me já a bordo do NE ‘Almirante Saldanha’, após a passagem de Comando do Posto, quando fui avisado de que um objeto aéreo não identificado fora visto, de bordo, sobre a ilha.” [14]
No relatório final da Marinha sobre o episódio, assinado pelo capitão de corveta José Brandão, o horário da observação é mencionada em cerca de 12:15 da tarde. [12] A despeito da divergência de horários, o navio estava nos preparativos para zarpar, em faina.
Na sua última entrevista conhecida sobre o episódio, gravada em 02 de julho de 2000, Almiro Baraúna conta ao grupo CFO de ufologia os detalhes do seu retorno do solo ao convés do navio Almirante Saldanha. Para regressar ao navio os militares começaram a embarcar o pessoal e os equipamentos em várias viagens.
Neste trânsito até ao navio era necessário utilizar embarcações de transporte. Uma delas era uma pequena embarcação de madeira, presa a um cabo de aço, que os militares apelidavam de “cabrita”. Neste transporte, Baraúna narra que uma onda maior atingiu a “cabrita” e lhe jogou ao mar, junto com seu equipamento de fotografia. Recomposto do susto, ele subiu novamente nela.
Em seguida, os tripulantes pularam da “cabrita” para outra embarcação de transporte, o batelão. Ao chegar rente ao navio-escola Almirante Saldanha, o batelão encosta o mais próximo possível de seu costado e o indivíduo se agarra a uma escada de corda para subir ao convés. [3]
O próprio Almiro Baraúna confirmou na época, em entrevista ao jornal Última Hora, veiculado na edição de 22 de fevereiro de 1958, que regressou ao navio após um mergulho:
“No dia 16 de janeiro, por volta do meio-dia, voltei de uma saída de pescaria, numa lancha e, ao regressar, fiquei conversando no navio. Em determinado momento, ouvi um grito: olha o disco! Todos do grupo, umas vinte pessoas olharam e viram o engenho”. [69]
Ao comparar seu depoimento com o de Ribeiro, citado acima, nós podemos notar que há semelhanças neles — as duas versões são apenas relatos resumidos de uma sequência de eventos. Uma das atividades que o fotógrafo exercia como convidado da Marinha era fotografar a fauna submarina da região. A pescaria que o repórter fotográfico se refere nesse depoimento ao jornal é justamente a pesca submarina.
Com base no depoimento do próprio fotógrafo é razoável não descartar, a priori, a possibilidade de que tenha ocorrido este mergulho em momento anterior ao seu efetivo embarque no navio, não necessariamente adjunto à embarcação.
Neste momento eu devo alertar aos leitores que “misteriosamente” todo o trecho da resposta de Ribeiro “quando ele saiu de dentro d’água, é claro que ele vai para o convés” apareceu na revista UFO (na entrevista parcial veiculada) deslocado para dentro da minha pergunta, como se fosse eu que a tivesse proferido.
Eu quero acreditar que essa disparidade com o original tenha sido um erro de edição veiculada na versão impressa da revista. Aproveito o momento para alertar àquelas pessoas que estão em busca de dados fidedignos e informar que a única versão legítima dessa entrevista é aquela que está hospedada no meu site pessoal.
Eu não assino embaixo daquela versão parcial da entrevista reproduzida na edição impressa da revista UFO. Portanto, eu respondo apenas pela única versão original que está em meu site e que já passou mais uma vez por revisão para condizer com o que a testemunha relatou.
Marco Petit ainda conta que “não levam em consideração que o fotógrafo, no momento em que o UFO surgiu e começou a ser observado, estava deitado e acometido de forte enjoo, e que foi intimado pelos militares para se levantar e tentar documentar a presença do objeto”.
E continua: “Segundo Baraúna revelou pessoalmente, alguns dos militares chegaram até a pegar em armas no momento da observação, gerando uma quase histeria a bordo. E disse que acabou por ser derrubado duas vezes no convés do navio, em meio à correria dos membros da tripulação. Enfim, este foi o ambiente em que foram obtidas as fotografias”.
Essa é uma versão da história contada pelo próprio Almiro Baraúna 39 anos depois do ocorrido no já citado vídeo da entrevista de 1997. Está mais do que claro aqui que esta é a única das declarações do repórter fotográfico que Petit utiliza para analisar o caso Ilha da Trindade, simplesmente ignorando (na verdade ele desconhece) todos os outros depoimentos do fotógrafo concedidos em outras datas.
Seu recente texto sobre este caso é a mais superficial e desatualizada análise que alguém já publicou sobre o episódio, desde que ele começou a ser revisado há mais de 15 anos atrás, limitando-se a repetir literalmente aquilo que o fotógrafo lhe contou nesta oportunidade. (E essa revista circula por aí, vendida como se o exarado nela contém o resultado de uma profunda investigação com “novas e surpreendentes revelações”.)
Há versões ligeiramente diferentes acerca deste exato momento, contadas pelo próprio Baraúna ao longo dos anos. Por exemplo, três anos depois deste depoimento, em entrevista ao grupo CFO de ufologia o fotógrafo disse que já havia levantado, mas por não por ter sido intimado por militares, e sim por ter sido chamado por seu amigo fotógrafo José Farias de Azevedo, do Jornal do Brasil, com a intenção de fotografar uma embarcação que estava sendo içada.
Segundo o fotógrafo, foi justamente por estar preparando a câmera para fotografar o içamento dessa embarcação que ele justificava a superexposição sofrida em seu filme, pois usava uma configuração da máquina para esta cena e acabou fotografando outra, permitindo a entrada de luz em demasia. [3]
A partir daí disse ter ouvido algumas pessoas gritarem da proa do navio e logo após conta que um militar veio correndo da proa avisando que “o disco apareceu outra vez”. Em seguida seu colega do Clube de Caça Submarina de Icaraí o alertou para que fotografasse o “objeto”. [3]
Esta versão do ano 2000 encontra alguma semelhança com aquela contada em 1958 ao jornalista João Martins, veiculada na revista O Cruzeiro da edição de 08 de março de 1958:
“Eu estava no convés observando a faina da suspensão da lancha na qual são feitos os desembarques para a Ilha até a metade do caminho […]. De repente, fui chamado em altos brados pelo capitão Viegas e por Amilar Vieira, [amigos de Baraúna do mesmo Clube de Caça Submarina de Icaraí] os quais apontavam determinado lugar no céu e gritavam que estavam vendo um objeto brilhante se aproximar da ilha. Nesse momento exato, quando eu ainda tentava ver o que era, o tenente Homero, dentista de bordo, veio também da proa, em nossa direção, correndo, apontando para cima e também gritando que estava vendo um objeto.” [53]
No entanto, em minha conversa com Amilar Vieira Filho no ano de 2003, ele me contou que somente viu o “objeto” quando “já estava do lado do Pico Desejado”; ele confirma que “a chegada dele no pico eu não vi nada”. [51]
Ou seja, se confrontarmos esta versão contada por Baraúna na revista O Cruzeiro (e para os jornais da época) com aquela narrada por Amilar seria impossível ao fotógrafo ter conseguido bater, pelo menos, as duas primeiras fotografias, pois ele somente conseguiria visualizar o “disco voador” após Amilar ter lhe chamado, e assim não teria conseguido fotografar a aproximação dele da ilha e nem seu inicial sobrevoo por sobre ela.
No relatório final que a Marinha produziu acerca da investigação dos objetos aéreos observados na ilha ficou registrada a versão de que foi seu amigo José Teobaldo Viegas quem o alertou para fotografar o “disco voador”, e não militares, além de informar que o alarme foi dado por membros da tripulação localizados na proa e da popa do navio. [12]
Como vemos, existem algumas diferentes versões da dinâmica ocorrida a bordo do navio contadas pelo próprio Almiro Baraúna, que podem, em parte, ser retratos mal lembrados de uma sequência de eventos. Se formos reconstruir a história com base unicamente em seus depoimentos teremos versões ligeiramente dispares das ocorrências a bordo.
Eu já havia escrito um approach ao tentar reconstruir a dinâmica a bordo do navio no meu artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, de 06 de maio de 2011. No entanto, há muito mais a ser dito sobre o conjunto de acontecimentos a bordo da embarcação. O que eu escrevi aqui foi apenas uma brevíssima e ligeira abordagem, apesar desta análise mais detalhada ficar para outra oportunidade.
A análise dos negativos e a possibilidade de trucagem
Segundo me contou Marcelo Ribeiro, o fotógrafo Almiro Baraúna havia lhe confidenciado que as fotos do “disco voador” da Trindade são uma montagem feita em seu laboratório fotográfico, assim que retornou da viagem da ilha. Eu já havia sumarizado a questão da análise dos negativos no meu artigo “Caso da Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, de 06 de maio de 2011. Aqui, vou novamente traçar alguns pontos, porém sem esgotar esta abordagem.
Segundo consta no relatório final da Marinha sobre o episódio da Ilha da Trindade, intitulado “Relatório sobre a observação de objetos aéreos não identificados, registrados na Ilha da Trindade, no período compreendido entre 5 de dezembro de 1957 e 16 de janeiro de 1958”, assinado pelo capitão de corveta José Geraldo Brandão, oficial do Serviço da Inteligência responsável pela investigação do caso no Estado-Maior da Armada (EMA), os negativos do “disco voador” de Almiro Baraúna foram inicialmente analisados pelo Departamento de Hidrografia e Navegação (DHN) da própria Marinha. [12]
Numa seção do relatório chamada de “fatores positivos” da fotografia, Brandão reproduz a conclusão obtida dessa primeira análise: “O técnico do Departamento de Hidrografia e Navegação da Armada, depois de analisar os negativos, afirmou que são naturais.” [12]
O nome do responsável não ficou registrado na história pública e, até o presente, ninguém sabe quem era essa pessoa (ou pessoas) e nem suas habilidades profissionais como perito em análises para detectar burlas fotográficas. Não é mencionado textualmente no relatório o uso de instrumentos nesta inspeção, tais como microscópio ou uma lupa, o que leva a crer ter sido uma inspeção preliminar.
Posteriormente, visando efetuar uma nova análise, o relatório da Marinha descreve que os negativos foram enviados a uma empresa civil de cartografia aérea chamada Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul S. A. A conclusão dos técnicos foi reproduzida na mesma seção “fatores positivos” da fotografia no mencionado relatório:
“Os técnicos do Serviço Aerofotogramétrico da Cruzeiro do Sul, após exames microscópicos para verificar a granulação, análise de sinais, verificação de luminosidade e detalhes de contornos, afirmaram:
Não havia sinal algum de fotomontagem nos negativos mencionados e toda evidência demonstrava que eram realmente negativos de um objeto verdadeiramente fotografado;
A hipótese de uma fotomontagem tramada após o avistamento está definitivamente excluída;
É impossível provar tanto a existência como a inexistência de uma prévia fotomontagem, o que exige todavia uma técnica de alta precisão e circunstâncias favoráveis para a sua execução.” [12]
Também não ficou registrado na história pública o nome e nem as qualificações profissionais desses técnicos envolvidos na análise dos negativos, com exceção do chefe do departamento, de primeiro nome Stefano — informação apenas veiculada em reportagens dos jornais da época.
Ao contrário da análise efetuada no Departamento de Hidrografia e Navegação da Marinha, agora é mencionado um exame microscópico. Em suma, os técnicos do Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul não encontraram sinal de montagem nos negativos e tudo indicava ser um objeto físico fotografado. Até aí, um modelo de pequenas dimensões também pode ser considerado um objeto tridimensional fotografado, que reflete luz e impressiona a película.
Na conclusão dos técnicos desta empresa descartaram a possibilidade de uma montagem fotográfica ter sido realizada posteriormente ao acontecimento a bordo do navio, porém não conseguiram descartar a possibilidade de uma montagem ter sido realizada previamente.
Este é o ponto crucial da conclusão de quem analisou este negativo na empresa Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul. O que temos aqui é uma perícia para encontrar rastros de trucagem em que a sua conclusão não ficou atrelada exclusivamente ao exame físico dos negativos. Independente de uma possível fotomontagem ter sido executada antes ou depois do episódio a bordo do navio, o exame dos negativos é de ordem física e deveria falar por si.
Ou seja, este tipo de exame deveria ser independente da possibilidade de Baraúna ter feito a montagem dias antes da alegada aparição do “disco voador” no céu — ainda na Ilha da Trindade — ou dias depois de voltar da ilha — já em sua casa.
(É claro que a análise da iluminação e da sombra dos elementos que compõem o cenário da fotografia deve ser compatível com o relato do fotógrafo e com o horário em que foram obtidas as fotografias, mas não é este tipo de análise que estamos tratando especificamente aqui). Em resumo, os técnicos que analisaram esse negativo na Serviço Aerofotogramétrico da Cruzeiro do Sul concluíram que:
a) a hipótese de uma fotomontagem executada posteriormente está definitivamente excluída;
b) é impossível provar que existe uma prévia montagem;
c) é impossível provar que não existe uma prévia montagem.
Os negativos não foram autenticados por esta empresa porque não foi possível descartar a possibilidade de eles terem sido montados em uma oportunidade anterior aos acontecimentos a bordo do navio. Foi por esta razão que, baseada na análise desta empresa civil, oficialmente a Marinha não os autenticou, concluindo em seu relatório final que:
“Que a mais valiosa prova apresentada, a fotográfica, de alguma maneira perde sua qualidade convincente devido à impossibilidade de provar uma prévia fotomontagem.” [12]
O que a ufologia tem repetido durante mais de 50 anos é a afirmação contrária, que não foi a conclusão obtida: “Se não foi detectado uma montagem nos negativos, então eles são autênticos”. Quem analisou estes negativos na Serviço Aerofotogramétrico da Cruzeiro do Sul não chegou a esta conclusão.
Na avaliação desta empresa, a ausência física de vestígio de montagem na análise que efetuaram não era prova positiva de sua inexistência e nem muito menos um atestado de sua autenticidade. Enfim, a possibilidade de fraude fotográfica não foi descartada, pois os negativos poderiam ser sim apenas uma montagem muito bem elaborada.
Uma pessoa que compreendeu a conclusão da empresa Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul foi Amilar Vieira Filho, amigo de Baraúna, então presidente do Clube de Caça Submarina de Icaraí e que confirmou ser testemunha da alegada “aparição”. Ele me contou em entrevista no ano de 2003 que:
“[…] quando as autoridades enviaram os negativos para estudo no Serviço Aerofotogramétrico Cruzeiro do Sul, eles concluíram que ‘não podiam dizer que houve fraude’. Então veja, pode até ter havido, mas podia até ser uma fraude tão bem-feita…”. [51]
Devemos levar em consideração também que esta empresa era de cartografia aérea. Empresas deste ramo têm costumeiramente foco na prestação de serviços técnicos de engenharia cartográfica e comumente constam em seus quadros de profissionais como cartógrafos, engenheiros, fotogrametristas, topógrafos, fotógrafos e laboratoristas.
Indivíduos que atuam profissionalmente nestas áreas são especialistas em seus campos de trabalho específicos, mas, mesmo laboratoristas e fotógrafos, não necessariamente detenham a expertise em perícias forenses para detectar variados tipos de burlas fotográficas bem elaboradas ou mesmo saibam criá-las.
Não nos espanta que seja desconhecida publicamente a informação de que esta empresa tenha expedido algum laudo da autenticidade de alguma outra fotografia, de qualquer natureza, seja antes ou depois das análises efetuadas nas fotografias de Baraúna.
Quando alguns oficiais superiores, como o capitão de fragata Paulo Moreira da Silva e o capitão de corveta Carlos Alberto Bacellar, emitiram suas opiniões publicamente sobre a veracidade das fotografias, afirmaram acreditar na sua autenticidade, apesar de ressaltarem que estavam emitindo uma opinião em seus próprios nomes, e não chancelados pela instituição Marinha.
Além disso, eles não eram peritos em fotografia e, como não analisaram os negativos, não estavam emitindo uma avaliação técnica sobre eles (inclusive nem mesmo disseram ter visto algo no céu naquela data). [24][29][30]
Na época da ocorrência do episódio de Trindade o relatório final da Marinha era confidencial e o público não teve acesso ao documento. Quando o Ministério da Marinha lançou a sua nota oficial em fevereiro de 1958 para informar que não se opunha à divulgação dos acontecimentos do “aparecimento de estranho objeto” aéreo dentro de sua jurisdição marítima, parte da imprensa da época interpretou essa nota como uma validação das fotografias do “disco voador”, divulgando precipitadamente em manchetes que a Marinha havia autenticado as fotos. [70]
Uma das edições desses jornais foi mostrada pelo fotógrafo Baraúna a Marco Petit em seu encontro de 1997. Com a manchete em letras garrafais o jornal Diário Carioca estampa: “Marinha autentica as fotos”. [2][70] Sem conhecer os fatos históricos, Petit limita-se a repetir até hoje aquilo que o fotógrafo lhe mostrou e lhe contou naquele dia, atropelando as conclusões oficiais da própria Armada.
No que tange às fotografias, a nota limita-se a informar que o fotógrafo teria batido as imagens a bordo do navio, mas que os registros fotográficos não são “prova bastante” para emitir uma conclusão sobre aquilo que as pessoas haviam dito ter observado no céu. Sobre a autenticidade ou não delas, nada foi declarado naquela nota. [5]
Foi somente após o deputado Sérgio Magalhães ter recebido o inquérito produzido pelo Estado-Maior da Armada por meio do seu Requerimento de Informação da Câmara e ter retransmitido aos repórteres parte das informações coligidas nele — inclusive a conclusão obtida sobre o exame dos negativos — que a imprensa divulgou estas informações em 16 e 17 de abril de 1958.
Nós já reproduzimos em linhas anteriores esta conclusão do exame, quando a Armada sentenciou que a fotografia “perde sua qualidade convincente”, pois não era possível descartar a possibilidade de ter existido uma prévia montagem. [9][10][11]
Nesta data, com quase dois meses após o estouro inicial na mídia, o assunto do “disco voador” da Trindade já era matéria com prazo de validade vencido e uma parcela da imprensa não deu muita atenção ao resultado final das investigações.
É verdade que a Marinha sabia que o repórter fotográfico Baraúna era habituado em realizar truques fotográficos. A Armada foi informada disso por ninguém menos do que… o próprio Almiro Baraúna — mas posteriormente ao voltar da ilha e justamente na oportunidade em que foi convocado a depor nas dependências militares. Inclusive foi o próprio fotógrafo quem sugeriu ao oficial do Serviço Secreto qual o tipo de análise que deveria ser realizada nos seus negativos. [71]
Somente depois que a história do “disco voador” estourou amplamente na imprensa, a partir do dia 21 de fevereiro de 1958, é que a Marinha tomou conhecimento da ampla extensão de seus truques. Desta vez, não contada pelo protagonista, mas sim por seu amigo fotógrafo, o Joaquim Simões, e por uma parcela da imprensa que desenterrou as fotografias do truque da revista O Mundo Ilustrado de 1954, época em que Baraúna ainda era um desconhecido fotógrafo amador.
Neste ponto da história algumas pessoas podem indagar: se as fotos do “disco voador” eram realmente falsas, como um fotógrafo civil teria conseguido suportar a pressão dos militares ao ser submetido à investigação dentro das dependências da Marinha? O que algumas pessoas não sabem é que o ambiente militar não era nada inóspito para o repórter fotográfico.
Almiro era filho de João Baraúna, um militar que deixou o serviço militar com a patente de tenente do Exército, e quando mais jovem o próprio Almiro também serviu a Arma por quatro anos. Ao deixar o serviço militar e entrar na reserva, ele tinha alcançado a patente de sargento. Ou seja, ele tinha familiaridade ao lidar com oficiais superiores e estava habituado a este meio.
A revelação dos negativos a bordo do navio e a oportunidade de uma fotomontagem
Em contato com o fotógrafo Marcelo Ribeiro, eu lhe questionei sobre as análises dos negativos e se os técnicos da empresa Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul poderiam ter se enganado no exame que fizeram. Em uma das suas respostas expressou o seguinte:
“Eu não diria que ‘comeram mosca’, é porque você não detecta [a montagem]. Não é que eles não detectaram por incapacidade. Porque também tem isso, você vê o que você quer ver. Da mesma maneira que o pessoal lá [do navio] estava acreditando que tinha visto disco voador, eles [os técnicos] estavam acreditando que o Baraúna tinha fotografado. Então, quando eles estavam examinando esse negativo, a cabeça funciona desse jeito. Sua cabeça vai funcionar diferente. Não é que eles tivessem incapacidade ou má fé. É que pela estrutura de grão não ia detectar. A estrutura de grão era real.” [1]
Como esperado, Marco Antonio Petit não compreendeu o que foi dito, pois apenas conhece o que o próprio Baraúna lhe contou em 1997, de que suas fotos eram “autênticas”, e retalhou essa resposta em partes — apresentando-a separadamente em diferentes trechos de seu texto. Nós acabamos de ver que os técnicos da empresa Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul descartaram a possibilidade de uma montagem ter ocorrido posteriormente ao evento a bordo do navio, porém não conseguiram descartar a possibilidade de ter ocorrido uma prévia montagem.
Como eles conseguiram chegar a esta conclusão singular ao examinar fisicamente um negativo de fotografia não é descrita no relatório da Marinha. Na opinião de Ribeiro, um dos elementos que influenciou o julgamento ao examinar o filme era de que os técnicos desta empresa tinham levado em consideração que Baraúna havia realmente fotografado o “objeto aéreo” de bordo do navio.
Se este pensamento estiver correto, o que nos resta é especular o motivo específico que fizeram os técnicos descartarem prontamente uma posterior fotomontagem, porém concluírem ser impossível provar a existência ou não de uma burla prévia. Uma possibilidade é de que os técnicos tenham levado em seus julgamentos que os negativos foram revelados a bordo do navio Almirante Saldanha e, segundo informou o capitão de corveta Carlos Bacellar, ao ver pessoalmente o filme, ele disse ter notado a presença de algo que ele acreditava ser a imagem do “disco voador”.
De acordo com o relatório da missão de comando deste capitão na Ilha da Trindade, que pessoalmente resgatei na Marinha, intitulado “Relatório de fim de comissão. Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade. Período de 1º de novembro de 1957 a 16 de janeiro de 1958”, quando Baraúna acabara de sair da cabine improvisada de revelação, a bordo do navio, Bacellar descreve que assistiu “à sua decepção quando, bastante nervoso, supôs que não obtivera êxito”. [14]
Este é o ponto crucial dessa história: apesar do próprio experimentado laboratorista Almiro Baraúna, acostumado a manusear negativos, ter acabado de revelar o filme e supor genuinamente que não aparecia nada na película, Bacellar diz que tomou os negativos de suas mãos e “examinei-o melhor e, em três negativos e em posições diferentes, notei a presença de uma estranha mancha que mais tarde foi perfeitamente identificada.” [14]
Embora Baraúna tenha apresentado posteriormente ao mundo quatro fotografias de um disco voador, Bacellar disse ter identificado no navio uma “estranha mancha” em apenas três negativos. Então, como magicamente esta quarta foto do “disco voador” teria surgido posteriormente?
Neste ponto do enredo é inevitável questionarmos qual a possibilidade desta “estranha mancha” ter sido um resíduo químico no negativo, decorrente de uma revelação em local improvisado que havia acabado de ter sido realizada? Apesar de o fotógrafo ter dito que efetuou logo posteriormente um processo de lavagem dos negativos, quão eficiente teria sido este procedimento?
Somado a este cenário suspeito, de acordo com o que narrava o repórter fotográfico, quando bateu as fotografias do “disco voador” havia usado sua câmera Rolleiflex modelo E com lentes f2.8 com a configuração do diafragma em f/8 e o obturador em 1/125 segundos. [53]
Segundo ele contava, esta configuração havia sido setada para fotografar o içamento de uma lancha, mas ao mirar o céu e disparar as inesperadas fotos do “disco voador” acabou permitindo a entrada de luz em demasia, causando uma superexposição do filme. A consequência é que os negativos ficaram escuros e as condições de visibilidade ficaram prejudicadas. [3][12]
Segundo o fotógrafo contou em sua entrevista no ano 2000, para tentar conseguir enxergar o “disco voador” naqueles negativos, os militares colocaram uma lupa por cima deles e uma lanterna por baixo. Nestas condições de visualização, Baraúna disse que cada um interpretou algo diferente daquela minúscula “estranha mancha” vista pelo capitão: “É ele mesmo. Parece isso, parece aquilo”. “Cada um disse um troço”, confirma. [3]
Todavia, em seus depoimentos o comandante Carlos Bacellar não menciona o uso desses instrumentos (por falta de informações adicionais não há como confirmar esta versão do fotógrafo). Como não havia ampliador e nem papel fotográfico a bordo para produzir uma ampliação, os militares tiveram que se contentar com esta situação precária.
Os negativos não foram confiscados a bordo do navio para posterior reprodução sob vigília dos militares, falha reconhecida pelo capitão de corveta José Geraldo Brandão, o investigador que produziu o relatório final da Armada sobre os episódios de UFOs na Ilha da Trindade. [12] De posse deles, o fotógrafo os levou para sua casa — local em que dispunha de um aparelhado laboratório fotográfico.
Petit ainda tenta invalidar a possibilidade de os negativos terem sido montados na casa do fotógrafo ao disparar que não está sendo levado em consideração que Baraúna foi “[…] avisado pelos militares, ainda no navio, de que o filme que ele havia revelado a bordo, logo após a obtenção das fotos, seria retido nos dias seguintes para ser submetido a uma perícia”.
Como é de amplo conhecimento por aqueles que investigaram este episódio, ao voltar da Ilha da Trindade o navio Almirante Saldanha atracou primeiramente em Vitória, no Espírito Santo. Nesta oportunidade, Baraúna e seus quatro amigos do Clube de Caça Submarina de Icaraí desembarcaram antecipadamente e rumaram de ônibus a Niterói, chegando à noite. O navio somente chegaria ao Rio de Janeiro dias após, em 24 de janeiro. [3][53]
Segundo o próprio fotógrafo contou em sua entrevista para a revista O Cruzeiro, o capitão de corveta Carlos Bacellar apareceu em sua casa somente dois dias após a chegada do navio. [53] Ou seja, há uma janela de oportunidade de algo em torno de cinco dias com os negativos em seu exclusivo poder, livre de qualquer supervisão militar, período suficiente que não inviabilizaria a possibilidade da execução de uma montagem no laboratório fotográfico de sua residência, caso desejasse fazê-lo. Na verdade, para alguém habilidoso como ele, uma montagem poderia ser finalizada em poucas horas.
Mesmo se considerarmos que algo surgiu nos céus da ilha e verdadeiramente foi registrado em fotos naquela oportunidade, numa avaliação técnica da peça fotográfica, considerando as circunstâncias envolvidas e seguindo a singular linha de julgamento da empresa Cruzeiro do Sul (que dividiu a integridade dos negativos em dois momentos distintos), não podemos também descartar prontamente a possibilidade de uma posterior montagem porque ainda assim não há garantia de que as fotografias do “disco voador” apresentadas ao mundo pelo repórter fotográfico sejam necessariamente aquelas que ele dizia ter registrado a bordo do navio.
Se os negativos permaneceram posteriormente sob seu inteiro domínio, a abordagem utilizada pela perícia técnica desta empresa não deveria excluir a possibilidade de que, por exemplo, a superexposição possa ter prejudicado as fotografias e ao chegar em casa o fotógrafo tenha notado que elas nada pareciam com uma “nave alienígena”, resolvendo então utilizar fotos quaisquer que bateu na Ilha da Trindade e tenha montado em sua casa um material fotográfico de melhor qualidade para aparentar ser uma “nave alienígena” mais visível e real.
Certamente, se estes negativos estivessem disponíveis hoje para uma análise, um perito não iria condicionar sua conclusão de verificação da autenticidade na partição da história em dois momentos distintos, como fez esta empresa civil.
Petit ainda finaliza afiançando que “não existe estrutura de grão real ou irreal em película fotográfica”. É verdade, não estamos tratando aqui de fotografia digital. No entanto, o mínimo que se possa esperar de alguém que escreva este tipo de crítica é que tenha capacidade de discernir o contexto em que a frase foi dita, diante das outras perguntas, e a linguagem figurada que foi empregada.
Um exemplo semelhante deste tipo de emprego de linguagem é uma técnica utilizada em película fotográfica conhecida como “puxar o grão” (ou puxar o filme), o que não significa literalmente que os grãos estão sendo “puxados”.
A viabilidade em detectar truques fotográficos
Marco Petit ficou chocado por, segundo ele, Ribeiro ter dito que os negativos de Baraúna escapariam de uma detecção de montagem, mesmo se fosse realizada uma perícia neles hoje. No contexto de sua fala, na verdade Ribeiro dizia que os negativos escapariam da detecção do mesmo tipo de exame que havia sido realizado na empresa Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul, a de estrutura de grãos, mesmo sendo periciadas pela tecnologia atual.
Conforme eu havia publicado no meu artigo “Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados”, de maio de 2011, alguns fotógrafos poderão não concordar com esta avaliação. Mas há outros peritos que concordam que um truque fotográfico bem-feito possa praticamente evadir-se de uma conclusão definitiva de trucagem.
Em 2004, o pesquisador Tim Printy reproduziu em seu trabalho sobre o caso Trindade uma citação de William G. Hyzer, um fotogrametrista e perito em análises fotográficas que opinava que uma trucagem bem-feita pode ser virtualmente impossível de ser atestada conclusivamente como resultado de uma fraude.
Hyzer é reconhecido por ser uma autoridade na área da fotografia forense, tendo publicado até aquela data cerca de 500 papers técnicos em suas áreas de atuação. O seu julgamento foi publicado na revista especializada Photomethods:
“Na minha opinião, é praticamente impossível provar uma fraude em uma imagem bem-feita. Se forem detectadas algumas anomalias, o melhor que qualquer analista fotográfico pode fazer é apontá-los como possíveis ou prováveis artefatos de uma fraude fotográfica”. [72][73]
Como já vimos aqui, os próprios técnicos da empresa Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul emitiram uma avaliação que segue linha semelhante. Eles concluíram que, caso as fotografias de Baraúna fossem uma trucagem executada em uma oportunidade anterior ao acontecimento a bordo do navio, era “impossível provar a existência de uma fotomontagem”. [12]
Os negativos foram analisados pela Kodak?
Almiro Baraúna também contava que seu negativo havia sido enviado pela Marinha ao exterior para ser analisado na sede da empresa Kodak, em Rochester, Nova Iorque. Dentre aqueles depoimentos concedidos por ele e conhecidos por nós hoje, a menção mais longeva dessa história surgiu aparentemente após mais de duas décadas do episódio ter ocorrido no navio, em entrevista concedida ao ufólogo Josef Allen Hynek, gravada em áudio, durante o II Congresso Internacional de Ufologia, ocorrido em abril de 1983, em Brasília.
Nesta ocasião, Almiro Baraúna declara indeciso que a Marinha “mandou os negativos também para o exterior, possivelmente na América do Norte, a fim de testarem no microscópio… talvez Rochester. Laboratório da Kodak”. [74] Tempos depois, em entrevista a Luiz Gasparetto no seu programa Terceira Visão no ano 1987, a sua indecisão já havia virado certeza, revelando que esta empresa fotográfica havia realmente analisado seus negativos. [64]
Na entrevista concedida a Marco Petit no ano de 1997, o fotógrafo também informou que quando o deputado Sérgio Magalhães recebeu o relatório (sic) confidencial da Marinha em suas mãos, anunciou à imprensa que a Kodak havia realizado vários testes em seus negativos. [2]
As pessoas vêm ecoando esta história da Kodak sem sequer ter passado os olhos sobre este alegado laudo. No relatório final produzido pela Armada Brasileira não há nenhuma menção de que esta empresa de fotografia se ocupou destes negativos, nem mesmo há qualquer registro na imprensa da época de que o deputado Magalhães revelou publicamente esta informação, como contou o fotógrafo — apesar de existir a sua revelação aos repórteres de que os testes foram efetuados pela empresa Cruzeiro do Sul e pela própria Armada. [9][10][11]
A existência de um laudo emitido pela Kodak acerca de um exame nos negativos do “disco voador” da Trindade continua sendo tão material quanto um fantasma, até que alguém apresente prova documental em contrário atestando sua existência.
Técnica para realizar uma montagem fotográfica
Há variadas técnicas para se realizar truques em fotografias. Antes da chegada da era digital, a era analógica fervilhava com várias trucagens fotográficas que visavam montar uma composição de elementos que originalmente estão separados em uma fotografia. A dupla exposição era apenas uma delas.
A clássica técnica da dupla exposição é aquela que é executada dentro da própria máquina fotográfica. Para realizá-la é utilizado um único negativo, que é exposto duas vezes à luz. Se o desejo do fotógrafo for, por exemplo, colocar um “disco voador” sobrevoando uma paisagem qualquer, ao pressionar o disparador o negativo é exposto uma primeira vez à luz, registrando a paisagem.
Em seguida é retrocedido o filme para o mesmo frame e realizada uma segunda exposição. Desta vez é fotografado o modelo de um “disco voador”. O resultado final é uma única chapa do negativo duplamente exposta, unindo os dois elementos que originalmente estavam separados. A composição final da fotografia é um disco voador sobrevoando uma paisagem. Essa técnica foi também muito utilizada no passado para criar fotos de fantasmas.
Segundo Marcelo Ribeiro contou, o fotógrafo Almiro Baraúna teria utilizado dois negativos ao proceder a montagem fotográfica por dupla exposição. “São dois negativos que ele trabalhou”, contou a mim no meu segundo contato, ainda em janeiro de 2011. [1]
Um dos negativos era a paisagem que ele teria fotografado na Ilha da Trindade, de bordo do navio Almirante Saldanha, e o outro negativo era uma foto de um modelo de disco voador de pequenas dimensões, fotografado no seu laboratório fotográfico, em sua casa, após ter retornado da viagem da ilha.
De posse desses dois negativos ele os teria unido em uma única composição. “Ele fez a foto do disco contra o céu, à noite, na casa dele, em Niterói. Depois, ele imprimiu junto com o céu lá da ilha. Ele fez uma foto da ficha, que é o disco, e juntou com a foto da ilha. Ele juntou”, disse. [1]
Os passos que irei descrever a seguir não foram mencionados a mim por Ribeiro, pois ele disse desconhecer exatamente o passo a passo de como o processo teria sido feito por Baraúna. Uma possível técnica que o fotógrafo poderia utilizar para realizar uma montagem fotográfica com estes dois negativos é realizada fora da máquina, em Quarto Escuro, e inicialmente os dois negativos já deverão estar revelados.
A técnica faz uma dupla exposição no papel fotográfico, ao invés de uma dupla exposição no negativo. Também conhecida como dupla impressão, ela proporciona maior controle do resultado desejado do que aquela realizada dentro da máquina, podendo ser feitas marcações precisas para fusão dos elementos que serão expostos e comporão a fotografia final.
O primeiro negativo, que mostra a paisagem da Ilha da Trindade, é colocado no ampliador para realizar uma exposição em um papel fotossensível, registrando a imagem da ilha. Depois de exposto, é retirado este negativo e colocado o segundo negativo no ampliador. É realizada uma segunda exposição no mesmo papel sensível à luz, inserindo desta vez a imagem do “disco voador” no céu de Trindade.
Agora que o papel fotográfico apresenta a dupla exposição dos elementos combinados de dois negativos diferentes, o próximo passo é revelá-lo. Em seguida essa ampliação final deverá ser fotografada para que seja criado um novo negativo, que é o negativo final da montagem.
Depois de revelá-lo, é este novo negativo que o fotógrafo disponibilizaria à Marinha para que fosse realizada uma análise. Os outros dois negativos iniciais, que mostravam os elementos originalmente separados, obviamente jamais seriam apresentados.
Ribeiro havia dito que “o negativo que ele [Almiro Baraúna] mandou [pra Marinha] é o negativo da montagem. Então, o grão do disco voador com o grão da ilha são iguais, é o mesmo grão, porque está no mesmo negativo. Como ele trabalhava tão bem, na imagem que ele reproduziu pra mandar o negativo você não percebe a montagem lá onde ele estava fotografando.” [1]
Na fusão fotográfica o laboratorista pode impedir que uma mesma região do papel seja exposta duas vezes, utilizando uma máscara para bloquear a região específica do disco durante a primeira exposição e para bloquear a região específica da paisagem da ilha na segunda exposição, fazendo a fusão final de elementos sem que uma mesma região tenha sido sobreposta pelas duas exposições.
Dependendo de quão bem-feita for este tipo de montagem, uma análise baseada exclusivamente na estrutura de grãos deste novo negativo pode ser difícil a um perito detectar uma falsificação. Porém, o problema decorrente de refotografar uma impressão fotográfica é acarretar alguma perda de detalhes da fotografia quando comparada ao negativo original.
No entanto, há algo que pode ter contribuído para tornar o julgamento da autenticidade dos negativos mais dificultoso, pois nós sabemos por intermédio do próprio fotógrafo Baraúna que ao voltar da ilha e entrar no laboratório fotográfico de sua residência contou ter notado mais uma vez que a fotografia “estava um pouco carregada”, devido a superexposição sofrida. Ele disse ter feito uma primeira ampliação e ficou frustrado porque “não dava detalhe”. “Fiz tudo”, diz, para tentar sanar o problema, sem obter sucesso. [2]
Negativos superexpostos ficam mais densos e se sofrerem bastante superexposição os detalhes serão perdidos nas áreas de highlight (realce da luz) da fotografia. Na imagem abaixo podemos ver um negativo exposto idealmente (centro) e o mesmo negativo subexposto (à esquerda) e superexposto (à direita). No último negativo da direita podemos ver uma superexposição mais acentuada em quatro stops.
Ao que parece, a superexposição que ele disse ter sofrido em seus negativos foi realmente severa. Popularmente é dito nestes casos que a fotografia “estourou” nas áreas de realce da luz, perdendo seus detalhes. O relatório da Marinha reportou que o próprio Baraúna havia contado aos oficiais que ao fazer a primeira ampliação das fotografias notou que “o OVNI apareceu bem em apenas duas fotos, porque os outros negativos estavam muito escuros”. [12]
Então, antes de enviar os negativos à Marinha ele disse ter tomado a decisão de corrigir essa superexposição e executou no laboratório fotográfico de sua residência o rebaixamento dos negativos. [2][3][12] Este procedimento químico tem por objetivo reduzir a densidade do negativo por meio de algum agente oxidante, como o ferricianeto de potássio.
Esta é uma operação irreversível e há diferentes tipos de rebaixamento. O fotógrafo informou que tratou homogeneamente todos os seus quatro negativos. [2] Um dos produtos comerciais vendidos para realizar este tipo de rebaixamento é o redutor de Farmer, porém este procedimento nunca foi escondido por ele, tendo descrito abertamente aos militares na oportunidade em que concedeu depoimento no Estado-Maior da Armada. [12][75]
No entanto, se a superexposição de um negativo for severa, a perda de detalhes nas áreas de highlight da fotografia não são recuperadas com essa operação de rebaixamento; elas estarão perdidas para sempre. [76] Segundo o fotógrafo Baraúna contou, o rebaixamento para a correção da superexposição foi bem-sucedida. [2][12]
O que se questiona hoje é se esse procedimento químico que os negativos sofreram poderia ter contribuído para camuflar um eventual processo de trucagem e ter dificultado sua identificação. Deve-se destacar neste ponto que no relatório da Marinha não há menção ao uso de um densitômetro na análise dos negativos pela empresa Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul e nem pela Armada.
Há muito mais a ser dito sobre as fotografias, mas por hora não estenderemos este tópico tratado aqui, deixando uma abordagem mais extensa para um futuro trabalho.
Conclusão de Claudeir Covo sobre a análise de grãos nos negativos
O ufólogo Claudeir Covo também escreveu um artigo sobre o caso Trindade da mesma edição da revista UFO de agosto de 2011. [77] Tristemente, Covo faleceu em maio de 2012, aos 61 anos, uma grande perda para a pesquisa séria dos fenômenos aéreos não identificados.
Em 2002 eu estava analisando a alegação sobre a possível inversão do “disco voador” da Trindade entre a primeira e a segunda fotografia. Através de contatos, eu questionei Covo para conhecer sua opinião sobre essa questão. Sempre solicito, ele me respondeu em 25 de agosto de 2002 contando sua análise preliminar [extrato]:
“Alexandre, eu escaneei as duas fotos com alta resolução, joguei no Word no mesmo tamanho e imprimi em transparência. Sobrepondo, realmente, as duas fotos são bem parecidas, mas existem pequenas diferenças”.
Na sua análise preliminar, ele não sustentou a hipótese da inversão. Covo tinha um conhecimento verdadeiro e prático de fotografia. Não irei comentar seu artigo aqui. Na verdade, ele é uma republicação de um antigo artigo que ele já havia escrito há quase uma década atrás e que estava hospedado no seu site do INFA.
Entretanto, há alguns parágrafos finais inéditos de sua avaliação das fotografias, e alguns deles serão reproduzidos aqui. No seu artigo, Claudeir Covo, que foi um dos maiores peritos fotográficos de fotos ufológicas do perímetro terrestre, é frontalmente oposto às conclusões de Marco Antonio Petit.
Aliás, as “habilidades” em análises fotográficas deste último já são bem conhecidas, fazendo-o ir a um programa de televisão mostrar sua incrível análise de uma fotografia que revelaria ao mundo sua descoberta de um achado arqueológico extraordinário de gigantescas ruínas de uma antiga civilização no planeta Marte… E as tais “ruínas” são apenas banais artefatos digitais! Daí já dá pra ter uma noção do seu nível de conhecimento em fotografia.
Covo tratou da clássica dupla exposição feita na máquina e concluiu que é “tecnicamente viável” uma montagem fotográfica de um pequeno modelo contra um fundo escuro, e “da forma como foram realizados esses truques a análise de granulação dos negativos não permite detectar indícios de fraude”. Alguns analistas fotográficos concordarão com sua avaliação, outros não. Em detalhes ele descreve:
“Ribeiro afirmou que seu tio usou, para realizar a fotomontagem, duas fichas da chamada Frota Carioca suspensas por um fio preto e fotografadas contra um céu completamente. Tecnicamente, a manobra é viável.
Nas duas décadas em que trabalhei em laboratórios fotométricos, nos quais todas as paredes eram enormes e pretas, realizei algumas brincadeiras com objetos suspensos por finos fios também pretos. Da forma como foram realizados esses truques, a análise de granulação dos negativos não permite detectar indícios de fraude.
Assim, a se julgar como procedente a tese de Ribeiro, de que Baraúna usou a técnica, ela com certeza teria que ter sido preparada antes — o fotógrafo teria que memorizar muito bem a posição em que o modelo entraria nas fotos, ainda na Ilha de Trindade, para colocá-lo por dupla exposição no ponto preciso em que entram nas quatro imagens. […]”
“[Os indícios de truque] me fizeram rever meus conceitos sobre o evento, até que apareçam novas informações a respeito”, finaliza Claudeir Covo, reavaliando sua posição sobre o episódio. [77]
Ufólogo americano não autenticou as fotografias de Almiro Baraúna
Há uma fotografia do ufólogo americano Bruce Maccabee no artigo de Claudeir Covo — que não foi inserida por ele — e não encontra absolutamente nenhuma referência ou ligação com o conteúdo do seu artigo. A legenda da fotografia — que não foi escrita por Covo — apresenta o seguinte escrito em tom de alerta:
“Importante confirmação: Bruce Maccabee, um dos mais reputados analistas de fotos de UFOs do mundo, autenticou as imagens de Baraúna”. [77]
A informação falsa falhou por uma simples causa: esqueceram de avisar ao próprio Maccabee que ele havia “autenticado” (sic) as fotografias da Trindade. A legenda parece ter sido usada para deslumbrar desavisados leitores en passant, apresentando a imagem de um analista fotográfico que teria “autenticado” esses positivos. Na verdade, o próprio Maccabee confirma que, até então, nem havia analisado essas fotografias.
Talvez, quem tenha inserido a legenda e a fotografia do ufólogo americano quisesse fazer um contraponto ao analista fotográfico brasileiro — mesmo usando uma informação reconhecidamente falsa —, pois o analista Claudeir Covo estava revendo seus conceitos sobre o episódio e considerava válida a viabilidade técnica da montagem, ao contrário do analista fotográfico americano, que, segundo a inverídica declaração que lhe foi imputada, teria “autenticado” as fotos.
A hipótese da inconsistência das nuvens nas fotografias
Disse Marco Antonio Petit que “em seu artigo no site da Revista UFO, o ufólogo comenta “novidades” sobre o Caso Ilha de Trindade que supostamente apoiariam a tese de fraude — entre elas está a diferença no padrão das nuvens presentes na primeira e na última foto da sequência obtida por Baraúna, que indicaria terem sido feitas em momentos diferentes”.
Ao contrário do que afirma, a análise do deslocamento das nuvens nas quatro fotografias de Almiro Baraúna não é nenhuma “novidade”. A hipótese de inconsistência meteorológica já foi cogitada há anos, primeiramente aventada pelo pesquisador francês Eric Maillot.
Uma análise fotográfica preliminar da hipótese foi publicada em fevereiro de 2004 por Martin Shough, um dos pesquisadores do caso Trindade. [78] Para Petit é uma alegação recente, uma “novidade”, e não é surpresa para mim seu desconhecimento sobre as investigações que estão revisando este episódio.
Como ele não analisou estas fotografias e desconhece as análises revisionistas que foram efetuadas nelas, ele sequer sabe do que está falando. No entanto, preferiu se ater a um comentário do fotógrafo Marcelo Ribeiro e chamar de “absurdo” o que acabou de conhecer. Ao ser questionado sobre a diferença de padrão das nuvens da primeira e da última foto, Ribeiro declarou:
“Talvez por esses positivos aí o pessoal até detecte alguma coisa. Porque lá eles fizeram uma análise de estrutura de grão. Essa análise aí que o pessoal está fazendo nos positivos é diferente, é outra análise: o cara está comparando posição de nuvem. Mas, também não vai provar coisa nenhuma não. Vai só dizer que parece isso ou parece aquilo, que acha que não é verdadeiro por isso ou por aquilo. Mas, realmente não é”. [1]
A pergunta foi lançada por mim para pescar se ele tinha alguma informação específica sobre este tópico. Ele não tinha, e apesar dele não ter visto as análises fotográficas que avaliaram este problema, emitiu uma opinião sobre essa questão. No entanto, a análise de consistência meteorológica nas fotografias é integralmente independente do que ele opine sobre ela. Este é um exame de ordem física e perfeitamente apropriado de ser realizado nos positivos — como já haviam sendo realizados.
Ainda em 1958, ao ser entrevistado pelos jornais, Almiro Baraúna contou aos repórteres que ao voltar da Ilha da Trindade foi convocado duas vezes para prestar depoimento sobre as suas fotografias no Estado-Maior da Armada, no Rio de Janeiro. [71]
Ele disse que os militares fizeram uma reconstituição do momento em que ele bateu as suas seis fotos quando estava no convés do navio. Baraúna menciona que os militares lhe solicitaram que executasse todos os passos que havia feito ao fotografar e cronometraram o tempo que ele utilizou entre o disparo da primeira até a última fotografia. Segundo o fotógrafo, os militares calcularam o intervalo de tempo das suas seis fotos em 14 segundos. [57] [71]
Apesar de sabermos que esse cálculo é uma estimativa de tempo, o que se questiona hoje é se alguns dos elementos que são vistos nas suas quatro fotos são compatíveis com um intervalo de cerca de 14 segundos entre a sequência do disparo da primeira até a última foto (a quarta e a quinta fotografias não foram divulgadas publicamente).
Um desses elementos em análise são as nuvens. Esta inspeção é mais facilitada de ser visualizada no positivo do que propriamente diretamente em um negativo com dimensões de 6×6 cm, como eram os utilizados por sua câmera Rolleiflex (o tamanho efetivo da área fotografada no negativo é de 5.6 x 5.6 cm).
Nós devemos lembrar que estas fotografias datam de 1958, época em que não existiam os computadores pessoais e nem os softwares de edição e tratamento de imagens. Quem quisesse analisar este problema naquela data deveria utilizar recursos da fotografia em película para trabalhar com o contraste das fotos.
Como aparentemente ninguém analisou esta básica questão fotográfica em quase meio século, o que se discute atualmente é se existe consistência meteorológica das quatro fotos entre si e se elas são compatíveis com o tempo de execução mencionado pelo fotógrafo.
É justamente comparando a primeira fotografia com a última — que mostram uma mesma região mais ampla do céu —, que é possível confrontar o padrão das nuvens e estudar se sua dinâmica seria compatível com um tempo exíguo de cerca de 14 segundos.
Considerando as condições climáticas daquela região e ciente de que este julgamento não é da ordem de uma precisão matemática, o que se espera, em tese, é que a configuração das nuvens que aparecem na mesma região do céu das duas fotos seja da mesma classificação e não sejam tão drasticamente dispares em seu deslocamento.
Pelo menos, as análises preliminares de Martin Shough têm assinalado que há dúvida razoável em apontar que a tese da inconsistência meteorológica entre as duas fotos e com o relato de Almiro Baraúna seja verdadeira. [78] No entanto, há muito mais a ser dito sobre essa questão. O que eu escrevi aqui é apenas um briefing sobre este problema.
Por que os casos da ufologia não são incontestáveis e devem ser questionados?
O molde que deu origem à UFOlogia é bem diferente do formato em que ela é exercida hoje. O que predomina atualmente é a sua transmutação para uma espécie de ETlogia, sendo que aquela UFOlogia primordial é tão rara hoje em dia quanto os brontossauros.
Para uma corrente de defensores deste campo de pesquisa, não há mais o que se discutir: há provas inequívocas e inquestionáveis de que máquinas voadoras oriundas de outras civilizações do cosmos estão sobrevoando nossos céus, e ponto final. Para esses proponentes, os clássicos casos da ufologia são algo como Monalisas irretocáveis.
De acordo com estes defensores, os clássicos casos da ufologia mundial já estão absolutamente comprovados como episódios de natureza alienígena, e não é admissível questioná-los, a não ser para adicionar elementos que reforcem o que acreditam ser sua natureza extraplanetária. Para eles, quem não concordar com esse dogma faz “parte da imensa massa de céticos que querem negar a presença inquestionável dos nossos irmãos extraterrestres e destruir a ufologia”.
Alguns defensores mais ardorosos vão além e enxergam essas histórias de visita de naves interplanetárias como uma espécie de santuário de reverência. Em um trabalho de Sísifo, alguns fervorosos evangelistas desta corrente de pensamento sugerem tratamento psiquiátrico a todos aqueles que insistem em questionar se naves espaciais procedentes de outros planetas estão realmente sobrevoando nosso planeta.
Na verdade, ninguém precisa de psiquiatra e nem de ingerir antidepressivos para acreditar que alegadas naves espaciais oriundas de outros mundos estão sobrevoando nossos céus. O que se julga necessário são evidências científicas concretas que alicercem essas alegações; e elas simplesmente não existem!
A alegação de que veículos espaciais de outros orbes estão sobrevoando nossos céus não foi comprovada pela ciência, estando sua tese aberta ao questionamento. O objetivo da ciência não é divulgar a “inegável presença extraterrestre no planeta Terra”, pois tal alegado corolário defendido por alguns ufólogos não é e nem nunca foi verdadeiro.
O que a ciência deseja descobrir é se esses fenômenos que as pessoas dizem ver nos céus são realmente naves espaciais oriundas de outras civilizações do cosmos ou se essas histórias podem ser esclarecidas como fenômenos vulgares — quiçá fenômenos terrestres ainda não conhecidos; ou a maior parcela se abrevie apenas na mais deslavada fraude.
Não ter uma solução para um resíduo de fundo restante de uns 3% de todas estas histórias — que ainda resistem a uma explicação racional — não implica concluir prontamente que já esteja comprovado que elas sejam de natureza extraplanetária.
Assim como os outros episódios da ufologia, o caso Ilha da Trindade é uma história de domínio público e sujeita à análise da ciência. Este é um evento de um fenômeno aéreo alegadamente desconhecido e, como tal, está nativamente aberto ao questionamento. Ora, se esse é um evento de um fenômeno aéreo não identificado, o que se espera é a busca em tentar identificá-lo.
Uma fotografia não permite comprovar que um corpo fotografado seja uma nave que veio de outro planeta. Além disso, por princípio, fotos podem ser forjadas — e há inúmeras técnicas para realizá-las. Se nem a empresa civil que analisou os negativos do “disco voador”, a Serviços Aerofotogramétricos da Cruzeiro do Sul, afastou a possibilidade de fraude, ninguém pode impedir que essas imagens continuem sendo reavaliadas até hoje.
Aquelas pessoas que vivem enfurnadas 24 horas no limitado microcosmo da ufologia pensam que histórias como a de Trindade já estão absolutamente comprovadas como episódios de natureza alienígena, não sendo mais permitido questioná-las. E não estão, como nenhuma história está.
Imagine se não pudéssemos analisar criticamente narrativas tão duvidosas como as de Roswell e Varginha? Estas histórias não são evidência concreta de que estamos sendo visitados por seres do espaço, por mais que não reconheçam aquelas pessoas que precisem vender histórias de visitantes extraterrestres para sobreviver.
O avanço da ciência e da tecnologia tem permitido reavaliar episódios ocorridos no passado em variadas áreas do conhecimento humano, tais como a criminal, a dos esportes e das artes. Uma das razões de casos antigos de registros fotográficos ufológicos serem revisados hoje em dia é devido ao atual estado tecnológico da nossa sociedade.
Nós podemos utilizar a tecnologia atual para periciar fotografias antigas — época em que tal tecnologia não estava disponível —, assim como é possível utilizar a tecnologia para periciar quadros atribuídos a Van Gogh e descobrir se vieram das mãos do pintor pós-impressionista ou se são uma pintura bem-feita criada pelas mãos de uma farsante.
Existem hoje muito mais indivíduos que dispõem de uma câmera fotográfica do que na década de 50 e equipamentos mais avançados do que naquela época. Apesar do mundo tecnológico atual, com centenas de milhões de smartphones espalhados pelo mundo e acessíveis rapidamente pelo bolso de uma calça, quem está fotografando “discos voadores” com a mesma qualidade das fotos de Almiro Baraúna?
Qual a credibilidade dessas fotos que estão surgindo hoje e que, porventura, tenham qualidade nítida? A nossa resposta para essas indagações é de que todas essas fotografias são muito questionáveis. Em síntese, não há absolutamente nem uma foto e nem um vídeo ufológicos acima da crítica — assim como também não há fotos inequívocas de espíritos, de Pés-Grande e de monstros do Lago Ness.
Algumas fotografias de discos voadores — que são consideradas por alguns pesquisadores como umas melhores provas de que estamos sendo visitados por alienígenas —, tais como a do Lago Cote (1971), a da Ilha de Vancouver (1981) e a de Trent (1950), têm problemas inerentes e têm sido colocadas em xeque por dedicadas análises. Elas são apenas fotografias que classificamos como, no mínimo, duvidosas.
É imperioso destacar que uma das melhores fotos de discos voadores de todos os tempos foi apresentada “coincidentemente” por um exímio perito em fotomontagens, um mago do Quarto Escuro. Ele era “capaz de fazer milagres dentro de um laboratório”, conforme alertou seu amigo fotógrafo Joaquim Simões, na época. [33]
Maior “coincidência” ainda é sabermos que o “disco voador” da Trindade não foi a primeira foto de discos voadores que ele disse ter obtido. Em 03 de maio de 1960, em depoimento ao pesquisador Walter Karl Buhler numa reunião da Sociedade Brasileira de Estudos Sobre Discos Voadores (SBDEV), Baraúna declarou que já havia batido em oportunidade anterior duas fotografias de um disco voador:
“Um dia, quando regressava a casa, em Niterói, Icaraí, vi um objeto sobre o Pão de Açúcar, voando em direção à Urca e retornado ao Pão de Açúcar. Bati duas fotografias. Revelei-as e ampliei-as. Apareceu então, uma mancha luminosa clara, com um semicírculo escuro no centro.” [29][30]
Lamentavelmente o fotógrafo não está vivo para que pudéssemos confrontá-lo com questões incisivas, assim como foi feita com a lendária fraude das fotografias das fadas de Cottingley, oportunidade em que as duas garotas que apresentaram as imagens de fadas ao mundo negaram por toda sua vida a farsa e somente com a pressão que se avolumava sobre elas vieram confessar a fraude depois de idosas.
Almiro Baraúna é muito convincente, envolvente e carismático. A história ajuda, pois tem um enredo contagiante que prega a atenção e a imaginação das pessoas. Apesar de suas fotos se tornaram icônicas com o passar dos tempos, elas nunca estiveram acima da crítica. Se estivéssemos analisando aqui um evento de ordem prosaica, como uma eventual fraude do imposto de renda, nós poderíamos abrir concessões à memória de Almiro Baraúna.
No entanto, nós não estamos tratando de uma simples fotografia de um avião no céu. O elemento que temos em mãos é um evento que rompe o ordinário e adentra no extraordinário: a imagem de uma alegada nave espacial oriunda de outro planeta.
Eventos de ordem extraordinária são nativamente abertos ao escrutínio público e passíveis de uma análise draconiana, pois tais fenômenos ainda não foram comprovados pela ciência. É assim que o jogo funciona e é nesta linha que continuará funcionando, pois é assim que a ciência trabalha.
Imagine só, se uma legítima ciência como a astronomia, que procura vida fora do planeta Terra muito antes da ufologia pensar em existir, vai se ajoelhar perante essa pseudociência e aceitar acriticamente o que ufólogos apresentam por aí como “prova” de visitas de naves alienígenas.
A ausência de provas e a baixa credibilidade da maioria dessas histórias se entrelaçam na óbvia consequência de que não há rigorosamente nenhum caso ufológico isento de sofrer questionamentos e nem nenhum clássico da ufologia é intocável.
Nem teorias científicas como a do Big Bang ou a existência e mecanismo dos buracos negros estão imunizadas de se submeterem ao incessante questionamento e revisão. Não será a ufologia, uma pseudociência chafurdada em fraudes — que não teve nem uma sequer de suas teses comprovadas e que muitas vezes está apenas escorada no espaldar da crença acrítica —, que estará imune e intocável de ser questionada e revisada sistematicamente — quantas vezes forem necessárias e por quem assim o desejar.
Depoimentos de amigos e familiares do repórter fotográfico
Depois ter lido calmamente todas as perguntas e respostas da transcrição do diálogo de mais de 50 perguntas com o fotógrafo Marcelo Ribeiro, apresentadas em um texto plano, oportunisticamente Marco Antonio Petit aparece na minha frente pra dizer que as respostas da testemunha não foram rebatidas com questionamentos.
Agora que ele conheceu toda a dinâmica dos acontecimentos que a testemunha afirma ter ouvido por meio de uma confissão, identificando o seu sistema de crenças e a sua reação amistosa ao ser inquirida sobre os fatos, quando a floresta já está desmatada e o chão asfaltado e bem plano, incoerentemente ele aparece fazendo ajuizamentos em respostas da testemunha que somente as conheceu porque eu justamente o questionei.
O mais contraditório de suas críticas é que quanto mais extensas foram elas para tentar rechaçar o que foi dito, mais extensas demonstraram terem sido o leque de meus questionamentos.
De fato, o guarda-chuva de temas aberto por mim abriu um amplo leque de frentes, ao questioná-lo qual teria sido as motivações do truque; a dinâmica dos acontecimentos a bordo do navio; o modus operandi ao realizar a montagem das fotografias; o motivo da não confissão em público; a não detecção da montagem na análise dos negativos; em qual momento foi realizada a montagem fotográfica, entre outros. Ele alega que ouviu todas estas informações de seu tio Almiro Baraúna.
Particularmente, eu nunca troquei um diálogo ou e-mail sequer com Marco Petit para discutir sobre o caso Trindade ou mesmo sobre qualquer outro episódio da ufologia. Não o conheço pessoalmente e nem muito menos me ocupei de algum trabalho seu na ufologia, além dos que cito neste artigo.
Os e-mails e material que ele recebeu de mim, acerca do meu artigo sobre este episódio, foi por que as pessoas que enviaram e-mails a mim o colocaram em cópia e, quando respondi na função para todos, ele os acabou recebendo indiretamente.
Causa-me espécie ele aparecer agora falando em questionamentos, já que quando recebeu meu artigo disse em e-mail que eu já havia lançado todas as perguntas necessárias, não tendo mais nenhuma a acrescentar, com exceção de uma: se a testemunha detinha alguma prova do que havia declarado.
Quando contatei em novembro de 2003 a segunda mulher de Almiro Baraúna, a senhora Suraiha Elias, atualmente falecida, ela estava relutante em falar sobre o episódio e negou diversas vezes em ceder os negativos do “disco voador” para um estudo científico, que confirmou estar em sua posse.
Neste mesmo ano, ao contatar com Amilar Vieira Filho, este demonstrou ser uma pessoa extremamente resistente em contar sobre o episódio vivenciado na Ilha da Trindade. Ainda em 1958, ele somente concedeu entrevista sobre o ocorrido porque Almiro Baraúna levou um repórter na sua casa e o convenceu a falar.
São reações assim que nos indicavam que estes contatos iniciais com pessoas envolvidas direta ou indiretamente com o caso deveriam ser realizados de forma amistosa, e não como uma inquisição ou rebate implacável em cada sentença que a testemunha declare. Mas Marco Petit sequer sabe das dificuldades encontradas quando algumas pessoas não desejam falar acerca deste episódio.
Pra conseguir arranjar alguma alma viva que lhe apoiasse em sua crítica, Petit ainda cita o nome de dois colaboradores da revista UFO. Um deles, segundo Petit, limitou-se a protestar com o que havia lido; já o outro foi promovido a um indivíduo que tinha um “conhecimento mais profundo” da história do caso Ilha da Trindade.
Apesar de um deles não ter escrito uma vírgula sequer sobre este episódio, talvez eu devesse revelar aqui que a outra pessoa mencionada sequer sabia que a Marinha havia produzido um relatório final sobre o caso e, ao ler meu artigo onde eu descrevia trechos deste documento oficial, desconhecia do que eu estava tratando.
Estranho é constatar que, se essas pessoas conheciam tão profundamente a história do caso Trindade, por que não corrigiram os erros expostos ao longo do artigo de Marco Petit?
Depois do programa Fantástico da Rede Globo ter exibido em 15 de agosto de 2010 uma entrevista com a publicitária Emília Bittencourt, que declarou ter ouvido a confissão de truque fotográfico da boca de seu amigo Almiro Baraúna, eu imaginei na época que, se sua declaração era verdadeira, outras pessoas próximas ao fotógrafo também poderiam ter ouvido a confissão. [79][80]
Naquela data foi aventada a hipótese por outros pesquisadores de que o fotógrafo poderia ter feito uma brincadeira com esta senhora e ela estaria contando agora a história que ouviu por pensar ter escutado uma confissão de truque. A partir daí eu saí em busca de possíveis indivíduos que pudessem corroborar ou negar o que foi dito, e localizei em 27 de janeiro de 2011 um sobrinho de Almiro Baraúna de nome Marcelo Ribeiro, que também confirmou ter ouvido a confissão por parte de seu tio.
Após mais de dez anos da morte do fotógrafo, ocorrida 29 de julho de 2000, Ribeiro não veio a público contar o segredo que disse ter ouvido; nem para negar ou confirmar a matéria veiculada em rede nacional no programa Fantástico. Talvez nunca viesse a público, caso não tivesse sido localizado.
Enquanto eu estava realizando perguntas sinceras à testemunha Ribeiro com o objetivo de destrinchar o novelo da história narrada por ele, a cabeça de Marco Antonio Petit estava enxergando um complô megalomaníaco de “pessoas que estão se aproximando” (sic) para destruir o caso Trindade e a imagem do seu protagonista. Sendo ele um indivíduo extremamente crédulo por discos voadores, a sua cabeça trava, e o escape da dissonância cognitiva é culpar o carteiro por ter entregado a notícia.
Essa sua imaginária visão de complô entre pesquisadores fica clara quando ele quer encontrar contradição em estudos independentes realizados por pesquisadores independentes em épocas diferentes e sem ligação, que não necessariamente têm as mesmas conclusões acerca deste episódio.
Assim, ele cita um trabalho do passado de outro investigador, que comparou o “disco voador” mostrado na fotografia de Almiro Baraúna com uma fotografia de um avião do tipo Beechcraft Twin Bonanza, lançando a hipótese de que para produzir uma montagem fotográfica o fotógrafo teria utilizado como modelo do seu disco voador uma foto qualquer deste tipo de avião e sobreposto ao fundo da ilha — ao contrário da incorreta informação de Petit de que este estudo concluía que houve a presença física de um avião no céu de Trindade que teria sido confundido pelas testemunhas. [28]
Não é surpresa que esta seja a mesma pessoa que circula por aí, há anos, promovendo as mais grotescas barbaridades sobre o planeta Marte, indo a público acusar, por exemplo, renomados cientistas de arquitetar um conluio planetário pra esconder da humanidade estruturas artificiais erguidas por inteligências marcianas e gigantescos campos de vida vegetal em Marte.
As tais “estruturas” artificiais descobertas por ele são apenas inofensivas dunas de areia e os campos de vida vegetal marciano, que ele promove por aí até hoje, existem apenas em sua imaginação. [Clique aqui e aqui para ler sobre essas histórias].
É por esta e por outras razões que a avaliação deste episódio de Trindade não pode ficar refém de alguém como Marco Antonio Petit, que enxerga um lado obscuro em tudo o que vê e que interpreta tudo aquilo que não é compatível com o que acredita como um orquestrado movimento de pessoas que querem “destruir o caso Ilha da Trindade”.
Em agosto de 2010, horas depois do programa Fantástico ter também informado que uma sobrinha do fotógrafo, de nome Mara Baraúna, ter confirmado o truque à produção do programa, o pesquisador José Américo — que já havia em oportunidade anterior contatado por telefone esta senhora — transmitiu a informação repassada por ela de que não havia confirmado o truque à equipe do programa.
Esta informação foi amplamente divulgada pelos outros investigadores, inclusive por mim em artigo próprio naquele mesmo mês de agosto de 2010. [81] Exatos um ano depois, surge Marco Petit informando sobre esta negação por parte da sobrinha, agindo como se estivesse revelando a última novidade.
Em meu artigo que apresentou o relato de Ribeiro eu também informei novamente que “o programa Fantástico também transmitiu a informação de que uma sobrinha de Baraúna teria confirmado que as fotos eram trucadas. Horas depois da veiculação do programa, a sobrinha do fotógrafo, que hoje é curadora de seu acervo fotográfico, negou que tenha confirmado a fraude.” [1]
Para confrontar os depoimentos, eu contatei a senhora Bittencourt, e ela me confirmou que a única pessoa que conhecia da família dos Baraúna era a senhora Mara — além do próprio fotógrafo Almiro e as suas duas mulheres Adoléa Ribeiro Baraúna e Suraiha Elias. A primeira era casada com Almiro desde 1948 e tia de Marcelo Ribeiro, vindo a falecer em dezembro de 1991. Depois do seu falecimento, ele se uniu com a segunda senhora. Bittencourt me disse que conheceu “durante anos o Sr. Baraúna e realmente ouvi dele toda a verdade de como foi feita a foto fake”.
Ela me informou que esteve envolvida por 30 anos com a área da fotografia e confirmou ter ouvido a confissão do fotógrafo em um almoço na residência (de praia) do mesmo, em Saquarema, interior do Rio de Janeiro, no ano de 1992, oportunidade em que também estava presente à mesa a segunda mulher do fotógrafo, a senhora Suraiha Elias. Informou ainda que nesta ocasião foi cogitado gravar um vídeo da sua confissão para ser divulgado após a sua morte, mas tal gravação nunca foi concretizada.
Em maio de 2013 surgiu em cena um senhor de nome Fernando Talask, informando ser ex-marido da senhora Emília Bittencourt. Ele disse que conheceu Baraúna por anos, mencionando ter sido seu amigo e ouvindo dele a história da Trindade, porém afirmou que nunca lhe foi confessado ser as fotos um truque.
Eu contatei a senhora Bittencourt e lhe retransmiti as declarações do seu ex-marido. Segundo ela informa, na data em que ouviu o relato do fotógrafo não era casada com o senhor Talask e reafirmou ter ouvido a confissão de truque fotográfico naquela ocasião.
Conforme já tratei no início deste artigo, na investigação do episódio da Ilha da Trindade todas as testemunhas, direta ou indiretamente envolvidas, são apenas peças deste quebra-cabeça que devem ser analisadas em conjunto com todos os outros elementos coligidos acerca do episódio.
Se alguém tem subsídios suficientes e elementos que possam sumariamente descartar integralmente estes depoimentos, nós estamos prontos para conhecê-los — e se for o caso anulá-los do rol de dados deste caso. Por hora, nós identificamos e mencionamos aqui falhas de memória no depoimento de Ribeiro e sempre tivemos em mente de que seu depoimento possa conter elementos que não sejam corretos ou exatos, assim como o de Bittencourt.
De fato, apesar de existir pontos coincidentes ao comparar os dois depoimentos, tais como o momento e o local da realização da montagem e o sentimento de brincalhão do fotógrafo, há pontos divergentes, como o material que teria sido utilizado para fazer o modelo do disco voador e o modus operandi da trucagem. Segundo Ribeiro alegou, a explicação por existir essas divergentes histórias era porque o próprio Baraúna contava diferentes versões de sua narrativa para diferentes pessoas. [1]
Porém, o texto escrito por Petit nem de longe refutou alguma coisa, pois além de rigorosamente não apresentar nada do que já era amplamente conhecido — mas com erros —, limitou-se a avaliar superficialmente o caso com a literal transcrição daquilo que o fotógrafo havia lhe contado em 1997 — ignorando o que foi dito fora dela.
O que ele escreveu me pareceu ser mais motivado por alguém que ficou muito frustrado por ter tido seu caso preferido maculado, a alguém que tenha um legítimo interesse de pesquisa que não seja exclusivamente aquele que vise chancelar seu viés de confirmação de visitas de naves extraterrestres.
Ficou claro no seu texto que para ele é inadmissível em qualquer hipótese e em qualquer circunstância a possibilidade de serem as fotografias de Baraúna falsas, tachando por ato reflexo de “absurdo” e “barbaridade” a tudo aquilo que se levante de suspeito a respeito delas — avaliação radical não emitida nem por aqueles técnicos da empresa Serviços Aerofotogramétricos Cruzeiro do Sul que analisaram os negativos e pela conclusão da Marinha exposta em seu relatório final.
Na investigação deste episódio nós procuramos reunir o maior número de testemunhas, de documentos oficiais e de registros históricos da época, e cruzamos todas as fontes para tentar reconstruir a história o mais próximo possível daquilo que tenha ocorrido.
Além disso, é claro, é levada em consideração a importante análise das fotografias. Talvez nunca consigamos algum dia remontar a história em suas linhas finas, mas certamente estamos construindo um panorama global do episódio. Porém, será que pessoas que sobrevivem vendendo histórias de visitas de extraterrestres têm capacidade racional de compreender esta força-tarefa?
O abismo entre o dito e o não dito
Quem ler os comentários de Marco Antonio Petit acerca das declarações da testemunha Marcelo Ribeiro e comparar com o seu depoimento original vai notar uma diferença abissal entre o que Petit atribui a ele e o que, de fato, a testemunha declarou.
A articulação concretada em seu artigo é tão escancaradamente destoante e alterada do depoimento original da testemunha, quando tenta imputá-lo na condição de um indivíduo que está tentando “destruir a imagem de Baraúna” e acusando-o de charlatão, que me fez criar a tabela abaixo, onde elencamos de forma condensada vinte citações de Ribeiro acerca do que pensava da pessoa de Almiro Baraúna, expondo diametralmente o oposto do que Petit lhe arroga.
Ou seja, para conseguir refutar o depoimento de Ribeiro, Petit criou uma nova versão distorcida dessa testemunha e em seguida refutou esta versão criada por ele próprio. (Este é um tipo de falácia muito bem conhecido como falácia do espantalho.)
A reverência e respeito para com a figura de Almiro Baraúna já eram públicos em uma entrevista concedida por Ribeiro e publicada no site da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) em 24 de março de 2006, oportunidade em que comenta acerca de sua vida profissional e cita Almiro Baraúna como um indivíduo que lhe inspirou a adentrar no mundo da fotografia:
“Fotógrafo premiado no Brasil e em outros países, principalmente da Europa e da África, Marcelo Ribeiro é um profissional polivalente. Pela lente de sua máquina podem sair fotos jornalísticas, publicitárias, instantâneas ou posadas:
— Não sou um profissional especializado. Não tenho um só olhar para o que fotografo. Dependendo da ocasião, posso fazer foto para publicação num jornal ou numa revista, para o anúncio de um produto, em externa ou mesmo no estúdio. O primeiro reconhecimento do meu trabalho ocorreu no fim de 1967, quando recebi uma menção honrosa num concurso promovido pela revista Realidade. A foto foi feita em Salvador e foi considerada original porque retratava uma construção em estilo árabe em uma cidade que tem forte influência da cultura africana.
Em 1969, depois de ser preso e perseguido pela ditadura, Marcelo deixou o Brasil e foi para os Estados Unidos. De Nova York, em 1975, foi para Europa, onde passou quatro meses fotografando para a Pan American e aproveitou para fazer um curso de reprodução de obras de arte no Museu do Louvre, em Paris. Depois, na África, viveu muitas aventuras — e, do período, guarda outra premiação:
— Também através de concurso, ganhei outra menção honrosa, desta vez da Nikon, a primeira conferida a um brasileiro. O prêmio foi pela foto de uma velha com uma criança caminhando pelo deserto do Saara em 1973, quando passei algum tempo fotografando nos países da África Ocidental. Esta foto foi, certamente, a mais importante da minha vida. Foi também no Saara que acabei capotando num carro dirigido por um francês. Na Guiné Bissau, acabei preso. Mas não posso reclamar da vida.
Marcelo Ribeiro nasceu em São Paulo, mas vive desde os 7 anos em Niterói, berço de toda a sua família. O tio Almiro Baraúna, um dos grandes repórteres-fotográficos dos anos 60, foi seu mestre e maior inspirador:
— Foi ele quem despertou em mim o interesse pela fotografia, quando eu ainda tinha apenas 8 ou 9 anos de idade. Naquele tempo, a fotografia não era muito valorizada, mesmo assim eu logo me apaixonei por ela e entrei de cabeça. Aprendi muito com meu tio e, anos depois, fui ajudar o cineasta Nelson Pereira dos Santos a organizar cursos livres de Cinema e Fotografia na Universidade Federal Fluminense (UFF). Também trabalhei por algum tempo com Oscar Niemeyer e aprendi muito com ele, principalmente aquilo que, na falta de uma palavra adequada, eu chamaria de “percepção do possível”. Isso significa que, quando Niemeyer está fazendo algum desenho, alguma coisa diz a ele que aquilo é possível, ainda que possa não parecer assim. Esse aprendizado em consegui pôr em prática, porque fotografia tem muito disso. Em alguns momentos a gente depara com algumas dificuldades e pensa que não vai dar para fazer o trabalho. No final, com um pouco de esforço, acaba dando certo — como tudo na vida, aliás.
De volta a Niterói, Marcelo fez várias exposições individuais:
— Entre elas, destaco as realizadas no Centro Cultural Paschoal Carlos Magno, em 1975, e no MAM, em 1978. Participei também da coletiva “Niterói arte hoje”, no Museu de Arte Contemporânea. Atualmente, dedico-me a elaborar catálogos de exposições e de restauração de patrimônio, como os do Teatro João Caetano de Niterói, do sambódromo do Rio e do MAC, projetado por Oscar Niemeyer.” [82]
A contribuição comunitária ao caso Ilha da Trindade
Neste artigo eu citei o nome de alguns pesquisadores que estão ou já estiveram investigando o caso Ilha da Trindade, no passado e no presente. Não necessariamente eu concordo com tudo que eles já publicaram e defendem, assim como eventualmente eles podem não concordar com o que eu já publiquei e defendo.
A discordância é natural em qualquer campo de pesquisa fronteiriça da ciência (e mesmo na ciência). A menção incompleta dos nomes ilustra uma rápida pincelada parcial no cenário e algumas das contribuições de cada um, até então. A investigação do caso Trindade não é o trabalho de um homem só.
Entretanto, Marco Antonio Petit é o único pesquisador do caso Trindade no planeta a pensar que é o único. Ele tem uma grande dificuldade em lidar com a situação de outros pesquisadores também já terem dedicado sua energia, tempo e dinheiro a este caso, há anos. Apesar de ele imaginar que o Sol gira em torno de si, há trabalhos sobre este episódio bem mais profundos, extensivos e relevantes do que o dele (fato que pode ser claramente constatado nas referências ao final deste artigo).
Todavia, nós devemos assegurar que ele tem a sua parcela de contribuição na pesquisa deste caso e ninguém aqui está tentando diminuir seu trabalho. Ademais, Petit tem o direito de crítica que lhe é reservado, e igualmente ninguém está tentando calar seu direito. Se ele tem críticas honestas e algo verdadeiramente novo para apresentar, nós estamos prontos pra conhecê-las — e se for o caso acolhê-las.
Porém, da forma como ele se expressa, desmerecendo o trabalho e os esforços de todos os outros investigadores que têm pesquisado, analisado e revisado este episódio nos últimos anos, na minha visão ele exorbita de seu direito de crítica.
Alheio, perdido e desatualizado acerca das pesquisas que há mais de uma década vem submetendo este episódio à revisão, ele irrompeu na revista UFO apresentando fatos conhecidos de todos os outros investigadores como se fosse o único no planeta que os conhecia. Esta é a razão de eu não ter me apressado em respondê-lo imediatamente, vindo fazê-lo somente agora. Ele deve ter pensando que sua entrevista com Almiro Baraúna em 1997 era sua bala de prata, a única peça de investigação que alguém fez sobre este caso em meio século.
Apesar de sua tentativa de abafar a controvérsia e esconder o problema para debaixo do tapete, nós devemos afiançar que as recentes investigações que despontam para a fraude neste episódio sempre estiveram e continuam sob avaliação dos investigadores que estão analisando este episódio de modo desapaixonado, com mais parcimônia e dedicação.
Palavras finais (por enquanto)
Apesar da extensão, este artigo que escrevo é apenas uma simples pincelada em alguns aspectos da história do caso Ilha da Trindade. Há vários outros capítulos do episódio que sequer foram tratados aqui ou foram mencionados sem detalhado aprofundamento.
Eu ainda publicarei o meu trabalho mais longo sobre o episódio e abordarei cada aspecto da história em detalhes. No entanto, esse futuro trabalho não é uma crítica ao trabalho de qualquer outro pesquisador; ele é apenas a publicação de minha investigação deste episódio. Há também trabalhos de outros pesquisadores que estão no prelo.
Meu interesse no campo dos fenômenos aeroespaciais não identificados e em outras áreas da fronteira da ciência é legitimamente de escopo científico. Nunca me arvorei em afirmar que sou o proprietário da verdade. Portanto, eu estou disponível ao diálogo e igualmente a postos para reavaliar qualquer tópico que eu abordei neste escrito, principalmente caso sejam apresentados elementos que eventualmente possam refutar algum ponto que eu tratei ou surjam novos fatos até então desconhecidos por mim.
Referências
[1] BORGES, Alexandre de Carvalho. Caso Ilha da Trindade: sobrinho de Almiro Baraúna afirma que as fotos são um truque. Além da Ciência, 02 fev. 2011. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/caso-ilha-da-trindade-sobrinho-de-almiro-barauna-afirma-que-as-fotos-sao-um-truque>.
[2] PETIT, Marco Antonio. Caso Trindade: novas revelações. Conservatória, RJ. 2000. 1 videocassete (40 min), VHS/NTSC, son., color.
[3] Clube Fenômeno OVNI (CFO). Entrevista com Almiro Baraúna. Niterói, RJ: 1 CD de áudio (1 h:34 min), 02 jul. 2000.
[4] BORGES, Alexandre de Carvalho. Caso Ilha da Trindade: documentos sigilosos são revelados. Além da Ciência, 06 maio 2011. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/caso-ilha-da-trindade-documentos-sigilosos-sao-revelados-parte-1>.
[5] Nota oficial cita “estranho objeto visto sobre Trindade”. O Jornal, Rio de Janeiro, p. 1, 23 fev. 1958.
[6] MAGALHÃES, Sérgio. Requerimento de Informações nº 2957/1958. Câmara dos Deputados, 27 fev. 1958.
[7] Deputado quer desvendar sigilo do disco voador. Diário da Noite, Rio de Janeiro, 27 fev. 1958. Primeira Seção, p. 7.
[8] JÚNIOR, Antonio Alves Câmara. Requerimento nº 2957/58 do senhor deputado Sérgio Magalhães. Marinha do Brasil, ofício n. 898, 09 abr. 1958.
[9] Deputado diz que as fotos eram de objeto luminoso que não foi identificado. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 17 abr. 1958. 1º Caderno, p. 16.
[10] Disco voador: Câmara não pode divulgar relatório. O Jornal, Rio de Janeiro, p. 12, 17 abr. 1958.
[11] Inquérito da Marinha confirma existência do disco voador sobre a Ilha da Trindade. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 16 abr. 1958. 1º Caderno, p. 1, 8.
[12] BRANDÃO, José Geraldo. Relatório sobre a observação de objetos aéreos não identificados, registrados na Ilha da Trindade, no período compreendido entre 5 de dezembro de 1957 e 16 de janeiro de 1958. Marinha do Brasil, fev. 1958.
[13] LORENZEN, Coral E. New evidence on IGY photos. The A.P.R.O. Bulletin, Tucson, Arizona, p. 1, 3-8, Jan. 1965.
[14] BACELLAR, Carlos Alberto Ferreira. Relatório de fim de comissão. Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade. Período de 1º de novembro de 1957 a 16 de janeiro de 1958. Marinha do Brasil, fev. 1958.
[15] CASTRO, Eduardo Jorge dos Santos Crespo de. Relatório de fim de comissão do C.C. Eduardo Jorge dos Santos Crespo de Castro (6a Turma). Período de 17 de agosto de 1958 a 25 de outubro de 1958. Marinha do Brasil, out. 1958.
[16] LYRA, Marcio de Farias Neves Pereira de. Relatório de fim de comissão. Viagem de ocupação da Ilha da Trindade (Ano Geofísico Internacional). Terceira parte: navegação, oceanografia, meteorologia e hidrologia. Marinha do Brasil, set. 1957.
[17] ARMANDO, Carlos Alberto de Carvalho. Relatório do C.C. C. A. Carvalho Armando (1a Turma). Período de 16 de agosto de 1957 a 01 de novembro de 1957. Marinha do Brasil. s. d.
[18] VISONI, Rodrigo Moura. Sigilo ou censura? Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, n. 49, p. 67-69, out. 2009.
[19] Todo Seu. São Paulo: TV Gazeta, 17 set. 2009. Programa de TV.
[20] Nenhuma palavra oficial sobre o caso do disco voador. O Globo, Rio de Janeiro, p. 6, 22 fev. 1958.
[21] Fotografado o disco em Trindade. Diário Carioca, Rio de Janeiro, p. 1, 21 fev. 1958.
[22] RIMMER, John. The Trindade Island case: multiple witnesses or wishful thinking? Magonia Supplement, n. 44, 03 Dec. 2002. Disponível em: <http://magonia.haaan.com/2009/trindade-multiple-witnesses-or-wishful-thinking-john-rimmer>.
[23] PRINTY, Tim. UFO over Trindade Island: details overlooked or ignored. Tim Printy’s web site, June 2004. Disponível em: <http://www.astronomyufo.com/UFO/Trin4.htm>.
[24] O fotógrafo estava só quando revelou o filme. O Globo, Rio de Janeiro, p. 3, 26 fev. 1958.
[25] BORGES, Alexandre de Carvalho. Surge possível nova testemunha dos avistamentos de OVNIs na Ilha da Trindade. Além da Ciência, 19 ago. 2010. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/surge-possivel-nova-testemunha-dos-avistamentos-de-ovnis-na-ilha-da-trindade>.
[26] MARTINHO, Jeferson. Caso Ilha de Trindade: de prova incontestável a fraude disputada. Portal Vigília, 19 abr. 2011. Disponível em: <http://www.vigilia.com.br/caso-ilha-de-trindade-de-prova-incontestavel-a-fraude-disputada>.
[27] MENZEL, Donald H.; BOYD, Lyle G. The world of flying saucers: a scientific examination of a major myth of the space age. Garden City, NY: Doubleday and Company, p. 206-216, 1963.
[28] POWELL, Martin J. The Trindade Island UFO: a detailed study of photos 1 and 2. Unopened Files, n. 11, 1999. Disponível em: <http://www.aenigmatis.com/trindade-island-ufo-1958/trindade.htm>.
[29] BUHLER, Walter Karl. O disco voador na Ilha da Trindade. Boletim informativo da SBEDV, Rio de Janeiro, n. 16, 01 jul. 1960.
[30] BORGES, Alexandre de Carvalho. Caso Ilha da Trindade: o depoimento mais antigo de Almiro Baraúna. Além da Ciência, 23 maio 2011. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/caso-ilha-da-trindade-o-depoimento-mais-antigo-de-almiro-barauna>.
[31] PETIT, Marco Antonio. Novos fatos sobre o caso Trindade. UFO, Campo Grande, n. 54, out. 1997.
[32] “Baraúna, hábil falsificador”. Diário Carioca, Rio de Janeiro, p. 1, 23 fev. 1958.
[33] Disco voador da Trindade já aparecera em 54 numa outra fotomontagem. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 23 fev. 1958. 1º Caderno, p. 9.
[34] Marinha quer saber se “Disco-Baraúna” é “furo” ou chantagem. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, p. 1, 25 fev. 1958.
[35] Baraúna conta que o disco voador só apareceu em sua casa, depois de 8 dias. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 23 fev. 1958. 1º Caderno, p. 9.
[36] MORI, Kentaro. Almiro Barauna’s many hoaxes. SUNlite, v. 2, n. 1, p. 9-10, Jan./Feb. 2010. Disponível em: <http://www.astronomyufo.com/UFO/SUNlite2_1.pdf>.
[37] MORI, Kentaro. Fotógrafo de Trindade admite truque em entrevista. Ceticismo Aberto, 17 ago. 2010. Disponível em: <http://www.ceticismoaberto.com/ufologia/3690/fotgrafo-de-trindade-admite-truque-em-entrevista>.
[38] ZUNIR, Robert. O tesouro da ilha sem nome: os morcegos atacam à luz dos refletores. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 20 mar. 1956. Caderno 2, p. 8.
[39] ZUNIR, Robert. O tesouro da ilha sem nome: a maldição dos jesuítas e o massacre dos tapuias. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 21 mar. 1956. Caderno 2, p. 8.
[40] ZUNIR, Robert. O tesouro da ilha sem nome: um homem de camisa listada desembarca na ilha sem nome. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 22 mar. 1956. Caderno 2, p. 8.
[41] ZUNIR, Robert. O tesouro da ilha sem nome: desapareceu na gruta o homem de sapatos de corda. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 23 mar. 1956. Caderno 2, p. 8.
[42] Navio naufragado há meio século localizado na costa de Cabo Frio. O Globo, Rio de Janeiro, p. 10, 12 ago. 1957.
[43] Também oficiais, entre outras pessoas, viram o disco voador. O Globo, Rio de Janeiro, p. 5, 24 fev. 1958.
[44] MORI, Kentaro. Como forjar fotos OVNI, por Almiro Baraúna. Ceticismo Aberto, 17 jan. 2008. Disponível em: <http://www.ceticismoaberto.com/ufologia/1116/como-forjar-fotos-ovni-por-almiro-barana>.
[45] LIMA, Vinícius; BARAÚNA, Almiro (fotos). Um disco voador esteve em minha casa… O Mundo Ilustrado, Rio de Janeiro, ano II, n. 93, p. 38-39, 10 nov. 1954.
[46] BORGES, Alexandre de Carvalho. Um caso de OVNI sobre o mar contado pelo filho de uma testemunha. Além da Ciência, set. 2002. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/um-caso-de-ovni-sobre-o-mar-contado-pelo-filho-de-uma-testemunha>.
[47] GRIBBIN, John. Alone in the Universe: why our planet is unique. Hoboken, NJ: John Wiley & Sons, 2011.
[48] Cosmic Quandaries with Dr. Neil deGrasse Tyson, 2009, St. Petersburg.
[49] JUNG, Carl Gustav. Um mito moderno sobre coisas vistas no céu. Petrópolis, RJ: Vozes, 1991.
[50] Inquérito na FAB sobre discos voadores. O Jornal, Rio de Janeiro, p. 1, 6, 22 fev. 1958.
[51] BORGES, Alexandre de Carvalho. Entrevista com Amilar Vieira Filho: 45 anos depois, testemunha do avistamento do OVNI sobre a Ilha da Trindade comenta sobre as críticas ao caso. Além da Ciência, 13 fev. 2008. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/entrevista-com-amilar-vieira-filho-45-anos-depois-testemunha-do-avistamento-do-ovni-sobre-a-ilha-da-trindade-comenta-sobre-as-criticas-ao-caso>.
[52] Disco ou não, viu um objeto oval e luminoso nos céus de Trindade. O Globo, Rio de Janeiro, p. 4, 28 fev. 1958.
[53] MARTINS, João. Disco voador sobrevoa o Almirante Saldanha. O Cruzeiro, Rio de Janeiro, ano XXX, n. 21, p. 4-14, 08 mar. 1958.
[54] Marinha de Guerra fotografou disco voador sobre Trindade. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, p. 1, 21 fev. 1958.
[55] O Estado-Maior da Armada e o Disco Voador. O Globo, Rio de Janeiro, p. 1, 20 fev. 1958.
[56] ZALUAR, Aurélio. Caso da Ilha de Trindade: 21 anos depois. OVNI Documento, Rio de Janeiro, n. 5, p. 21-24, out./dez. 1979.
[57] Sigilo absoluto na Marinha em torno do disco voador. O Globo, Rio de Janeiro, p. 6, 21 fev. 1958.
[58] Por três vezes, o “Disco Voador” passou sobre a Ilha da Trindade. Última Hora, Rio de Janeiro, p. 1, 6, 21 fev. 1958.
[59] O Cruzeiro adquire exclusividade para a publicação das fotos. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p. 5, 21 fev. 1958.
[60] O disco. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 24 fev. 1958. Caderno 2, p. 4.
[61] BARTOLO, Júlio. Keffel, Baraúna e G. Adamski: eles fotografaram discos voadores. O Cruzeiro, Rio de Janeiro, ano XLV, n. 51, p. 25-33, 19 dez. 1973.
[62] Baraúna levará o caso das fotos do disco à justiça. Diário da Noite, Rio de Janeiro, p. 1, 3, 22 fev. 1958.
[63] MARTINS, João; KEFFEL, Ed. Extra! Discos voadores na Barra da Tijuca. O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 17 maio 1952.
[64] OVNIs: Objetos Voadores Não Identificados. Terceira Visão. São Paulo: Bandeirantes, 17 abr. 1987. Programa de TV.
[65] CARVALHO, Luiz Maklouf. Cobras Criadas: David Nasser e O Cruzeiro. São Paulo: SENAC, p. 264-270, 2001.
[66] COVO, Claudeir; LUCHERINI, Paola. O caso Barra da Tijuca. INFA, 2004. Disponível em: <http://infa.com.br/o_caso_barra_da_tijuca01.html>.
[67] BORGES, Alexandre de Carvalho. As sombras, as sondas e as testemunhas: a fraude do caso Barra da Tijuca. Além da Ciência, 2008. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/as-sombras-as-sondas-e-as-testemunhas-a-fraude-do-caso-barra-da-tijuca>.
[68] CARMO, Alberto Francisco do. JK e o episódio da Ilha da Trindade: uma visão mais detalhada e inesperada. s. l.: s. d.
[69] “Disco Voador”: prosseguem as controvérsias em torno da aparição da Ilha da Trindade. Última Hora, Rio de Janeiro, p. 6, 22 fev. 1958.
[70] Marinha autentica as fotos. Diário Carioca, Rio de Janeiro, p. 1, 23 fev. 1958.
[71] Baraúna depôs longamente no Serviço Secreto da Marinha. O Globo, Rio de Janeiro, p. 3, 24 fev. 1958.
[72] PRINTY, Tim. UFO over Trindade Island: trick or truth? Tim Printy’s web site, June 2004. Disponível em: <http://www.astronomyufo.com/UFO/Trin6.htm>.
[73] HYZER, William G. More deceptive imagery. Photomethods, Sep. 12-13, 1991.
[74] BARAÚNA, Almiro. Entrevista com Almiro Baraúna. Brasília: II Congresso Internacional de Ufologia, 19 abr. 1983. 1 arquivo de áudio (20 min). Entrevista concedida a J. Allen Hynek.
[75] MEES, C. E. K. The fundamentals of photography. Rochester, NY: Eastman Kodak Company, 1921.
[76] WARREN, Bruce. Photography. Boston, MA: Wadsworth/Cengage Learning, 2002.
[77] COVO, Claudeir. Novas discussões sobre as fotografias de Baraúna esquentam a Ufologia. UFO, Campo Grande, n. 180, ago. 2011.
[78] SHOUGH, Martin. The Trindade Island photographs: a preliminary study of cloud displacements. Martin Shough website, Feb. 2004. Disponível em: <http://martinshough.com/aerialphenomena/trindade/clouds.htm>.
[79] Famosas fotos de disco voador são fraude, revela amiga do fotógrafo. Fantástico. Rio de Janeiro: Globo, 19 ago. 2010. Disponível em: <http://fantastico.globo.com/Jornalismo/FANT/0,,MUL1614449-15605,00.html>.
[80] Aeronáutica divulga procedimentos em caso de aparição de discos voadores. Fantástico. Rio de Janeiro: Globo, 15 ago. 2010. Programa de TV.
[81] BORGES, Alexandre de Carvalho. O OVNI da Ilha da Trindade seria duas colheres? Além da Ciência, 17 ago. 2010. Disponível em: <https://www.alemdaciencia.com/o-ovni-da-ilha-da-trindade-seria-duas-colheres>.
[82] RODRIGUES, Carlos. O aprendizado do possível, na arte e na vida. Associação Brasileira de Imprensa, 24 mar. 2006. Disponível em: <http://www.abi.org.br/o-aprendizado-do-possivel-na-arte-e-na-vida/>.
Excelente artigo. Completo e devastador, desmascarando o cascateiro do Marco Petit. O sujeito forjou outras entrevistas que nunca fez com o Barauna, inventou testemunhas que nunca encontrou e inflou seu próprio trabalho pra ludibriar os desavisados a pensar que fez mais do que fez.
Esse Petit provou por si mesmo ter conhecimento bem superficial do caso. Além de não ter ética alguma, ignorando os trabalhos já publicados sobre o episódio que tratavam vários aspectos com mais propriedade e profundidade.
Ele esconde os vários trabalhos dos outros investigadores e apresenta o dele como “novidade”. Obrigado por desmascarar esse canastrão da ufologia.
foram duas fichas da frota carioca ou duas colheres, parece que não ficou bem esclarecido.
Talvez nunca saibamos a maquete que Baraúna poderia ter utilizado. Visualmente as colheres se aproximam mais daquilo que é visto nas fotografias.