(Arte por Alexandre Borges)

O caso Ilha da Trindade é considerado um clássico da ufologia mundial. Ocorrido há mais de meio século atrás, em 16 de janeiro de 1958, ainda provoca debates entre pesquisadores sobre a sua autenticidade.

O protagonista deste episódio, o repórter fotográfico Almiro Baraúna, concedeu diversas entrevistas ao longo dos anos para descrever os fatos que vivenciou.

Agora, publicamos aqui uma entrevista até então desconhecida do grande público e restrita a poucas pessoas. Até onde se conhece, este depoimento de Almiro Baraúna sobre o episódio e sobre as suas polêmicas fotografias teria sido a última concedida por ele, que faleceu em 29 de julho do ano 2000.

A entrevista foi conduzida pelo Clube Fenômeno OVNI (CFO) na data de 02 de julho de 2000, semanas antes do falecimento do fotógrafo, aos 84 anos.

A equipe do grupo CFO se reuniu na residência do fotógrafo, na Praia das Flexas, em Niterói, no Rio de Janeiro. Estavam presentes na ocasião o presidente do grupo, Marcio Ercilo, o diretor de videoteca Marcelo Lessa e os membros Rui, Verônica, Vinicius e Elisabeth.

A entrevista, gravada em áudio, apresenta poucas novidades quando comparada a outras entrevistas anteriores que o fotógrafo já havia concedido.

Entretanto, dentre todas aquelas entrevistas conhecidas publicamente, esta que agora apresentamos pode ser considerada a mais longa e detalhada que alguém já realizou com o repórter fotográfico sobre o episódio do OVNI da Ilha da Trindade, com duração de 1 hora e 34 minutos.

De acordo com o grupo Clube Fenômeno OVNI, a entrevista foi gravada em fita cassete e posteriormente digitalizada. Com o tempo, observamos que o áudio da fita sofreu perdas da qualidade, apresentando alguns trechos de difícil audibilidade.

No entanto, este autor, Alexandre de Carvalho Borges, ouviu e reouviu várias vezes o áudio original em um trabalho de dezenas de horas para transcrevê-lo sem erros, tratando-o digitalmente para torná-lo mais audível em alguns trechos.

Com base neste áudio, oferecemos a transcrição dessa entrevista realizada por este autor. Não disponibilizamos este material aqui como um endosso irrestrito da história contada pelo fotógrafo, mas como um depoimento para conhecimento e estudo dos interessados.

Portanto, acompanhe a entrevista, abaixo, onde Almiro Baraúna descreve a sua versão de como tudo aconteceu na Ilha da Trindade e os desdobramentos dessa história no meio militar da Marinha Brasileira.

A última entrevista de Almiro Baraúna 

Por Clube Fenômeno OVNI (CFO) – 02 de julho de 2000
Transcrição por Alexandre de Carvalho Borges

Senhor Almiro Baraúna, testemunha do OVNI do dia 16 de janeiro de 1958. Com a palavra o senhor Baraúna.

No começo… nos finais de 57 e [início de] 58 havia em Niterói um grupo de caça submarina de Icaraí da qual eu fazia parte. Eu não fazia parte como caçador, eu era fotógrafo submarino. Por sinal, eu fui o pioneiro de fotografia submarina do Brasil. Eu reconstruí as câmeras submarinas e me juntei a esse grupo pra fotografar caçador debaixo d’água. Eu sou jornalista e vendia reportagem.

O senhor chegou a trabalhar para aquela revista O Cruzeiro? 

O Cruzeiro, [para a] Manchete Esportiva. Trabalhei seis anos na O Mundo Ilustrado… e várias revistas. Mas nesse ano havia a comemoração do Ano Geofísico Internacional.

A cooperação entre vários países pra…

Todos os países concorreram, e o Brasil naturalmente, né? De forma que quando a Marinha ia à Ilha da Trindade levava sempre um grupo de caça submarina. Tinha muitos grupos aqui no Rio [de Janeiro] na época. Levava um grupo de caça submarina. Nós fomos convidados pela Marinha.

Eu não fui com a intenção de Ano Geofísico nenhum, eu fui fotografar debaixo d’água. Levei um equipamento muito bom e saímos daqui no dia 09 ou 10 de janeiro. A viagem à Ilha da Trindade é muito longe e ela fica mais perto da África do que do Brasil. O navio era a vela, era o Almirante Saldanha, um navio-escola.

Ele era à vela?

Era à vela. Ele tinha motor, mas só pra entrar no porto e sair.

O restante a natureza oferecia.

Quando ele saía da baía era à vela. Eu fui com a condição de voltar logo porque eu tinha muito serviço na época. [Pensei:] “Será que vai e volta no dia seguinte?”. Quando o navio saiu de lá, eu perguntei a um marinheiro:

“Escuta aqui marinheiro, com essa velocidade o navio vai sair e vai levar quanto tempo para chegar lá na ilha?”. Ele disse: “Essa velocidade vai aumentar daqui a pouco, vai desligar o motor e abrir as velas. Vai levar seis dias pra chegar na ilha”. Eu digo: “Mas veja só, seis dias pra chegar na ilha, ainda mais a estadia e a volta”. Compreendeu?

Ficaria muito tempo.

Muito tempo fora de casa, né? [Disseram:] “Não tem problema não, não sei o quê lá…”. Tem um rádio da Marinha que avisa as famílias, não sei o quê lá, tal e coisa… Me acalmaram. Eu fiquei chateado com o troço, mas não tinha mais jeito, eu fui. Na volta que é uma beleza, né? A viagem correu normalmente, não houve temporal e nem nada. Quando foi no dia 10 ou 12 de janeiro por aí assim quando amanhecemos em frente à ilha. Mas o mar tava grosso demais.

Essa tripulação tinha mais de cem homens? Era bastante gente na tripulação? Tinha muitas pessoas?

A tripulação do navio era mais ou menos umas cem pessoas, aproximadamente umas cem pessoas, entre marinheiros, cabos, sargentos e oficiais. O comandante era o almirante José Saldanha da Gama, descendente do Saldanha da Gama. Chegamos na ilha. O almirante disse assim: “Vocês não podem descer hoje não. O mar tá muito forte.” Aí o chefe do grupo, Amilar Vieira, [disse]: “Não, vamos descer hoje de qualquer jeito, nem que seja nós”.

O navio ancorou a uns 700 metros da costa da ilha. Aí é pedra pura, não tem [incompreensível]. Tinha naquela época, agora não sei. [Disseram:] “Bom, vamos fazer o seguinte: tá vendo aquela boia lá perto da ilha? Aquilo ali é uma boia de sinalização. Eu mando o escaler deixar vocês na boia e vocês de lá vão nadando”. Não tem condição de chegar o escaler perto da costa, é pura pedra. O mar bate com uma violência incrível.

Podia destroçar o navio se ele aproximasse demais da ilha. 

Não ia aproximar demais. O navio não aproxima mais da ilha. E o fundo da ilha era vulcão, era tudo pedregoso. Você vê o fundo, pensa que tá perto, dá mais de vinte metros de profundidade. É o lugar certo para o navio ancorar pra poder a âncora pegar no fundo. É pedra pura em volta. Aí disse: “Vamos descer? Vamos!”. Aí quando desceu o escaler motorizado nós embarcamos com o material.

Eu digo: “Olha, eu não tô armado”. Eram cinco, quatro caçadores e eu. Eu digo: “Vocês ficam dois de cada lado e eu vou no meio”. O comandante disse assim: “Procura chegar na ilha sem se machucar nos corais. Tem muito coral na ilha, em volta. Procura não se machucar nos corais. Tem muito tubarão aí, eles são mansos, eles não atacam, a não ser que sinta o cheiro de sangue. Vocês vão direitinho, aproveita as ondas, vão descendo, tal e coisa, vocês descem lá”. Eu disse: “Está bem! Vamos embora, vamos”.

O escaler desceu, nós montamos. O escaler foi subindo e descendo nas ondas. Quando chegou perto da boia, disse assim: “Olhe aqui, na próxima onda eu vou dar a volta e vocês pulam n’água, hein?”. Aí a onda passou, ele fez a volta, nós pulamos n’água e pronto: dois de cada lado e eu no meio. Nadamos pra ilha. Tinha mais ou menos uns 200 metros, faltava uns 200 metros pra chegar na ilha. Aí fui nadando.

Mais adiante eu olhei assim, não vi mais ninguém perto de mim. Fiquei sozinho. Porque eles viram muito peixe, se dispersaram pra atirar nos peixes. Eu fui embora. Eu levantei o pescoço assim, quando a onda passava eu via a ilha lá embaixo, depois a ilha sumia.

Eu disse: “A direção é essa aqui”. Comecei a nadar na direção da ilha. Quando estava bem perto da ilha, apareceu um deles; esse já morreu [atualmente]. Chegou perto, fez sinal pra mim. Ele levantou assim uma linha, tinha um peixe enorme pendurado na linha. Ele tinha matado um peixe.

Aí continuamos. Eu fui o primeiro a pisar na ilha. Esperei uma onda só, saí de “jacaré”, pulei na ilha. Não tem praia. Durante a guerra a Marinha abriu uma rampa larga na pedra de uns 150 metros mais ou menos de largura. Era uma rampa de pedra cravada na rocha. Aí é que o pessoal saía; aí saí ali pulando, tal e coisa, subi com o material. O pessoal veio me saudar.

[Disseram:] “Parabéns, tal e coisa. Cadê os outros?”. [Disse:] “Estão aí nadando por perto”. Aí aparecia a cabecinha de um e a cabecinha do outro. Aí saíram todos. Cada um tinha uma fileira de peixe deste tamanho. Você pega com a mão, inclusive um tubarão de dois metros.

Conseguiram pegar com a mão?

Quer dizer, arriscaram muito, né? Tiveram sangue. Nós saltamos, o comandante da ilha veio, deu as boas-vindas, levou a gente para o alojamento. Ficamos ali conversando. [Comandante:] “Como é, vocês vão pesquisar hoje?”. Disse: “Agora mesmo”. A ilha era ocupada nessa época por 180 homens. Tinha um posto de meteorologia e um frigorífero enorme que levava mantimentos pra lá, tudo de madeira, do tempo dos americanos; e tinha quatro árvores: três palmeiras e uma mangueira. Só.

Só. O restante era só rocha vulcânica? 

Rocha vulcânica e tinha uma vegetaçãozinha rasteira, sabe? Aí o comandante conversou conosco, tal e coisa: “Chegou bem?”. [Disse:] “Chegou, tá tudo bem, tal e coisa. Amanhã nós descemos se a maré deixar”. Aí as festanças toda na ilha e tudo mais. De noite nós saímos pela costa da ilha pra ver a desova das tartarugas. Cada tartaruga gigante desovando na encosta. Na ilha tem uma espécie dessa pedra de construção. Conhece pedra de construção?

De pedra?

Cascalho. Era ali que as tartarugas desovam. Nós ficamos de noite, de lanterna, vendo as tartarugas desovar. Aí de manhã começou, né? A Marinha ia levar o pessoal, sabe pra quê? Pra estudar a qualidade dos peixes. Pescavam o peixe, deixam lá, botam no frigorífero pra estudar os peixes.

De noite que é uma beleza, a Marinha é uma beleza, a Marinha é uma maravilha. Bem, amanheceu o dia, todo mundo pronto. Vão pescar peixe diferente, e eu atrás deles. Um ia pra um lado, eu ia atrás fotografando, dando uma volta com eles. Primeiro dia ninguém mais trabalhou porque estava todo mundo cansado, todo mundo estava esgotado. A onda melhorou um pouco.

Primeiro dia, segundo dia, mesma coisa. Terceiro dia, amanhã vamos embora. Tá bem! Nós não sabíamos de nada, hein? Sim, além de nós cinco tinha um repórter do Jornal do Brasil, um fotógrafo do Jornal do Brasil, um japonês que não falava português que era um cientista de São Paulo, dois cientistas paulistas, tudo civil, hein? Todo mundo a tomar nota, fizeram uns relatórios enormes durante a noite nos ambulatórios. [Disse:] “Tá resolvido o negócio, vamos embora”.

Como estava o dia? Era um dia claro, havia nuvens?  

Claríssimo. Quatro horas da manhã já tá claro e oito da noite já está claro. Porque a ilha entra no mar e o horizonte em volta.

Era verão?

Era verão, era janeiro. Além desses relatórios que eles fizeram e dos mergulhos, nós fizemos vários passeios pelas pedras. Comandante disse: “Olha, vocês tenham muito cuidado. A pedra é vulcânica, não tem resistência”. Mostrou um marinheiro com os dois braços engessados; caiu de uma pedra, ficou lá com os dois braços engessados, é muito perigoso.

Aí nós saímos ali, rodamos, tal e coisa. Tem uma cratera na ilha que você vai lá em cima no pico daqueles, chama-se Pico Desejado, nunca ninguém foi lá em cima. Sabe como é que é, do pico olha pra baixo tem mais ou menos uns 200 metros de profundidade. Você vê a vegetação, a copa de umas árvores, sabe? É a cratera do vulcão.

Ali tem árvores?

Dentro da cratera tem. Porque a cratera junta… Do lado de fora não tem porque a ventania não deixa.

O vento tira.

Tem um verdadeiro batalhão de caranguejos, todos iguais — mas igual no feitio. Eles vão de branco até preto. Tem branco, azulado, avermelhado, roxeado, malhado, e tem os branquinhos que ficam dentro d’água. Eu fui fotografando tudo isso, né? Fotografei tudo. Fotografei o navio lá embaixo dentro d’água no mar.

Tem quatros fontes de água mineral, mas só pode beber de uma porque as outras são águas sulfurosas. Marinheiro doente da pele, dá água pra ele, passa um mês lá e volta novinho. Tem uma fonte que é água mineral, pode beber à vontade, e jorra noite e dia no mar; foi canalizado do alto do morro e desce na areia na praia.

Bom, no dia seguinte vamos embora. Reunimos o material todo, o equipamento. O mar começou a engrossar outra vez. Pra chegar pra pegar o batelão espera um troço chamado cabrita. São dois barcos infláveis…

Tipo bote?

É. Tem um lastro em cima, sabe? Um lastro de madeira. A turma sobe ali. Tem um cabo de aço que liga a boia a terra; vai puxando o cabo de aço que fica na boia, o batelão passa, aí pula dentro do batelão e vai embora. É um negócio meio horroroso. Pega na cabrita e a cabrita vai e volta com o cabo de aço. Agora deve tá melhor, né? Não sei. Era assim.

Nós subimos na cabrita e quando chegou mais ou menos no meio do caminho veio uma onda e virou a cabrita, eu caí dentro d’água com tudo. Meu material não estragou porque eu levava uma caixa de alumínio à prova d’água que eu botava o material dentro, fechava, atarraxava e não entrava água. Eu botei tudo ali dentro. Caiu todo mundo dentro d’água. Eles vieram com a cabrita, montei, puxaram, passou o batelão, nós montamos. Vamos a bordo.

Chegou a bordo, outra tragédia para subir no navio. Eles jogam uma corda chamada quebra-peito, uma escada de corda. Tem que subir por ali. O batelão fica subindo e descendo no costado do navio. Na hora que sobe o máximo, você se agarra na corda e sobe; espera baixar, quando sobe outra vez… só quando chega em cima. Se pegar a corda no meio, o batelão vem e amassa o sujeito todo no cascado. Um troço horroroso. Se eu soubesse não teria ido [risos]. Eu cheguei lá enjoado.

Você tem esse problema, né?

Eu tenho esse problema do enjoo. Nós dormíamos, quando amanhecia o dia, antes de eu levantar da cama eu tomava uma pílula Dramin, aí eu não enjoo o dia todo. Nesse dia não tomei, tava em terra. Cheguei lá enjoado, aí deitei numa sombra. Botei o equipamento do lado. Deitei de bruços, fiquei ali deitado.

O pessoal tá a bordo, o convés tá cheio de gente. Corre pra o lado, corre pra ali, resolve… chegou a última viagem do batelão. [Disseram:] “Vão suspender o batelão”. Aí é que é perigoso: ficam os dois marinheiros no batelão, um na proa, outra na popa.

Quando ele joga de lá de cima o guindastezinho, quando o batelão sobe, ele pega o gancho e engata. O batelão fica no ar, aí o guindaste puxa. Um troço horroroso. O repórter do Jornal do Brasil [José Farias de Azevedo] chegou pra mim e disse assim: “Baraúna, vão suspender o batelão. Vai dar uma boa fotografia, vamos lá tirar foto”.

[Disse pra ele:] “Tá bom, tá bom, vou levantar”. [Ele disse:] “Que bobagem, daqui a pouco você melhora.” Me lembro como se fosse hoje, ele estava de short branco, com boné, com a máquina na mão me olhando assim, olhando pelo costado. Aí fui, peguei a máquina — a máquina estava com o filme pela metade.

Qual o tipo de máquina?

Rolleiflex 2.8. Estava com meio filme só batido.

Era adaptado pra… 

Não, essa não. Eu levei uma Rolleiflex, uma Leica, uma máquina submarina e uma câmera de fotografia submarina; isso já estava a bordo, tava no meu camarote. Eu aí levantei com uma vontade, sabe? Olhei, o barco estava lá embaixo [para suspender].

Quando virei as costas, escutei uma gritaria na proa do navio; nós estávamos na popa. Uma gritaria terrível na proa do navio. [Diziam:] “O que é? O que é? O que é?”. Aí veio um oficial correndo e disse assim: “O disco apareceu outra vez”. Outra vez.

Outra vez.

É. [Oficial disse:] “O disco apareceu outra vez”. Aí a turma toda ficou no convés olhando para o alto assim. Aí um dos colegas meus disse assim: “Fotografa, olha ali, olha ali, tá vindo pra ilha, tá vindo pra ilha”. Uma confusão do inferno.

Virou a tragédia no convés, todo mundo correu. Tinha um almirante a bordo nessa época, tinha o comandante que era o almirante, tinha o Paulo Moreira da Silva, um grande pesquisador também. Ele estava com a filmadora na mão, uma Bolex, sentado no banco. Eu não vi se ele filmou ou não. Ele disse que não filmou, ficou nervoso e não filmou.

O objeto vem se aproximando da ilha. Eu aí quando eu olhei assim não vi o objeto, eu vi uma luz no céu. O dia estava claro, mas estava com aquelas nuvens chamada cirrus. Sabe aquelas nuvens cirrus? Parece um carneirinho, é cheio de carneirinho assim no céu. Eu vi aquela piscadela e bati a primeira. Esperei mais um pouco, ele foi se aproximando da ilha, andou por cima da ilha, bati mais uma. Duas.

Eu sabia que estava com seis chapas só. [Pensei:] “Deixo ver o que esse ‘cara’ vai fazer, né?”. Ele passou por trás da ilha e se escondeu atrás do morro. Houve aquele silêncio a bordo, eu fiquei esperando com o visor [da câmera] na cara. Daqui a pouco ele apareceu novamente, voltando, parou, deixou de correr. Ficou ondulando igual a um balão apagado, certamente um balão apagado.

Qual era a cor? 

Era cinza claro. Parecia uma lua cheia ovalada, sabe?

Ovalada?

É. Ele parou em cima da ilha, do lado do morro, e começou a ondular como se fosse um balão. De repente saiu correndo numa velocidade incrível, deixou aquele traço azulado no céu. Quando ele corria, eu bati mais as outras chapas. Só pegou a última, as duas falharam.

A velocidade que ele estava era, na época, nenhum aparelho terrestre poderia…

Pegar a velocidade dele não dava. Ele deixou um traço azulado no céu, ficou parado no horizonte. O fotógrafo do Jornal do Brasil que estava junto comigo, Farias de Azevedo, [ficou] com a boca aberta assim e os olhos…

Não teve reação. 

[Disseram:] “Olha ele lá no horizonte”. Ele foi sumindo, sumindo, sumindo, diminuindo de tamanho, diminuindo, diminuindo e sumiu.

Como se fosse uma desmaterialização?

Não.

Não, assim na distância.

Na distância.

Senhor Baraúna, ele estava mais ou menos no alto da vista na direção dos olhos ou subindo?

Não, estava na direção dos olhos.

O relatório da Marinha estava certo no dizer que o objeto se encontrava a 14 km?

Isso aí [a medição] foi feito lá na Marinha comigo.

Mas o senhor achava que ele devia estar mesmo nessa distância ou estava mais perto? 

Ninguém achava nada. Ninguém tinha noção de distância nem de tamanho. Era um objeto correndo no céu. Agora, a distância ninguém tem como saber. Ele passa… ele saiu correndo, deixou aquele traço como se fosse um risco de fumaça no céu.

Uma esteira.

Deixou na horizontal um traço perfeitamente reto e foi sumindo no horizonte. Desapareceu.

Senhor Baraúna, como você pode descrever a emoção de estar diante do desconhecido? 

Eu não senti nada.

Sentiu nada?

Não senti absolutamente nada. O que agiu aí foi a profissionalização.

Você foi profissional.

Eu queria bater a fotografia. O resto eu contava.

Antes desse acontecimento o senhor acreditava em discos voadores? Qual sua opinião?

Eu fazia crítica do negócio.

Crítica?

É. Eu não acreditava, não acreditava. Muito bem, o objeto sumiu. Parou um pouco a confusão a bordo. O comandante saiu assim da escotilha e disse assim: “O que é isso aí a bordo, que gritaria é essa?”. Foi uma coisa rápida, foi uma coisa tão rápida, deu o quê um… Pela cronometragem da Marinha deu vinte segundos por aí assim. Uma coisa rapidíssima.

O comandante disse: “Que negócio é esse aí, é algum motim a bordo?”. [Disseram:] “É o disco, o disco apareceu outra vez”. O comandante chegou pra mim, eu sentei num banco no convés e comecei a tremer de emoção. Comecei a tremer, não podia parar. Comandante: “Você bateu a fotografia?”. [Disse:] “Bati, agora se pegou eu não sei, não sei” — com toda a oficialidade toda em volta; “Não sei, só vendo. Só posso ver se revelar”.

O navio tem laboratório. Se tiver, vamos revelar isso. Eu digo: “Vamos”. Aí me levaram para o laboratório. O laboratório estava abandonado há anos, vazava luz por todos os lados. [Disse:] “Vamos dar um jeito aí”. Vieram os marinheiros, botaram os toldos no buraco da… fecharam as janelas todas. O capitão [José Teobaldo] Viegas da Aeronáutica, que fazia parte do nosso grupo, disse: “Eu te ajudo, pode deixar”. Não tinha luz de segurança pra revelar o filme.

Lâmpada vermelha?

Não, era luz verde. Não tinha luz de segurança. Eu não ia arriscar revelar aquele filme sem a luz de segurança. Eu não sabia, quando eu estava focando o barco sendo suspenso de bordo, estava em uma velocidade de uma abertura. Quando virei para o céu — e o céu lá era muito claro — ia dar superexposição na luz, né? [Disseram:] “Vamos dar um jeito”.

Aí foi coisa aqui e foi coisa ali, arranjaram um pedaço de celofane verde com uma lanterna elétrica, dobrando o celofane, botamos a lanterna elétrica e testamos: “Dá jeito sim. Cuidado, não solte o celofane da lanterna. Vamos ver o material”.

Todo o material de bordo do laboratório estava tudo ultrapassado, tudo endurecido. Eu digo: “Como é que eu vou fazer isso?”. Peguei uma colherinha de chá de metol puro, dissolvi na água morna. Arranjaram um copo graduado, aí foi bom, né? Uma colherinha de chá de metol, dissolveu direitinho. Dissolveu.

[Coloquei] duas colheres de sopa de sulfito, o revelador mais simples que existe. Se eu viesse pra Niterói ia revelar com um revelador bom, né? Não ia fazer uma besteira dessas, ia revelador com um revelador inglês [risos]. Mas, lá o que eu ia fazer? O comandante queria ver o troço. Fiz o revelador e procurei um tanque pra revelar. Tinha um tanque quebrado; põe um cobertor por cima do tanque. Não tinha tampa. Carreguei o tanque.

O capitão Viegas do meu lado e eu falando com ele no escuro: “Cobre minha mão aí”. Ele cobriu a mão e eu comecei a rodar: “Vê a hora aí no relógio”. Ele tinha um relógio luminoso que ficava olhando o ponteiro luminoso passando. “Não deixa passar o tempo não, hein?”. Cinco minutos. Disse: “Bom, tira o cobertor e acende a luz verde”.

Quando tira o cobertor e acende a luz verde, que olhei, tava aquelas marcas pretas em volta do filme. Digo: “Cobre outra vez”, ele cobriu. “Não descobre mais, hein?”. Bom, cobriu o cobertor e rodei o tanque. Despejei o revelador, botei… Ah, não tinha interruptor pra o filme. Mandei buscar vinagre na cozinha, interrompi com vinagre.

Tudo improvisado.

Tudo improvisado. Aí botei o fixador…

Tinha cloreto?

Não, naquele tempo não se usava cloreto, só profissional muito avançado. Botei o fixador, botei o cobertor em cima: “Segura aqui em cima. Pode acender a luz branca”. Acendeu a luz branca. Ficamos esperando. Quando deu dez minutos [disse] “tira o cobertor”. Tirou, quando abri assim estava lá a revelação. Saiu um bocadinho puxado; se passasse mais uns dez segundos estragava. Tava lá ele. Aí quando abri a porta do laboratório…

Todo mundo por fora esperando. 

… a oficialidade toda tava de olho [risos]. A oficialidade com lanterna, com lupa, com isso, com aquilo. [Perguntaram:] ”Saiu? Saiu?”.

Eu disse: ”Saiu, saiu. Vamos ver”. Aí lavei um bocadinho assim, escorri assim, a turma olhava com a lente, olhava com…: “É, mas aqui não tem, né? E aqui não tem”. Tinha a primeira, a segunda, a terceira ele parado, quarta e quinta não tinha, estava só a ilha assim do lado. Quando empurrou, eu cai, amassei o para-sol da Rolleiflex. A quarta chapa pegava só o mar e um pedacinho da ilha e a sexta estava ele lá no horizonte. Ele lá no horizonte. [Perguntaram:] “Aí como é que vai fazer?”. [Disse:] “Agora tem que esperar secar”.

Deixei lavando uns dez minutos, todo mundo em volta de mim. [Pensei:] “Ê, vão tomar o filme. Não tem jeito”. O meu primeiro pensamento foi esse, vão tomar o filme, não tem jeito. Aí reuniu o pessoal nosso: “Não toma não, o pessoal é camarada, tal e coisa. Eles podem querer cópias”.

Aí com aquela conversa, tal e coisa, pendurei o filme na frente do ventilador, deixei ficar um pouco, tá quase seco. [Disse:] “Podem vir ver olhar direito”. Aí vieram, botaram uma lanterna possante por baixo, aí botava a lupa por cima, olhando: “É ele mesmo. Parece isso, parece aquilo…”.

Cada um disse um troço, sabe? Pendurei no meu camarote, deixei secar mais um pouco, aí fui pra o convés conversar. Mas, nesse meio tempo eu fiquei sabendo uma poção de coisas, além da bagunça que houve a bordo na hora da aparição do objeto. De manhã cedo quando nós estávamos na ilha, o radar de bordo pegou por duas ou três vezes uma imagem. O radar de bordo. Não era possível que fosse avião; avião não ia lá naquela época.

Não tinha linha comercial por ali?

Nada. É completamente isolado. Gaivota e outro bicho qualquer não podia ser porque não existe pássaro na ilha. O que seria aquilo? Eles ficaram preocupados com o sinal do radar, pensando que fosse algum defeito. Testaram, o radar estava perfeito. Eles ficaram de sobreaviso na proa do navio. Um grupo de oficiais com sargentos estavam na proa do navio esperando qualquer coisa e olhando para o horizonte com binóculo.

Tinha um que tinha um telescópio desse tamanho assim e ficava olhando. Quando deu o berro: “É vem o objeto”. Pronto, aí o radar estava com razão. Na hora que o objeto apareceu, a luz de bordo caiu.

Caiu?

Ficou só o filamento aparecendo. Os motores pararam. O motor que estava puxando o barco — o barco ficou assim inclinado — parou. Parou o motor. A bússola ficou maluca rodando em sentido contrário. O ponteiro da bússola rodava em sentido contrário, não parava.

Incrível.

Uma coisa incrível. Aí começou a confusão outra vez. Depois que acalmou o pessoal [disseram:] “Será que não será… e tal e coisa”. Todo mundo olhando. Mais aí aconteceram umas coisas nesse meio tempo que eu não vou revelar a ninguém, nunca, porque eles me pediram pra não revelar.

O pessoal da Marinha?

É. Eles pediram pra não revelar. É o tal do relatório.

Ah, do relatório.

Do relatório. Eles pediram pra não revelar o acontecimento. Muito bem, aí o pessoal ficou por ali conversando. Vamos almoçar: ninguém conseguiu almoçar. O oficial mecânico desceu pra ver o quê que tinha no motor porque o motor não pegava. O céu escureceu.

Depois dessa visualização do OVNI, depois que ele sumiu, o navio se restabeleceu, voltou as luzes normal? Voltou a funcionar normalmente o navio?

Demorou. O motor que puxava a âncora, não puxava. Ficava [imita som de motor que não funciona], não puxava. Depois ele foi indo, foi indo, puxou. Aí o motor de bordo pegou. Eles nem levantaram a vela, o motor de bordo pegou. Levantaram a âncora e começaram a sair. [Disseram:] “Vamos almoçar”. Nós estávamos almoçando, a luz fraca. Aí, não sei quem disse assim: “O objeto deve tá aí por cima”.

Quando foi ver o céu já estava escurecendo, escurecendo não, as nuvens estão mais carregadas. As nuvens estavam mais carregadas do que de manhã. [Falaram:] “Deve estar aí por cima, olha aí como está a luz”. Aí o outro explicava: “Não, isso aí não é isso não, é isso aqui, aquilo outro, tal e coisa”. O navio começou a andar, parou três vezes, parou mesmo. O pessoal saía para o convés, e tem outras coisas aí que eu não posso contar.

Senhor Baraúna, você não pode comentar por questões de segurança nacional ou pessoal ou… 

Não, porque a Marinha nos tratou de modo paternal. Não fizeram pressão, não proibiram coisa nenhuma, não tomaram o filme, compreendeu? E eu prometi a eles não contar. Não é negócio de objeto não, é conclusão que houve a bordo. O negócio é de bordo que envolve o pessoal da Marinha. Eu não vou contar.

Hierarquia, essas coisas…

É. Nem em sessão espírita depois de morto.

[Risos] Vamos esquecer esse assunto, né?

Vamos esquecer essa parte. Depois da terceira vez, levanta a vela e vamos embora. Eu aí disse assim: “E o filme, hein?” Não falaram nada do filme, absolutamente nada. Um deles, que depois disso ficou muito meu amigo, capitão de corveta Carlos Bacellar. Bacellar disse assim: “Cadê o filme? Vamos ver novamente, né? Vamos ver.”

Fomos na cabine, vimos o filme. [Bacellar:] “Se tivesse papel aí tirava umas fotos, hein?”. Eu digo: “Não tem papel, não tem ampliador, não tem nada. Tem que esperar chegar em Niterói daqui a seis dias”. Que aflição, né? Pra saber o que era. Mas aí o comandante chamava o pessoal, os grupos: “Venha cá, o que foi que você viu, o que foi que você não viu, como é que foi o negócio?”. Fizeram ali um pequeno inquérito a bordo.

O almirante Paulo Moreira da Silva disse: “Eu não filmei, fiquei nervoso. Estava com o filme inteirinho”. Ele disse pra nós. Lá pra os colegas dele eu não sei se ele disse se filmou ou não filmou, devia ter filmado. Ele é almirante, não ia ficar nervoso por causa de objeto no céu, pô, de jeito nenhum. Bom, de noite a conversa era só isso. E o fotógrafo do Jornal do Brasil ficou completamente… [risos] desacreditado como fotógrafo. Coitado dele.

Perdeu um furo desses, né?

É. O Jornal do Brasil foi a pior coisa, pegou no pé dele: “Você não viu? Fotografaram o troço e você não viu nada?”. Todo mundo viu, tem 48 testemunhas. Ele estava junto de mim, foi ele quem me chamou e ele disse que não viu. Ele não fotografou por causa do nervoso e tem que dar uma explicação, né?

Houve outras pessoas também que disseram que não deram depoimento juramentado. Disseram que não viram o OVNI, algumas pessoas que estavam a bordo. 

Algumas pessoas não viram.

Não viram mesmo.

Não viram mesmo, estavam lá embaixo. 48 declararam que viram. Todas elas identificando o objeto na fotografia com o que estava no céu, exatamente aquilo. Só um camarada, um baixinho, um marinheiro, disse: “Parece esse, parece”. Os outros todos: “Foi esse aqui mesmo”. Só um que disse que parecia. Quando terminou, a conversa só foi aquela. À noite, em alto mar, a bordo, é cor de veludo negro, aqueles pontos prateados no céu.

De vez em quando a turma gritava: “Ali, olha lá o disco. Pega lá, agora você tá vendo, tal e coisa”. Começa a brincar com ele [risos]. A conversa ficou. Quando chegou em Vitória do Espírito Santo, dois dias e meio depois, iam prestar uma homenagem ao navio Almirante Saldanha. O navio ia encostar em Vitória e ia levar um dia inteiro em Vitória.

Tinha dois bancários do nosso grupo que já estavam com as férias vencidas, ainda mais um dia agora. Eu estava doido pra chegar em casa. Aí falamos com o comandante: “Comandante, o senhor dava jeito de a gente ir por terra. Vai ficar melhor pra nós.” [Comandante:] “E por que vocês querem ir por terra?”. Disse: “Tem dois aí com férias vencidas, vai levar um dia ainda, vai ter banquete e festa”. O navio encostou de manhã cedo, amanhecendo o dia.

Quando for à noite sai um ônibus daqui e chega em Niterói de manhã cedo. Foi bom saber isso. [Comandante:] “Se o interesse for de vocês, nós vamos ver.” Até nisso eles foram cavalheiros. [Comandante:] “Se o interesse for de vocês, podem ir. Sinto muito, vocês tinham que voltar conosco. Já que não pode ser, então nós nos encontramos lá no Rio [de Janeiro], tal e coisa”. Tá bem, ficou combinado assim. Saiu o comandante Viegas, eu e o Aluizio, vamos dar uma volta pela cidade.

Fomos lá na companhia de ônibus, compramos as passagens. [Perguntei:] “Que horas sai o ônibus?”. [Atendente:] “Dez horas da noite”. Compramos tudo direitinho, tal e coisa. Eles cismaram de prestar uma homenagem a nós, a oficialidade. Foi para um restaurante chique lá de Vitória, o pessoal todo: comandante, dois almirantes, a oficialidade. Brindes, diabo a quatro, tal e coisa. Quando deu dez horas: “O ônibus vai sair”.

Aí o comandante pegou o telefone e disse: “Olha aqui: o ônibus só sai quando o grupo do Almirante Saldanha chegar aí.” São quase uma hora da manhã. O pessoal do ônibus estava tiririca. O ônibus parado esperando nós chegar. Aí chegou, resolvemos ir, vamos embora. Chegou o pessoal do ônibus, entramos no ônibus, o ônibus “deitou o pé”. Chegou às dez horas da manhã em Niterói na rodoviária.

Desci, panhei um taxi, escapei nas “carreiras”. Eu morava nessa época na praia de Icaraí, esquina com [Rua] Presidente Backer. Eu tinha um laboratório muito bom de fotografia. Eu larguei as malas na sala, peguei o filme e fui para o laboratório, botei no ampliador, levantei até ao último ponto, acendi a luz, estava lá o “bicho”. Parecia um prato dobrado.

As fotos estavam…

As fotos estavam lá. A primeira, ele entrando na Crista do Galo — é uma rocha que chama Crista do Galo. A segunda ele está em cima da ilha. A terceira é ele do lado do Pico Desejado, parado. A quarta e a quinta não têm nada, não pegou nada. Foi na hora da confusão, ele correu, o pessoal na confusão, eu caí e amassei o para-sol da Rolleiflex. E a sexta foto aparece o horizonte um pouco torto com o objeto lá no horizonte. São as duas melhores fotos, a terceira e a última, foi a que deu maior ampliação.

A Marinha ampliou aquilo quatro metros quadrados pra saber, pelo menos, o que era aquele objeto, compreendeu? Aí eu vi aquilo lá, tal e coisa, pronto. Eu estava sem dormir a noite toda no ônibus, né? O ônibus passou a noite toda, nós éramos o último… eu tava sem dormir. [Pensei:] “Vou dormir ou vou fazer isso? Não, vou fazer” [risos].

Botei o revelador na banheira e fui fazer. Tirei várias provas, deixei secando e fui dormir. Dormi até quatro horas da tarde. Acordei com a campainha tocando, era um dos nossos colegas: “Como é, já revelou?” [Disse:] “Revelei”. [Ele disse:] “Puxa, mas que troço seria isso, não sei o quê”. Foi um dos que não viu: “Puxa vida, por que eu não vi isso?”. 

Ele passava o dia todo lá na cantina de bordo bebendo uísque, uísque estrangeiro. Não viu. O outro não viu porque estava com sono e estava dormindo. Os dois não viram [Mauro Andrade e Aluizio Araújo]. Viu eu, o Amilar Vieira e o comandante [José Teobaldo] Viegas. Os outros dois não viram. De noite todo mundo lá em casa. Bem, de manhã cedo eu digo: “Vou telefonar pra o João Martins”, que era repórter do O Cruzeiro na época.

Ele era pesquisador de disco, um dos maiores pesquisadores brasileiros de discos voadores. Eu tinha um contrato com ele, depois eu conto pra vocês. [Pensei:] “Eu não vou não. Ninguém sabe o que é, não vou não, deixa a Marinha se pronunciar a respeito. Eu prometi, vou deixar a Marinha se pronunciar primeiro, né? As provas estão aqui, os negativos estão aqui. Vamos ver o quê que vai dar isso”. Era semana do carnaval.

Eu levei os negativos e mostrei a um amigo meu que era sócio da loja Pan Foto na Rua Buenos Aires. [Ele disse:] “Puxa, onde você arranjou isso? Que coisa.” Eu contei o negócio pra ele. Disse: “Não conta pra ninguém não, hein? É segredo. Não conta pra ninguém, tá todo mundo calado. Depois do carnaval eu mando pra imprensa”. Bom, ficamos ali, tal e coisa. No dia seguinte de manhã o navio já tinha chegado. De Vitória pra cá é um dia e meio.

Chegou o comandante Bacellar lá em casa: “Olha, o almirante mandou saber se saiu alguma coisa”. Eu disse: “Tá aqui”. Eu aí já tinha feito uma coleção nova, sabe? Já tinha feito uma ampliação mais caprichada. Tinha rebaixado o negativo um bocadinho porque estava muito carregado, botar um negócio melhor. [Ele] ficou encantado. [Bacellar:] “Posso levar isso?”. [Disse:] “Pode, não tem problema nenhum”. [Bacellar:] “Pode deixar que eu lhe entrego depois”.

As ampliações?

As ampliações.

O negativo continua com você.

O negativo estava comigo. [Bacellar:] “Posso levar?”. [Disse:] “Pode, não tem problema nenhum”. [Bacellar:] “Pode ficar tranquilo que o negativo é seu”. [Disse:] “Tá bom”. Foi embora. No dia seguinte veio ele outra vez: “Olha, o comandante mandou fazer o seguinte: mandou perguntar se você pode ir lá prestar declarações. O inquérito já está quase no final, quer só o seu depoimento a respeito. Se possível leve os negativos”.

[Pensei:] “E agora, vão pegar os negativos”. Levei os negativos. Chegou lá, que nada, Marinha é a Marinha. Me trataram principescamente. Fiquei lá de noves horas da manhã até às quatro da tarde, almocei com eles. Viram os negativos, chamaram lá um suboficial que era fotógrafo. Mandaram tirar os positivos do negativo. Sabe como é, né? [Perguntaram:] “Pode tirar?” [Disse:] “Pode tirar”. Tiraram os positivos, depois me devolveram os negativos.

Aí veio uma máquina grande parecido assim um torpedo. Mudaram de sala, vamos pra outra sala, parecia um auditório com uma tela com quatro metros quadrados, aí projetaram lá o objeto. Apagaram a luz e ficaram olhando, conversando com outro baixinho, tal e coisa, tomando nota. Depois fizeram uma exposição.

É uma máquina com duas lentes na frente: uma leva o positivo, outra leva o negativo. Aparecem as duas imagens na tela, imagens enormes na tela dos dois objetos igualzinhos. Quer dizer, aparentemente iguais. Aí eles torcem o parafuso, o objeto vai se juntando um com outro até montar um por cima do outro. Quando eles ficam superpostos, aí você vê…

Pra efeito de comparação?

Não, é da terceira dimensão. Quando sobrepõe o negativo com o positivo aparece na tela uma escala graduada que começa com 1 e termina com 50, uma escala graduada transparente. Eles vão ajustando o foco, ajustando, ajustando, e o objeto aparece na marcação 14.

A escala é igual a uma régua, ele para em cima do 14. Quer dizer, ele passou a 14 quilômetros do navio, disso não tem dúvida. Aí fizeram outro teste: projetaram os negativos na outra lente com a régua horizontal e outra vertical formando uma cruzeta. Jogaram aquilo no centro do objeto.

Naquele tempo não tinha computador, só as maquininhas manuais. Rodava a manivela e tocava no teclado, rodava a manivela e tocava no teclado. [Perguntei:] “O que é isso, hein?”. [Militar:] “Isso é um teste”. O objeto tinha 40 metros de diâmetro e 8 de altura, era uma nave mãe.

O pessoal de bordo, as testemunhas, estão absolutamente certas quando disseram que parecia uma Lua alongada. Se você fizer o teste com a imagem da Lua dá isso mesmo, dá a mesma imagem, o mesmo tamanho. Não tem dúvida, era uma nave mãe. O que ela queria com o navio e com a ilha, ninguém sabe. Ninguém sabe [risos]. Eu fiquei lá, né?

O senhor escutou histórias de outras pessoas comentando que já tinham outras aparições de objetos lá. 

Nessa parte eles começaram a conversar comigo e me disseram. Me mostraram fotografias que tiraram na ilha antes do objeto. Era a terceira vez que o objeto aparecia na ilha, isso contado por eles lá. Era a terceira vez que aparecia na ilha o objeto. Não era igual aquele. Um que eu vi lá fotografado… Tinha um sargento que estava pescando… Conforme eu disse pra vocês, oito horas da noite ainda tem claridade no céu, compreendeu? Não tem nada em volta.

Montanha, nada.

Não tem montanha, não tem poluição, não tem nada, é só o reflexo do céu, é outra claridade do céu. Ele estava pescando numa pedra e viu o objeto. Vinha na linha do horizonte devagarzinho. Ele aí se lembrou que estava com uma máquina caixotinha dentro da bolsa. Quando ele disparou a máquina, rodou o filme, olhou…

Kodak, né?

Uma maquininha caixote, fotográfica. Com um visorzinho desse tamanho, ele começou a acompanhar pelo visorzinho, aí o objeto correu, ele bateu. Aparece o objeto parecendo assim uma abóbora de pescoço.

E detalhe: saiu fora de foco porque a máquina não tem recurso, era uma lente muito simples, né? Essa é uma foto que eles não publicam, foi tirada por um sargento que estava pescando. A outra foi o comandante da ilha… eles levavam três meses na ilha, cada missão. O comandante era o Bacellar.

Eles saltam durante o dia… Dois balões que saltavam naquela época por causa do Ano Geofísico Internacional. Eles saltavam dois balões-sonda por dia: um mais ou menos às dez horas da manhã e outro às quatro da tarde. A cor do balão é de acordo com a cor do céu. Se está cinzento o balão é vermelho. Se tá muito claro o balão é preto, assim brilhando.

Aí saltaram o balão mais ou menos às dez horas da manhã de um dia, né? E o comandante ficava acompanhando a subida do balão através de um telescópio [teodolito]. Ficava observando o balão, a subida dele. Esse balão leva pendurado um rádio transmissor e duas hélicezinhas de metal: uma no sentido vertical e outra na horizontal.

Quando ele vai subindo as hélices vão rodando e vão mandando pra baixo os sinais. O rádio de terra fica pegando. Tem uma máquina parecida assim uma prensa, tem uns cilindros que vem com um papel e em cima é cheio de agulhas com depósito de tinta. Esse cilindro gira lentamente, recebe o sinal do balão e transmite pra o papel. Tá entendendo como é o negócio? É transmitido para o papel.

Quando o balão explode no ar — ele sobe e arrebenta no ar. O radiozinho cá embaixo, aí tem uma hora que ele desaparece. Quando ele cai, apita. A máquina embaixo dá um apito agudo, é o sinal que o objeto caiu, pode tirar o papel. Eles pegam o papel, aqueles tracinhos todos, botam numa mesa com um tampo de vidro, coloca um tampo de vidro em cima e ali você sabe a umidade do ar, a temperatura. Tudo que eles querem saber de meteorologia dá ali, eles traduzem no papel, né?

Pois bem, o comandante estava observando o balão subir, eram dez e pouco da manhã. Observando o balão. De repente precisou resolver qualquer coisa. Chama um marinheiro: “Vem cá”. O marinheiro veio. [Comandante:] “Tá vendo lá o balão?”. O marinheiro olhou: “Tô vendo sim, senhor”. [Comandante:] “Pois é, não tira o olho daí, hein? Fica olhando até ele desaparecer.” [Marinheiro:] “Pode deixar, pode deixar”. Aí ficou olhando.

Ele [comandante] foi lá dentro. Demorou mais do que ele queria. Quando ia saindo, o apito tocou, quer dizer que o balão tinha estourado. Tinha estourado. Aí ele saiu, vinha andando pela trilha viu o marinheiro com o olho assim. [Comandante:] “O que é rapaz? O quê que você está olhando aí?”. [Marinheiro:] “Estou olhando o objeto aqui, o balão subindo. Olha ali, tá lá o outro balão”. [Comandante:] “Sai daí”. Quando ele olhou tomou um susto. Estava lá o objeto. Não era o balão.

Era um OVNI.

Era um OVNI. Não era o balão. A cor era diferente. Ele disse: “Vem cá, você ficou olhando?”. [Marinheiro:] “Fiquei sim senhor. Tinha outro balão junto em volta dele”. [Comandante:] “Me conta esse negócio direito, vamos lá pra dentro”. Chegou lá [comandante disse:] “Olha, não conta essa conversa não, hein? Não conta o negócio.” [Marinheiro:] “Aí eu tava olhando o balão”. Nesse dia o balão era cinzento. Não, não era cinzento, era vermelho, o balão era vermelho.

[Marinheiro:] “Eu estava olhando pra o balão vermelho lá andando, de repente apareceu outro balão, começou dar a volta em volta dele devagarzinho. Aí o balão vermelho apagou, estourou e caiu. E quando o senhor chegou estava lá o balão prateado em volta”. Ele fez um relatório enorme pra cá pra avisar. A primeira foi o sargento que pegou ele passando no horizonte, a segunda o…

O marinheiro.

O marinheiro viu ele no céu, né? É uma prova ali, né?

Uma prova, é.

E a terceira foi essa que eu fotografei. Isso foi eles contando lá. Aí me mostraram uma poção de fotografias secretas. Tem um disco voador espetacular tirado em Baía Blanca no sul da América. Você vê até janela.

Na Argentina?

Tirada pela… É, na Argentina.

Janela?

Vê até janela. Foi tirada pela Marinha Argentina. Aquilo era um documento secreto.

Eles trocavam informações?

Trocam informações no mundo inteiro.

Depois desse fato, o senhor teve acesso a vários relatos sobre OVNIs.

Vários deles. Pois bem, ficamos ali conversando. O oficial disse assim: “Você pode me emprestar seus negativos por uns dias?”. [Disse:] “Claro, posso sim, tranquilamente”. [Oficial:] “Pode deixar, quando nós tivermos encerrado o inquérito, nós liberamos suas fotografias pra você fazer o que quiser com elas.”

Pois bem, dei o negativo pra ele tranquilamente e fui embora pra casa. Passados uma semana mais ou menos… era uma semana, estava chegando o carnaval, me chamaram outra vez lá. Eu fui. [Disseram:] “Tá aqui seus negativos, muito obrigado, tal e coisa. Aqui o relatório completo. Os negativos são seus, a reportagem é sua”. Acho que isso não acontece em qualquer Marinha não, só a brasileira mesmo.

O senhor tem os negativos até hoje?

Não, eu vendi. Não acontece em qualquer Marinha, só na brasileira mesmo, né?

Só na brasileira, com certeza.

Só. Só na brasileira mesmo. Me trataram paternalmente. Até hoje são meus amigos. Qualquer coisa que acontece na Marinha sobre disco e Trindade, eles mandam me chamar, manda convite pra mim. Eles têm uma exposição permanente desses discos.

Esteve em Salvador essa exposição, eu tenho parente em Salvador. Telefonaram dizendo que estava lá no Forte da Barra. Tava lá a exposição da Marinha. Depois ela estava aqui no museu da Quinta da Boa Vista. No dia que fez cem anos do reconhecimento da Trindade como sendo brasileira, eles deram um grande coquetel ali na Ilha das Cobras, ali tem o museu naval, né? Mandaram me convidar. Tem gente muito boa ali, são meus amigos até hoje.

Seu Baraúna, logo depois que aconteceu esse fato, muitas pessoas o criticaram… 

Sim, mas antes disso tem um negócio interessante. Antes disso tem um… Entre a primeira e segunda ida à Marinha, ele perguntou se eu faria pra eles umas vinte ou trinta coleções. Eles pagariam. [Disse:] “Nada. Que pagar coisa nenhuma. Manda o papel que eu faço.”

Eles mandaram uma caixa de papel alemã. [Disseram:] “Faz todos os papéis aí, faz as quatro fotos, faz coleções de quatro”. Aí fui, não tinha nada pra fazer, na época estava sem trabalho e comecei a fazer. Mandei a eles cem cópias de quatro em quatro. Mandei pra eles.

Eles mandaram pra todos aqueles que eles têm convênio. Inclusive, o ministro da Marinha [Antonio Alves Câmara Júnior] foi despachar com Juscelino Kubitschek de Oliveira — nosso presidente —, que estava em Petrópolis nessa época.

Foi despachar com ele e levou as quatro fotografias pra mostrar a Juscelino. Ele olhou e disse: “O que foi isso?” [Ministro da Marinha:] “Isso aí, presidente, é uma foto raríssima no mundo. Foi um disco voador por cima da Ilha da Trindade fotografado pela Marinha”. Não disse quem foi que fotografou.

Juscelino olhou: “É interessante”. Botou em cima da mesa, deixou lá. O comandante foi embora. No dia seguinte uma senhora muito amiga de Juscelino e mulher de um diretor de jornal foi lá conversar com Juscelino não sei o quê, olhou e viu as fotografias em cima da mesa dele:

“Presidente, o que é isso?”. [Juscelino:] “Isso é um disco que apareceu na Ilha da Trindade que a Marinha fotografou.” Ela vai e fala assim: “Me empresta isso”. Foi mostrar pra o marido dela. [Juscelino:] “Leve, depois você me devolve”.

[Ela disse:] “Eu devolvo pra você amanhã, eu trago de volta.” Ele aí deu as quatro fotografias. E era uma condição que eu fiz pra eles de eu não mostrar, ninguém sabia do negócio ainda, compreendeu?

Não tinha sido divulgado ainda. 

Senão furava o negócio, né? Pois bem, aí o carnaval: sábado, domingo, segunda, terça-feira de carnaval, quarta-feira de Cinzas. Eu estou em casa, liguei o rádio, o rádio tava dando assim: “Não percam amanhã o Correio da Manhã. Um furo internacional: um disco voador sobre a Ilha da Trindade.” Você já viu? Tava de tempos em tempos dando a notícia. “Vejam amanhã…”

A culpa da divulgação foi Juscelino Kubitschek.

Eu escutei o troço quarta-feira de Cinzas de manhã, as rádios todas: “Furo internacional: um disco voador fotografado pela Marinha em cima da Ilha da Trindade”. Naquela época, negócio de disco voador era coisa muito…, né? Sensacionalista.

Até hoje continua ainda.

Eu aí não tive dúvida, peguei o telefone pra ligar pra o João Martins. Eu disse a ele em uma conversa com ele lá no O Cruzeiro: “Se algum dia eu pegar um disco voador, a reportagem é sua”. [João:] “É minha, vê lá, hein?”.

Eu tinha escutado aquilo de manhã, eu liguei pra ele — morreu há pouco tempo agora, engenheiro e repórter do O Cruzeiro. Eu disse: “João, tá escutando o rádio?”. [João:] ”Tô escutando sim. O quê que houve?” [Disse:] “Esse disco é meu”. [João:] “É seu? Vai me contar”. [Disse:] “Vou te contar tudo direitinho, pode deixar”. [João:] “Você vai se encontrar comigo e conta tudo.” E aí me encontrei com ele. Quarta-feira de Cinzas mais ou menos meio-dia, contei o troço pra ele.

[João:] “Entra no carro aí, [vamos para] Copacabana [encontrar] o dono do O Cruzeiro, Assis Chateaubriand”. [Disse]: ”Vamos lá”. Ele aí passou pra o Leão Gondim. Leão Gondim era o diretor executivo, era aniversário do Dr. Leão Gondim. Ele estava em um almoço. João Martins tinha prestígio lá, interrompeu o almoço, disse: “Aconteceu isso. Esse disco foi lá no Correio da Manhã e trouxe esse rapaz aqui”. [Gondim:] ”É dele?”. Eu disse: “É sim”. Aí o Leão Gondim disse assim: “Tá bom”, quis saber o que era.

Eu mostrei as provas a ele, aí o Leão Gondim disse assim: “Faz o seguinte: vai com ele lá no O Cruzeiro, faz quantas provas forem possíveis, grandes, 30 por 40. Faz quantas coleções forem necessárias. Convoca uma audiência com todos os jornais lá na sede dos Diários Associados, mas faz isso rápido. Depois se resolve o negócio do disco”. Disse: “Tá bem”. Voltamos por lá. Chegou lá o laboratório estava fechado porque não foram trabalhar, quarta-feira de Cinzas. Era quase um andar o laboratório. Ninguém achava a chave.

[Disseram:] “Arromba a porta”. Arrombaram a porta, botaram a porta pra dentro. Fizeram, acho, que vinte coleções. Convocaram todos os jornais do Rio, menos o Diário de Notícias, que era inimigo de Chateaubriand; não convocaram o Diário de Notícias. E minha mulher em casa sem saber, eu saí e ela não tinha chegado em casa. Não era essa não, era a que faleceu, minha primeira mulher [Adoléa Ribeiro Baraúna]. Ela sem saber onde é que eu estava. Lá em casa não tinha telefone. E o rádio tá dando. 

Na quinta-feira que seria o dia da divulgação. 

O dia é quinta-feira. Entramos no laboratório, convocamos todos os laboratoristas. Cortamos os negativos, cada um pegava um negativo. Tudo automatizado naquela época já, saía na esteira rolante já seco o papel. Convocamos todos os jornais, metemos tudo em um envelope. Ninguém sabia o que era. O auditório na época era na Avenida Gomes Freire, parecia assim uma casa de show. No meio tinha uma mesa redonda com um buraco no meio, era uma coroa redonda.

A pessoa fica dentro da coroa, o entrevistado. Em volta ficava as pessoas que estão recebendo a entrevista. Eu e o João Martins dentro distribuindo, explicando o negócio, um relato simples. Acabou mais ou menos meia-noite. Não, menos, meia-noite cheguei em casa. Acabou onze horas, onze e meia da noite. Eu disse: “João, eu tenho que ir pra casa, minha mulher não sabe onde estou. Essa confusão toda.” [João:] “A gente te leva até em casa”. Quando cheguei em casa ela já estava deitada, tinha trabalhado, sem saber de nada.

Quando cheguei na calçada de casa tinha um fotógrafo e um rapaz encostado assim na porta, quase meia-noite. Um rapaz encostado assim. Ele perguntou pra mim: “O senhor é o Almiro Baraúna?”. [Disse:] “Sou sim”. [Ele disse:] “O senhor me dá uma entrevista? [Disse:] “Não posso dar entrevista exclusiva não. Onde é que vai sair?”. [Ele disse:] “Eu quero só uma fotografia sua”.

Eu digo: “Peraí, vou fazer o seguinte: você fica no corredor, eu abro a porta, você me fotografa dentro de casa conversando na porta. Só isso. Não posso fazer mais nada”. [Ele disse:] “Certo, certo”. Subiu, entrei em casa, tirei o paletó, fiquei conversando com ele pra bater a fotografia. Ele foi embora, me agradeceu muito. [Pensei:] “Não dormi até agora. Vou dormir”. Tomei um comprimido e fui dormir. De manhã cedo comprei todos jornais. Todos jornais, primeira página.

Na manhã seguinte.

Entrevista comigo, entrevista com João Martins. Fotografias do objeto, originais.

Inclusive o Jornal do Brasil?

Jornal do Brasil estava lá também.

E aquele repórter? Coitado do repórter…

No Última Hora tinha no canto a minha fotografia na porta de casa, em cima.

E a Marinha? Qual foi o pronunciamento da Marinha em relação a isso?

Depois eu chego lá. E o Correio da Manhã disse que ia dar o furo. Várias fotografias desbotadas, tudo fora de foco porque não souberam copiar, dizendo só que tinha sido fotografado pela Marinha na Ilha da Trindade. Só isso. Esse era o furo deles. No Última Hora deu uma edição espetacular. O Globo foi o primeiro que deu a notícia ainda em sigilo.

O Globo?

O Globo. Eu tenho aí pra lhe mostrar. Aí foi aquela confusão. Veio um camarada lá em casa e disse: “Olha, o Dr. Leão Gondim pede pra você ir lá no O Cruzeiro.” Eu aí fui lá pra O Cruzeiro acertar as contas, vê quanto é que eu queria pelo furo.

Deu pra comprar um apartamento. Ficamos lá no O Cruzeiro conversando um bocado, tal e coisa. [Disseram:] “Não saia agora não. São Paulo telefonou, vão mandar um cinegrafista pra filmar uma reportagem”. Dei entrevista. Quem não ganhou as fotografias [disseram]: “É truque desse camarada!”. Aí começou.

Aí começaram as críticas por causa da… 

[Disseram:] “É truque. Ele é acostumado a fazer truque. Eu quero aparecer provas”.

O senhor fala que o senhor fazia truques.

Eu fazia truques sim, nunca escondi.

Inclusive com discos voadores?

Agora que eu pensei numa coisa interessante: eu fiz um truque e vendi para o Tribuna da Imprensa por causa de uma aposta. O pessoal do O Cruzeiro falando negócio de truque [disseram:] “Calazans Fernandes, eu duvido que alguém engane ele em fotografia”. [Eu disse]: “Eu engano”. [Disseram]: “Engana coisa nenhuma”. [Eu disse:] “Vou fazer um truque e vender pra ele. Se ele comprar tá feito o negócio.” [Disseram:] “Tá bem”. Eu fiz o truque, Calazans comprou. Saiu em quatro edições.

O jornal Tribuna da Imprensa publicar fotografia trucada e relato trucado é desprestígio. Ele era redator-chefe, era amigo meu. Eu vendi a reportagem pra ele e ele comprou; quatro mil cruzeiros, um dinheirão na época. Publicou em quatro reportagens, e era trucada.

Quando ele viu o negócio do disco voador, ele disse: “É truque desse camarada”. Aí ele foi lá em casa. Eu dei uma entrevista pra ele, ele me fotografou. [Ele deve ter pensado:] “Não tem dúvida, é truque.” Aí me “marretou”. Entrou gente do Diário de Notícias, aí me “marretaram”. Todo dia tava no jornal.

Publicou as fotos da reportagem que ele comprou, trucadas, mostrando assim em cima, logo abaixo da página. Era a história de um tesouro: uma caveira com um cofre arrombado. Embaixo parece que tem uma ilha, até eu entrando numa gruta de pedra. A legenda é o seguinte, a legenda que é curiosa [risos], eu vou lhe mostrar, tá ali guardado. Na primeira fotografia “vê-se a caveira de um explorador fracassado”. Na segunda “um cofre supostamente arrombado por alguém que chegou depois”.

Na terceira fotografia ”vê-se o pobre do Baraúna metido através de grutas a procura de tesouros que sua imaginação criou”. Aí começou a me “marretar”. Alguns jornais me defendiam, outros…

Virou uma polêmica.

O negócio tava piorando… No segundo dia logo que apareceu o negócio, um fotógrafo de um periódico, fracassado, disse pra um amigo dele que era truque, que eu tinha um laboratório especializado em fazer truque. Esse camarada vai e dá com a língua nos dentes.

Chamou a imprensa toda pra mostrar onde eu tinha feito o truque. Mas acontece que ele não tinha visto as fotografias, foi antes da aparição no jornal. Levou o pessoal todo junto pra mostrar onde tinha feito a fotografia naquela Serra da Tiririca. Aí quando o pessoal olhava, puxaram as fotografias: “Olha aqui. Não é. Não confere.” [Ele disse:] ”Ele copiou”. [Jornalistas disseram:] “Você tá é com ideia de maluco, vai tomar banho”. Ficou desprestigiado.

O comandante Bacellar foi lá em casa: “Olha, o almirante [José Geraldo] Brandão mandou perguntar a você o que você quer que faça pra acabar com essa onda aí contra você.” A Marinha deu uma nota oficial. [Disse:] “Isso mesmo, foi bom”. Dez horas da noite entrou o Repórter Esso em edição extraordinária.

Repórter Esso?

Repórter Esso. Edição extraordinária, não era comum não, era raro. Edição extraordinária, aí acabou, acalmou o negócio. Daí em diante começou a chover lá em casa correspondência estrangeira porque a Marinha mandou os negativos, eu não sabia disso, pra o laboratório da Kodak nos Estados Unidos. E a Kodak tem um laudo espetacular a respeito dos negativos, da autenticidade. Todo mundo soube, choveu assim [de correspondência]. Só você vendo.

Seu Baraúna, na época o governo dos Estados Unidos fazia um estudo sobre OVNIs e eles analisaram seu caso.  

O governo dos Estados Unidos disse que não se interessava por isso. Diziam que isso aí é ficção científica. Eu tenho a prova no papel.

Mas tinha o projeto Blue Book naquela época.

Eu tenho a prova. O embaixador pedindo à Marinha… você vê a cópia, eu guardei ali. O embaixador americano pedindo à Marinha cópias e relatos do objeto.

Se eles não se interessavam…

Se eles não se interessavam, o que é que eles queriam? Mas depois disso, anos e anos depois, eu fui a vários congressos. Tinha um congresso em Brasília, internacional, levou uma semana o congresso em Brasília, tinha uns 32 estrangeiros [II Congresso Internacional de Ufologia, em abril de 1983]. Eu diariamente subia no palco pra dar entrevista. E eu conheci o maior investigador do mundo, já morreu. Aquele… eu tenho aí a assinatura dele.

Ele era brasileiro?

Não, americano [Josef Allen Hynek].

Aquele… esqueci o nome dele. Ele foi astrônomo.

Astrônomo. Eu tenho aí, daqui a pouco você vê. Inclusive ele voltou no voo internacional, eu vim com ele na cadeira do lado conversando com ele, com intérprete, muito bom o intérprete.

Ele pediu pra mim se eu podia mandar pra ele uma cópia tirada do negativo original porque ele tinha cópia daquilo, mas de fotografia de fotografia. Eu mandei pra ele. Mandou um agradecimento pra mim, mandou uma revista dele autografada. Quem viu aí aquele [filme 2001:] Uma Odisseia no Espaço?

Eu vi. 

Sabe aquele disco de Uma Odisseia no Espaço, aquele disco?

Não, esse é Contatos Imediatos [do Terceiro Grau]. 

Esse camarada foi o… 

Consultor. 

Ele aparece fumando um cachimbo, de barba branca.

Ele fez parte das investigações oficiais americanas. Morreu, acho que em 79, 80.

Morreu há pouco tempo.

Usa óculos.

É. Eu tenho fotografias com ele, acho que tem ali dentro. Porque parte desse material não está comigo aqui, tá em Saquarema. Eu tenho uma casa em Saquarema. Parte desse material está em Saquarema, aqui não tem lugar mais. Eu não sei se está ali, se tiver tá ali. “J”… [J. Allen Hynek].

O senhor nunca imaginou que as fotos tiradas… 

Aconteceu no ano de 58. A aparição do disco foi em 16 de janeiro. Fez 40 anos.

Ah, lembrei o nome agora, é Hynek.

Hynek. Eu na fila pra carimbar o passaporte. Minha mulher na frente e eu atrás, uma fila enorme. Chegou a minha vez. [Perguntaram:] “O senhor é o Almiro Baraúna que fotografou um disco na Ilha da Trindade? Que prazer em conhecer, o senhor foi o herói da minha infância. Eu tinha dez anos”.

O senhor se tornou uma lenda mesmo. 

Coincidência, né? Disse: “Fez 40 anos”. [Pessoa:] “Isso mesmo, eu tinha dez anos na época”. E a fila parada [risos]. E a minha mulher assustada.

Alexandre de Carvalho Borges
Físico pela Universidade de Franca, Analista de Tecnologia da Informação pela Universidade Católica do Salvador, pós-graduado em Ensino de Astronomia pela Universidade Cruzeiro do Sul, pós-graduado em Ensino de Física pela Universidade Cruzeiro do Sul, pós-graduado em Perícia Forense de Áudio e Imagem pelo Centro Universitário Uninorte, pós-graduado em Inteligência Artificial em Serviços de Saúde pela Faculdade Unyleya, pós-graduado em Tradução e Interpretação de Textos em Língua Inglesa pela Universidade de Uberaba, e fotógrafo.

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